24 julho 2024
Prólogo ao livro "A Bula do Placebo"
19 julho 2024
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 40: A Trindade e o amor trinitário
15 julho 2024
Far-West Tupiniquim: Eu Brinquei de Forte Apache, de Marcos Guazzelli
Jorge F. Isah
É um livro simples, sem rebuços, com dezenas de imagens a descortinar a evolução dos brinquedos “Far-West”. Como já dito, não é uma pesquisa minuciosa, pois o autor encontrou sérias dificuldades em incorporar elementos, seja por não mais existirem os grandes fabricantes, registros destruídos (como o incêndio na Casablanca), ou negativas quanto a exposição de dados (mormente, a Gulliver), e tornou complexa a investigação. Baseou-se em suas próprias reminiscências, nas de outros colecionadores, ex-funcionários das antigas fábricas e “sobreviventes” do processo de criação, como o grande desenhista Nelson Reis. Entretanto, muitos deles não tinham detalhes precisos, que o tempo anuviou ou apagou. Marcos, contudo, é honesto na exposição dos fatos, e deixa evidente o que não pode ser certificado, e de algumas conclusões serem frutos de deduções, somente possíveis por sua vasta experiência na área, inclusive em dezenas de viagens mundo afora, à cata de objetos raros ou simplesmente vislumbrar “in loco” exemplares cuja existência desconhecia ou era concebida apenas em fotos.
02 julho 2024
Os Belos e os Malditos - F. Scott Fitzgerald
Jorge F. Isah
Scott Fitzgerald é um dos meus autores prediletos. Ele é de uma
geração de escritores a primar pela clareza, objetividade e, por que não,
sinceridade. Tal qual, por exemplo, Hemingway, guardadas as diferenças de
estilo, narrativa e mundos, Fitzgerald parece falar do que entende muito bem, e
desnuda o universo no qual transita e, também, seus personagens circulam. Tal
qual o especialista em assuntos gerais e intrínsecos, ele esmiúça o que existe
de melhor, em pequenas porções, e o mais acintosamente infame, em larga escala,
na alma. Em alguns momentos, o abjeto e o frívolo se unem em sua desgraça, ao
ponto de trazer ao leitor um mal-estar intenso e profundo. Como se não houve
luz, apenas trevas, eles são incapazes de notar onde estão e para aonde vão,
cegados por seus vícios e a incapacidade de entendê-los para assim se
libertarem.
Outro
aspecto perceptível em seus livros é o constante “deslocamento” dos
personagens, sejam rebeldes, flexíveis, ambiciosos, desprendidos, pacíficos ou
belicosos. Nenhum deles parece conhecer o seu lugar no mundo, e está nele muito
mais pela falta de opções do que escolhas. Este sentimento leva-os, cada um, a
buscarem distrações, compensar o incômodo existencial com sexo, drogas, bebidas
e farras intermináveis. É o dispender-se sem sentido, em um tipo de niilismo
levado às últimas consequências, onde viver é o mero exercício do instinto,
mecânico, fortuito, mas ainda assim, pretensioso e cabotino. De forma a cada
elemento mover-se na direção do grupo, e o grupo satisfazer-se na aquiescência
de cada indivíduo; amálgamas do desatino e da fleuma vadia. Uns mais, uns
menos, é como uma teia onde convivem, até certo ponto, a presa e o predador, em
um jogo igualmente encarniçado e fatal.
Em “Os Belos e Os Malditos” não é diferente. Segundo livro publicado pelo autor
(1922), ele retrata o ambiente efusivo e degradante, porque também não, o
declínio de uma geração que se ofuscou em devaneios, caprichos e futilidades.
Jovens a imaginarem-se heróis de si mesmos, algo muito comum na maioria dos
imaturos, e velhos arraigados ao anti-heroísmo, mormente egoísta e autoritário.
No primeiro caso, temos Anthony Patch, universitário e herdeiro de um magnata
dogmático e austero. No segundo caso, há Adam Patch, o avô milionário de
Anthony, que vê o desregramento do neto como impeditivo para herdar os seus
negócios. A inabilidade de Anthony em gerir a própria vida faz o avô imaginar o
mesmo para a sua fortuna. E ele não está errado: o neto frustra completamente o
patriarca a cada desafio recebido, por menor que seja.
