Jorge F. Isah
________________________________
Durante as
férias, aconteceu dois incidentes deveras estranhos. Não citarei o local para
não mexer com a suscetibilidade provinciana e os defensores, seja lá do que for,
mais preocupados em aparecer a qualquer custo e fazer carreira no mainstream
político ou midiático; vulgarmente apelidados de “lacradores”. Fui visitar uma
“picota” e, já na entrada, alguém me abordou. Sem cerimônias, pegou-me o punho
e foi amarrando uma fitinha de certo santo. Agradeci, educadamente, me recusei a usá-la, e
tomei de volta o meu braço. Ele insistiu, e puxou-me com mais vigor; eu disse:
- Amigo, não
quero usar a fitinha... – Pensei em explicar-lhe os reais motivos, mas não me
senti obrigado a fazê-lo
- Por quê? –
Falou com uma agressividade incompreensível e quase psicótica.
- Ora, porque
não quero... – Fui o mais gentil possível, dentro das circunstâncias; sem
arroubos e melindres.
- Isso é um
absurdo! – Ele disse; com a fisionomia tão neurastênica, que imaginei tratar-se
de uma “pegadinha” – É o maior insulto que já recebi na vida!
Entreolhamo-nos;
eu sem entender a reação destemperada e abusada do homem, e ele sem aceitar a
minha decisão. Então, para acabar com o mal-estar, peguei a fitinha, agradeci, coloquei-a no bolso, e virei-me para descer a ladeira.
Ao notar que não a usaria, puxou-me bruscamente o braço, pela terceira vez:
- Não vai usar
a fitinha?
- Não, vou
levá-la de lembrança.
- Vai nada!
Arrancou-a dos
meus dedos, virou-se para as pessoas ao redor (a rua e calçadas estavam
apinhadas de turistas), e disse, a plenos pulmões:
- Veja bem, é
isso que dá ser educado e gentil com pessoas que mereciam umas boas porradas!
Deixei-o
falar, segui à frente e, mesmo alguns metros depois, podia ouvi-lo imprecar e
maldiçoar o monstro perverso que eu era.
Mas ainda não
havia terminado.
Logo à frente,
avistei um vendedor de chapéus; havia algum tempo que desejava um. Aproximei-me
e apontei o modelo.
- Quanto é esse?
- 90 reais! – Pegou
o artigo para colocá-lo em minha cabeça.
- Não, eu não
vou querer... – O valor era mais do dobro de outros quiosques.
- Dá pra fazer
por 70... – E, de todas as formas, quis colocá-lo em minha cabeça.
- Amigo, não
tem tamanho maior?
- Não, mas ele
serve! – E insistia, a despeito da minha cabeçorra, em ajustar o apetrecho com o
maior dispêndio de força, puxando-o para baixo pelas abas.
- Calma, não está vendo que o chapéu é pequeno
demais para a minha cabeça?
- Faço por 50...
- Amigo, nem
se for de graça! Definitivamente, ele não entra!
E quanto mais
eu argumentava, mais ele se impacientava e queria, a todo custo, adequar o
atavio ao meu crânio avantajado, dando descontos a cada 5 reais... Ainda fiz
um esforço, com as próprias mãos, para ele ver a inadequação de se colocar uma
melancia em um vidro de azeitonas.
- Viu! Não tem
como! – Devolvi-lhe o chapéu. Novamente, quis botá-lo; dei um passo atrás e mantive
a distância.
- A menos que
tenha uns três ou quatro números maiores, esse aí não serve... – Rumei para o meu
caminho, quando ele me peitou, e disse:
- É por essas
e outras que não gosto de gente folgada!
- Ah?! – Lembrei-me
do personagem humorístico (não me recordo o nome), que ao ser confrontado
repetia: “Ah, é, é!... Ah, é, é!...” para dias depois sair com uma resposta
matadora, mas que de nada lhe serviria.
- É isso
mesmo, você é um folgado! – Quase fez uma linha no concreto, cuspiu no chão, e
me chamou a atravessá-la, se fosse homem.
Nisto, minha
esposa puxou-me o braço de um lado e minha filha do outro, e arrastaram-me pela
rua.
Na pousada,
contei a história para um funcionário, e ele segredou:
- Você fez bem
em não usar a fitinha, ela é uma espécie de senha para os trombadinhas e
larápios saberem quem é turista e o enganar...
- E quanto ao
vendedor de chapéus? O que tem a dizer?
- Aqui os vendedores são loucos, e esse deve ser, com certeza, o dono do hospício.
_________________________________________________
Nota: Texto publicado originalmente na Revista Bulunga
Nenhum comentário:
Postar um comentário