Por Jorge Fernandes Isah
Recebi a seguinte pergunta de um amigo:
- Estou estagnado em meu cristianismo. Peco diariamente, e não sei mais o que fazer. Como posso ser um cristão ativo?
Há duas formas de tratar a questão: se você não for regenerado, nascido de novo, e não tiver certeza da sua salvação, clame a Deus com lágrimas, humildade e sujeição que seja transformado pelo poder do Espírito Santo à semelhança de Cristo, nosso Senhor.
Se for regenerado e tiver certeza da sua salvação, o que lhe direi talvez o ajude em sua caminhada.
Em qualquer dos casos, apenas a submissão à vontade de Deus, expressa em Sua palavra poderá operar frutos para a glória do Senhor, e uma vida cristã verdadeira. Ou seja, obediência, e não-rebeldia.
A Escritura é o parâmetro e fundamento do cristão. Ao nos revelar a quem devemos imitar: Jesus Cristo. Porém, pela nossa natureza, somos impedidos de ser como Ele em plenitude, impedidos de não pecar, e de fazer exclusivamente o bem. Mas isso não nos impede de tentar. Sei que o 'tentar' só levará a novas frustrações, visto que, no homem não se encontrará virtudes, santidade, zelo e perfeição. Em outras palavras, se o 'tentar' for apenas esforço próprio, resultará em nada. A busca pode e tem de ser em Deus; clamando-lhe pela transformação à imagem do Seu Filho Amado. Somente Ele poderá dar vida à criatura caída, morta em seus delitos e pecados, e fará dentro do Seu exclusivo propósito, para a Sua glória.
Há um ponto que pode ajudar, e até mesmo colaborar nesse processo: o testemunho, o trabalho na obra. Tenho compreendido que sou tão miserável como qualquer pecador, mas, pela graça de Deus [algo imerecido, que não depende do que eu faça, mas unicamente da vontade dEle], encontrarei alegria e satisfação em tudo que se relacione com o Seu nome. O trabalhar para Cristo pode e vai manter o crente num estado de proximidade com Ele, com a Sua Palavra, com irmãos que comungam do mesmo desejo, e com incrédulos que necessitam da demonstração do amor de Cristo que há em nós.
Se ficar apenas e tão somente a pensar no quanto se é ímpio, pecador; o quanto o mundo é mal; o quanto as pessoas estão se lixando umas para as outras; não se sairá do lugar, e tornar-se-á estéril no conhecimento, entendimento e testemunho de Cristo [a compreensão racional, intelectual do Evangelho de Cristo é fundamental, mas se ela ficar restrita apenas à mente se tornará estéril, pois não produzirá frutos para a glória de Deus. O cristianismo é sobretudo aplicar no dia-a-dia o amor, a graça e a misericórdia de Deus; a prática da sã doutrina; não é definitivamente simples teoria]. Tem-se de pôr a mão na massa; de revelar ao mundo a razão da nossa fé. Como? Há muitas formas: o evangelismo; a oração por irmãos e incrédulos; os estudos em grupo; a educação dos filhos; a comunhão com outros irmãos; o ensino do Evangelho; o sustento da obra missionária; a disponibilização dos recursos financeiros para o sustento material dos necessitados... E tantas outras maneiras segundo o chamado de Deus para cada um. Isso não é impossível de se fazer. Não digo que se faça tudo, mas algumas delas estão ao nosso alcance. O problema é que, no individualismo 'predador' dos tempos pós-modernos, devota-se o tempo, os talentos, o dinheiro, o ânimo e tudo mais para construir o castelo solitário, e em nada o solidário. Não existe o Cristianismo egoísta, narcisista; o Cristianismo é, em parte, cuidar dos interesses e necessidades do próximo, sejam espirituais ou materiais; para que nisso também Cristo seja obedecido e glorificado.
Não sei como é a sua igreja. A minha é uma congregação pequena. Os nossos cultos têm em torno de 15 pessoas, um pouco mais, um pouco menos, dependendo do dia. Então, há muita coisa a se fazer; tanto na igreja, junto aos irmãos e aos que não são crentes. Uma das marcas do cristão é o envolvimento nas coisas de Deus.
Por exemplo, vivo modestamente, mas não me sinto desconfortável, nem miserável; tenho a certeza de ter muito mais do que mereço ou fiz por merecer, e reputo tudo como dádiva de Deus; eu que sou ímpio, infiel, pecador, fui predestinado, chamado, santificado por Deus para gozar a Sua graça e misericórdia, pelo amor e sacrifício de Cristo. O louvor é dEle; a honra é para Ele; e me consido satisfeito com o que me deu.