Anthony aguarda a morte do avô para refestelar-se na fortuna que considera sua
por direito inalienável. Praticamente, conta os dias, semanas, meses, em uma
espera macabra e aflitiva. Para o seu desespero, o alcoolismo é o maior dos
pesadelos, pois o velho Adam, homem respeitado na sociedade, abomina todos os
vícios e, em especial, o etilismo. Anthony vive em apuros, vivendo com uma
módica mesada (ao seu ver, e para a qual não faz qualquer esforço em merecer),
enquanto se esbalda nas noitadas e mais noitadas regadas a Whiskey, lugares da
moda, e a despender seus recursos, tanto financeiros como físicos, em uma
existência fútil e pueril, ansiando o dia a deter os fundos suficientes para
expandir essa tragédia.
As coisas parecem tomar, inicialmente, outro rumo quando conhece Glória, prima
do seu amigo, Dick; este almeja a carreira de escritor e, ao contrário de
Anthony, em curto tempo alcança sucesso, fama e dinheiro. Glória é a socialite
esnobe, narcisista, cuja beleza estonteante é a única coisa a importar-lhe
realmente. Satisfaz-se com levadas de homens aos seus pés, exibindo-se noite sim, outra também, nos salões mais prestigiados de Manhattan. A despeito das
diferenças, Anthony se considera um intelectual e Glória uma debutante, algo os
atrai: o álcool e a inconsequência. Para quem conhece um pouco da biografia de
Fitzgerald e do seu casamento com Zelda, este parece ser o quase retrato da
relação entre eles. Algo que Hemingway, amigo de Scott, descreveu no livro
“Paris é uma festa”.
Em suas mais de 300 páginas, o autor fala de decadência, obsessão, frustrações
e quão aparente eram os vínculos dos jovens nos anos da geração perdida do
Jazz. Com o passar do tempo, as relações se acidificaram, e a aparente harmonia
no caos se tornou somente em algo babélico, o verdadeiro “salve-se quem puder”,
onde praticamente nenhuma expectativa consolidou-se tal como idealizada. Em
meio ao mundo destroçado pela 1ª Grande Guerra, a vida jamais seria a mesma, e
caberia a cada um adaptar ou sucumbir aos efeitos gerais, e aos deslizes e
equívocos individuais.
Não custa lembrar: não faço sinopses ou resumos de livros. A ideia é dar um
panorama e com ele aguçar o interesse do futuro leitor. Por isto, se você é
novo por aqui, desista, não vou lhe entregar a história na bandeja. O meu
esforço é o de tentar, às vezes funciona, outras não, contar o mínimo, mas
suficiente para que se decida a comprar o livro e explorá-lo. Igualmente, não
faço uma crítica, ainda que sempre haja algumas no decorrer da resenha; mais
uma apreciação dentro da perspectiva otimista de influenciar e seduzir o leitor
com elementos a encorajá-lo em sair do lugar cômodo (na verdade, incômodo) de
privar-se das experiências universais, amadurecer, e refletir sobre si, os
outros, seu lugar, dos demais, e assim evitar os erros, tonificar os acertos, e
no microcosmos a cercá-lo, promover benefícios a todos. Como está escrito: “O meu povo foi destruído,
porque lhe faltou o conhecimento” (Oseias 4:6). Neste
trecho, o conhecimento se refere a Deus, ao Ser divino, mas pode-se remetê-lo a
qualquer aspecto da vida, sem perda de sentido.
Neste aspecto, Scott Fitzgerald revela em suas narrativas quanto o homem pode
ser supérfluo, instável e imprevisível, em uma contingência desordenada e quase
sempre desconectada da realidade. Talvez, por isso, o homem insista tanto em
fugir da verdade, em uma busca fastigiosa e inexequível. Não raras são as cenas
de homens e mulheres a desdenharem, ultrajarem, conspurcarem-se. O poço é
fundo, mas pode-se descer ainda mais; e ainda assim, o orgulho, a soberba e a
desfaçatez parecem subsistir em meio à lama e entulho... A constatação de serem
eles, em última instância, a promoverem e impulsionarem os indivíduos para um
fim nada ditoso. Ainda que se gaste uma vida inteira e não se
perceba o aracnídeo prestes a capturá-lo.
Fitzgerald parecia entender... mas não conseguiu, ou não quis, fugir a tempo.
______________________
Avaliação: (***)
Título: Os Belos e Os Malditos
Autor: F. Scott Fitzgerald
Editora: Record
Páginas: 340