Dando sequência ao nosso estudo sobre a igreja, analisaremos o aspecto
da autoridade e sustento pastoral. Neste estudo, já falamos sobre vários
pontos da igreja verdadeira e as marcas que ela detém, inclusive, a sua
autoridade sobre o crente. Apesar desta doutrina ser extensamente
descrita na Escritura, há cristãos que não a reconhecem, e, por isso,
desprezam-na. O que está ligado mais ao individualismo e à
autossuficiência do homem moderno [o qual tolamente se acha "senhor de
tudo" e autoridade final] do que da sua não expressividade canônica.
Vivemos tempos em que os crentes encontram-se tão ou mais rebeldes do
que os mundanos, acreditando em uma liberdade capaz de prescindi-los de
qualquer autoridade, ainda que muitos digam reconhecê-la em Cristo, mas
rejeitam-na completamente ao desconsiderar a autoridade que ele deu à
igreja e aos seus ministros; o que acaba por levantar a seguinte dúvida:
se não reconhecem a autoridade eclesiástica que veem, como reconhecerão
a Cristo que não veem? Eis a questão!
Iniciemos então pelos versos de 1Ts 5.12-13: "E rogamo-vos, irmãos,
que reconheçais os que trabalham entre vós e que presidem sobre vós no
Senhor, e vos admoestam; e que os tenhais em grande estima e amor, por
causa da sua obra. Tende paz entre vós".
A
palavra "presidir" significa “estar à frente”, “governar”,
“superintender”, mostrando uma qualidade de liderança, comando, de
alguém que tem autoridade sobre outro(s), que os direciona, levando-os à
obediência e ao cumprimento de determinadas ordens. Interessante frisar
que a obediência do crente em relação ao seu pastor ou presbítero é a
mesma a qual o pastor e presbítero devem estar sujeitos, a qual é a
autoridade da igreja; e, por isso, não é possível que eles ordenem ou
orientem um ou mais membros a agirem divergentemente das deliberações do
corpo local. É uma via de mão-dupla, na qual o pastor e presbítero são
aqueles que primeiro devem proteger as resoluções que a igreja deliberou
e não transtorná-las. Não há lugar para o despotismo ou a autoridade à
revelia do corpo local, pelo contrário, a autoridade pastoral se
fundamenta no poder com o qual o Senhor investiu a sua igreja, e a ela
está sujeita.
Apenas
como um adendo à nomenclatura, já que utilizo termos correlatos e que
em algumas denominações referem-se a funções distintas, creio que os
vocábulos, bispo, pastor e presbítero são sinônimos e significam, de
maneira geral, a posição daquela pessoa madura e experiente na fé capaz
de guiar e alimentar o rebanho do Senhor. Os oficiais da igreja governam
não para si mesmos, como dito, nem a partir de autoridade própria, mas
da autoridade investida por Deus, como servos [1Pe 5.1-4, conf Mt
20.26-27].
E
a prova maior de que nada do que estamos dizendo é falso, baseia-se no
fato de o próprio Deus, através do seu Espírito Santo, dar esses dons à
igreja. É o que Paulo nos diz em Efésios 4.10-13: "Aquele que desceu é
também o mesmo que subiu acima de todos os céus, para cumprir todas as
coisas. E ele mesmo deu uns para apóstolos, e outros para profetas, e
outros para evangelistas, e outros para pastores e doutores, querendo o
aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para edificação
do corpo de Cristo; até que todos cheguem à unidade da fé, e ao
conhecimento do Filho de Deus, a homem perfeito, à medida da estatura
completa de Cristo".
Deus
deu a alguns membros da igreja funções e ministérios especiais, de
forma que nem todos estão num mesmo nível funcional, numa igualdade de
atribuições, o que não pode ser nem significa inferioridade ou
superioridade espiritual de um membro sobre o outro. Se entende-se a
questão como uma mera disputa de poder, em que um pode mais sobre o
outro, a coisa deixa de ser espiritual para ser essencialmente carnal.
Afinal, todos são servos do mesmo Senhor, e o que nos diferencia é o dom
que o próprio Deus entregou a um e não a outro, e que entregou a outro e
não àquele. Parece, contudo, que o pastor, bispo ou presbítero são os
alvos mais adequados para os insubordinados, que chegam ao extremo de
desqualificá-los, menosprezá-los e até alegando a antibiblicidade de
seus dons. Ora, se não são bíblicos, por que a Escritura se esmera em
designá-los, descrevê-los e qualificá-los? O fato de haver falsos
pastores e mestres serve de negação para que não sejam reconhecidos os
pastores verdadeiros e que temem ao Senhor, servindo-o? Em quê a
quantidade daqueles que não honram o seu ofício e, em muitos casos, são
servos de satanás, anula a biblicidade do ministério e autoridade
pastorais? Com a palavra, os detratores...
O
que Paulo exorta-nos é, ao contrário, reconhecer a autoridade pastoral,
não como algo a ser realizado por soberba, orgulho ou vaidade, mas
reconhecendo que o pastor ou presbítero é aquele que serve mais
humildemente dentro do corpo local. É por isso que atitudes como a de
crentes que difamam e denigrem o dom pastoral, de maneira genérica, agem
com soberba e orgulho muito superiores à que afirmam denunciar. De
forma irresponsável e insana querem colocar todos no mesmo balaio em que
deveriam estar alguns. No fundo, toda essa empáfia serve apenas para
desculpá-los diante de si mesmos, demonstrando, via de regra, desdém
para com a igreja e o Evangelho, e um ensimesmamento, em que o intento é
a glória do próprio umbigo.