Não há outra forma senão agradecer pelo que fez e tem feito em minha vida; e dentro do possível, em meio a todas as imperfeições e falhas, colaborar material e espiritualmente para a obra. Não lhe conto isso para me exaltar, como uma vantagem. Sei que se dependesse de mim, nada faria a não ser blasfemar o nome do Senhor. Antes da minha conversão, odiava as pessoas, todas, sem exceção, desprezava-as intensamente, e quanto mais as conhecia, mais a minha aversão à humanidade aumentava. Já não queria mais viver nem com a minha família, pensava seriamente em fugir, sumir, sem deixar rastros... Tornar-me um ermitão, recolher-me na solidão.
Os homens, crentes ou não, são pobres, cegos, nus e miseráveis, necessitados da misericórdia divina. E se eu mesmo fui escolhido e chamado a participar do Corpo de Cristo, quando fazia oposição a Ele, quando estava em flagrante inimizade, e, ainda assim Ele me amou, resgatou-me e salvou; não é desta forma que devemos proceder para com os perdidos? Ao vislumbrar os erros alheios, esqueço-me de que Deus me viu como eu era, e mesmo assim me amou. Não é como se deve agir? O fato de não sermos Cristo [e jamais O seremos], não me impede de ter compaixão, amor, misericórdia, tolerância para com os outros. A justiça não me cabe, não é um dos meus atributos, porque sou injusto; ela pertence a Deus. E Ele a fará, aqui e na eternidade, infalivelmente.
Ficar se martirizando pelos pecados, pelo que não se é capaz de fazer, pelo que os outros não são capazes de fazer, pelo mal que fazem, apenas manterá o crente em inércia, infrutífero (impedirá de fazer o que pode e foi capacitado)... E isso será o falso argumento que o manterá justificado a manter os braços cruzados. Não sei se fui claro, mas Paulo disse que a ele importava olhar para a frente, em direção à glória de Cristo Jesus; de nada adiantava olhar para trás, com risco de se perder a corôa da glória.
Não há um percentual a se atingir no que Deus quer que sejamos, pois o percentual é total, é sermos semelhantes a Cristo. O padrão no qual Deus se agrada é o padrão do Seu Filho; e nos vê por e através dEle, portanto, menos do que isso, é nada. Pois foi necessário morrer e ressucitar para que nEle atingíssemos o padrão que satisfaz a justiça divina. A Bíblia afirma que na eternidade seremos como o Senhor, que não pecaremos; feitos santos como santo é o nosso Deus.
Durante esta vida, cabe realizar aquilo que foi determinado por Deus. Pecarei, errarei, e falhar acontecerão muitas vezes, mas a Sua Palavra nos exorta a fazer aquilo a que fomos chamados. Não tenho o chamado para o pastorado, mas posso ser um conselheiro, afim de exortá-las e confortá-las sabiamente no Evangelho; não sou um grande evangelista ou missionário, mas distribuirei folhetos, Bíblias e literatura para que o nome do Senhor seja proclamado; não sou o presidente de uma fundação que distribui remédios, roupas, assistindo aos necessitados, mas posso dar uma cesta básica ou ajudar financeiramente uma instituição idônea que cuide de crianças, velhos, drogados; não sou um mestre, um professor, mas posso transmitir o pouco que sei a quem ainda não sabe minimamente; posso sustentar missionários junto aos índios, nos países islâmicos, nos países comunistas, ou mesmo no sertão da Bahia.
Há muito o que fazer, e o que me impede de fazê-lo? Normalmente são desculpas esfarrapadas. Como minha avó dizia: desculpa de flatulento é barriga cheia. Servem apenas para acomodar-nos à consciência cauterizada pelo mundanismo, e dizer que, se ninguém liga, por que devo ligar? Se o mundo não presta mesmo, para que ajudar? Todos podem fazer algo, mas é que esperamos um toque 'apocalíptico', algo grandioso no qual todos possam ver o quanto se é bom; e este é o maior problema: deixar de olharmos para nós mesmos e olharmos para Cristo. Se eu puder tirar um segundo os olhos de mim e transferi-los para Ele, pode ter certeza de que estarei vencendo a batalha contra o mal. Se vou conseguir? Não sei. Somos inconstantes, cheios de baixos e alguns poucos altos, mas creio que Deus age em nós, e o fará até o dia do Senhor, pois é Ele quem opera em nós tanto o querer como o efetuar.
Apenas o estudo da Escritura pode nos revelar o propósito de Deus para as nossas vidas, e nos mostrar o caminho certo, revelando o erro. Sem a verdade absoluta, o erro é relativo, e mesmo, aceitável.
O ponto é: olhamos apenas para nós, nossos problemas e dilemas [com os quais perdemos um tempo desnecessário e, na prática, obtemos poucos resultados], ou para Cristo?
Deus é o único que tem a resposta.