Jorge F. Isah
As crianças são, via de regra, desprezadas pela maioria dos
adultos, como se não houvesse nada a se aprender, a se copiar, ou mesmo
refletir. É claro que se um adulto resolve replicar parte ou a totalidade da
sua vida aos moldes infantes, certamente não passará de meninão crescido e mimado, nada além de um
“maioral” de cueiros. Exemplos há aos montes: quando se vê homens e mulheres se contorcendo
como uma enguia que tomou uma descarga de 100.000 Watts, alguma coisa está
errada. Quando anciões se portam e agem como adolescentes, a falta de autocrítica
e o ridículo se institucionalizaram. Quando as pessoas discutem e se apegam às
suas opiniões (interessante como todo mundo se sente obrigado e no direito de
dar pitacos em tudo) como um garotinho se agarra ao presente do último Natal,
afastando-o do coleguinha, ah! sim, alguma coisa está muito errada.
Com
isso, não quero dizer que as crianças devam ser parâmetros absolutos mas, de
forma equilibrada, compreendidas em sua importância. E muita coisa somente foi
possível, do ponto de vista tecnológico e científico, porque mentes
privilegiadas não rejeitaram a singeleza das mais triviais e ingênuas
brincadeiras. Existe algo magnífico, sublime, na simplicidade, e ela muitas
vezes é a resposta às questões complexas e insolúveis da vida. Mais exemplos:
1)
Alexander Graham Bell, o inventor do telefone,
imaginou a possibilidade de comunicação entre pessoas a longa distância, por
meio da voz (sim, já existia o telégrafo), ao ver dois garotos (ilustres
desconhecidos) esticarem um fio encerado, contendo uma caixa de ressonância,
simulando um fone nas extremidades, e conversavam através da engenhoca. Algo
que a maioria das crianças desconhece atualmente, e muitos de nós brincamos na
infância, foi o estímulo para o gênio do pai das telecomunicações. Pense nisso.
2)
Benjamim Franklin criou o para-raios a partir da
observação do seu filho (ninguém se lembra do seu nome) soltando pipas. Em uma
tempestade, estendeu uma pipa adaptada, a flutuar fixada por finas hastes
metálicas, e pode observar o efeito catalisador do raio ao percorrer o
dispositivo; de quebra, foi este lazer trivial a estabelecer o padrão de
transmissão das correntes elétricas, um século depois. Pense nisso.
3)
Frei Gusmão, um dos primeiros homens a subir à
atmosfera em um balão, teve o vislumbre do artefato a partir de uma festa de
aniversário de um sobrinho (quem se lembra?), que fez questão de decorar a sua
casa com “bexigas” cheias de ar. Ao perceber algumas delas soltarem-se e subir
aos céus, disse: “Eureka”, como Arquimedes, e foi à sua oficina conceber algo
mais divertido.
Existem outros infinitos
experimentos e descobertas realizadas a partir da observação de simples
brincadeiras e engenhocas reconhecidamente afeitas à diversão pueril.
Então, da próxima vez, quando um
dos seus filhos ou sobrinhos apresentar-lhe algo que ninguém é capaz de dar a
mínima importância, tome-o (mesmo diante do esperneio e choro do pequeno)! Quem
sabe, não estará diante de um novo achado a levar a civilização a patamares
jamais conhecidos? E torná-lo não apenas famoso, mas milionário?...
Pense nisso...
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Nota: Texto publicado originalmente na Revista Bulunga No. 2
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