A
alegação de que tratam é que, se a maioria dos pastores está preocupada
com os seus próprios interesses, conclui-se que todos os pastores
também estão; se a muitos roubam, todos são ladrões; se há farsantes,
todos são impostores. Isso é de uma arrogância sem par! E de uma
leviandade ainda mais diabólica, nada condizente com a vida cristã.
Alegam-se oniscientes a ponto de mapearem todo o universo eclesiástico,
condenando-o, sem saírem de suas poltronas. Têm por fato algo que não
passa de especulação; e por direito algo que não foge de uma
reivindicação. É por isso que a Bíblia zelosa e sabiamente detalha em
minúcias quem está apto e quem não está ao ministério pastoral.
Infelizmente, há aqueles que querem os holofotes sem que tenham o
chamado de Deus. Há os que nem mesmo são convertidos, ou os que são
declaradamente ímpios em suas atitudes e desregramentos. Porém, nada
disso invalida o dom dado por Deus. E ele se preocupou em evitar que
tais trapaceiros se instalassem no seio da igreja. Paulo em 1 Tm 3:1-7 e
Tt 1:5-9, adverte para as qualidades que um pastor, presbítero ou bispo
devem ter, e o cuidado necessário para que a igreja decida-se em
alçá-los a esses postos. E as características, como indicativas de um
chamado divino, são reveladas exteriormente, de forma que qualquer um
possa vê-las, percebê-las e confirmá-las. Paulo nos dá uma lista de
distintivos que não são subjetivos, mas claramente objetivos e
assinaláveis. Especialmente que ele não seja neófito, "para não se
ensoberbecendo-se, não caia na condenação do diabo" [1Tm 3:6]; a
maturidade espiritual e a experiência na vida cristã devem ser pontos
fundamentalmente analisados pela igreja para sancionar um líder. E isso
não nos remete, necessariamente, à questão da idade, pois há jovens
muito mais maduros que velhos, ainda que, cronologicamente, espera-se
que um velho seja mais sábio que um moço.
A
questão é que o erro está, na maioria das vezes, no pouco zelo com que a
igreja estabelece seus líderes. Há casos em que um ministro é chamado à
liderança sem que preencha correta e adequadamente os princípios
estabelecidos pela Escritura para assumi-la. Indicações e até mesmo a
excelência acadêmica [graus e títulos que ele tenha] falam mais do que a
sua vida cristã. Prima-se hoje mais por um diploma teológico do que
pelo testemunho cristão. Com isso não estou desmerecendo o estudo, e,
sobretudo, o esforço de quem estudou anos para obter uma designação
acadêmica. Mas ela não é tudo, e muitas vezes torna-se em nada, dada as
inúmeras heresias que campeiam entre seminários e faculdades teológicas,
além de um desprezo a Deus e sua palavra, e o próprio fato de alguns
estarem no ministério sem chamado, santidade, zelo, e, mesmo sem
conversão. O que me leva a defender severamente a formação de líderes no
âmbito da igreja, dentro da própria igreja, primeiramente para que o
seu chamado seja confirmado por ela, segundo, para que o testemunho do
candidato, no decorrer dos anos, sirva de "certificado" para o cargo, e,
terceiro, para que ele seja conhecido de todos os membros, e ele os
conheça igualmente. Mas este é outro assunto, para outra hora...
Voltando
ao ponto central, da autoridade pastoral, leiamos Hb 13.17: “Obedecei
aos vossos guias e sede submissos para com eles; pois velam por vossa
alma, como quem deve prestar contas, para que façam isto com alegria e
não gemendo; porque isto não aproveita a vós outros.”
A expressão "guias" fala daqueles que vão à frente e conduzem o
rebanho, nitidamente dando-nos a ideia de liderança, daqueles que
exercem o cuidado das almas, dos membros do corpo local. Mas, com isso,
se quer dizer que há um grupo de irmãos que "fazem" o trabalho de Deus e
outro que somente assiste? Não! Ao menos, nunca devia ser assim. Uma
igreja que age dessa forma não entende o seu papel, nem compreende a
obra que tem de realizar. Uma igreja assim é presa fácil para homens
astutos, os lobos vorazes e cruéis que desejam destruir o rebanho,
conforme Paulo descreveu em Atos 20.29. Devemos nos lembrar de que uma
igreja bíblica não se constitui de um grupo de irmãos ativos e um grupo
de irmãos passivos, aqueles controlando estes e estes, simplesmente,
submetendo-se ao controle daqueles: “pelo contrário, cooperem os
membros, com igual cuidado, em favor uns dos outros” (1Co 12.25). Isso é
sabedoria, que vem dos céus, para a glória de Deus.
Continuaremos, na próxima aula, analisando a biblicidade da autoridade pastoral.
Notas: 1 - Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico;
2 - Para maior consideração e detalhes, ouça o áudio da aula;
3- Baixe esta mensagem em aula 47.mp3