03 abril 2010

Cristo ou eu?















Por Jorge Fernandes Isah


Recebi a seguinte pergunta de um amigo:

- Estou estagnado em meu cristianismo. Peco diariamente, e não sei mais o que fazer. Como posso ser um cristão ativo?

Há duas formas de tratar a questão: se você não for regenerado, nascido de novo, e não tiver certeza da sua salvação, clame a Deus com lágrimas, humildade e sujeição que seja transformado pelo poder do Espírito Santo à semelhança de Cristo, nosso Senhor.

Se for regenerado e tiver certeza da sua salvação, o que lhe direi talvez o ajude em sua caminhada.

Em qualquer dos casos, apenas a submissão à vontade de Deus, expressa em Sua palavra poderá operar frutos para a glória do Senhor, e uma vida cristã verdadeira. Ou seja, obediência, e não-rebeldia.

A Escritura é o parâmetro e fundamento do cristão. Ao nos revelar a quem devemos imitar: Jesus Cristo. Porém, pela nossa natureza, somos impedidos de ser como Ele em plenitude, impedidos de não pecar, e de fazer exclusivamente o bem. Mas isso não nos impede de tentar. Sei que o 'tentar' só levará a novas frustrações, visto que, no homem não se encontrará virtudes, santidade, zelo e perfeição. Em outras palavras, se o 'tentar' for apenas esforço próprio, resultará em nada. A busca pode e tem de ser em Deus; clamando-lhe pela transformação à imagem do Seu Filho Amado. Somente Ele poderá dar vida à criatura caída, morta em seus delitos e pecados, e fará dentro do Seu exclusivo propósito, para a Sua glória.

Há um ponto que pode ajudar, e até mesmo colaborar nesse processo: o testemunho, o trabalho na obra. Tenho compreendido que sou tão miserável como qualquer pecador, mas, pela graça de Deus [algo imerecido, que não depende do que eu faça, mas unicamente da vontade dEle], encontrarei alegria e satisfação em tudo que se relacione com o Seu nome. O trabalhar para Cristo pode e vai manter o crente num estado de proximidade com Ele, com a Sua Palavra, com irmãos que comungam do mesmo desejo, e com incrédulos que necessitam da demonstração do amor de Cristo que há em nós.

Se ficar apenas e tão somente a pensar no quanto se é ímpio, pecador; o quanto o mundo é mal; o quanto as pessoas estão se lixando umas para as outras; não se sairá do lugar, e tornar-se-á estéril no conhecimento, entendimento e testemunho de Cristo [a compreensão racional, intelectual do Evangelho de Cristo é fundamental, mas se ela ficar restrita apenas à mente se tornará estéril, pois não produzirá frutos para a glória de Deus. O cristianismo é sobretudo aplicar no dia-a-dia o amor, a graça e a misericórdia de Deus; a prática da sã doutrina; não é definitivamente simples teoria]. Tem-se de pôr a mão na massa; de revelar ao mundo a razão da nossa fé. Como? Há muitas formas: o evangelismo; a oração por irmãos e incrédulos; os estudos em grupo; a educação dos filhos; a comunhão com outros irmãos; o ensino do Evangelho; o sustento da obra missionária; a disponibilização dos recursos financeiros para o sustento material dos necessitados... E tantas outras maneiras segundo o chamado de Deus para cada um. Isso não é impossível de se fazer. Não digo que se faça tudo, mas algumas delas estão ao nosso alcance. O problema é que, no individualismo 'predador' dos tempos pós-modernos, devota-se o tempo, os talentos, o dinheiro, o ânimo e tudo mais para construir o castelo solitário, e em nada o solidário. Não existe o Cristianismo egoísta, narcisista; o Cristianismo é, em parte, cuidar dos interesses e necessidades do próximo, sejam espirituais ou materiais; para que nisso também Cristo seja obedecido e glorificado.

Não sei como é a sua igreja. A minha é uma congregação pequena. Os nossos cultos têm em torno de 15 pessoas, um pouco mais, um pouco menos, dependendo do dia. Então, há muita coisa a se fazer; tanto na igreja, junto aos irmãos e aos que não são crentes. Uma das marcas do cristão é o envolvimento nas coisas de Deus.

Por exemplo, vivo modestamente, mas não me sinto desconfortável, nem miserável;  tenho a certeza de ter muito mais do que mereço ou fiz por merecer, e reputo tudo como dádiva de Deus; eu que sou ímpio, infiel, pecador, fui predestinado, chamado, santificado por Deus para gozar a Sua graça e misericórdia, pelo amor e sacrifício de Cristo. O louvor é dEle; a honra é para Ele; e me consido satisfeito com o que me deu.

Não há outra forma senão agradecer pelo que fez e tem feito em minha vida; e dentro do possível, em meio a todas as imperfeições e falhas, colaborar material e espiritualmente para a obra. Não lhe conto isso para me exaltar, como uma vantagem. Sei que se dependesse de mim, nada faria a não ser blasfemar o nome do Senhor. Antes da minha conversão, odiava as pessoas, todas, sem exceção, desprezava-as intensamente, e quanto mais as conhecia, mais a minha aversão à humanidade aumentava. Já não queria mais viver nem com a minha família, pensava seriamente em fugir, sumir, sem deixar rastros... Tornar-me um ermitão, recolher-me na solidão.

Os homens, crentes ou não, são pobres, cegos, nus e miseráveis, necessitados da misericórdia divina. E se eu mesmo fui escolhido e chamado a participar do Corpo de Cristo, quando fazia oposição a Ele, quando estava em flagrante inimizade, e, ainda assim Ele me amou, resgatou-me e salvou; não é desta forma que devemos proceder para com os perdidos? Ao vislumbrar os erros alheios, esqueço-me de que Deus me viu como eu era, e mesmo assim me amou. Não é como se deve agir? O fato de não sermos Cristo [e jamais O seremos], não me impede de ter compaixão, amor, misericórdia, tolerância para com os outros. A justiça não me cabe, não é um dos meus atributos, porque sou injusto; ela pertence a Deus. E Ele a fará, aqui e na eternidade, infalivelmente.

Ficar se martirizando pelos pecados, pelo que não se é capaz de fazer, pelo que os outros não são capazes de fazer, pelo mal que fazem, apenas manterá o crente em inércia, infrutífero (impedirá de fazer o que pode e foi capacitado)... E isso será o falso argumento que o manterá justificado a manter os braços cruzados. Não sei se fui claro, mas Paulo disse que a ele importava olhar para a frente, em direção à glória de Cristo Jesus; de nada adiantava olhar para trás, com risco de se perder a corôa da glória.

Não há um percentual a se atingir no que Deus quer que sejamos, pois o percentual é total, é sermos semelhantes a Cristo. O padrão no qual Deus se agrada é o padrão do Seu Filho; e nos vê por e através dEle, portanto, menos do que isso, é nada. Pois foi necessário morrer e ressucitar para que nEle atingíssemos o padrão que satisfaz a justiça divina. A Bíblia afirma que na eternidade seremos como o Senhor, que não pecaremos; feitos santos como santo é o nosso Deus.

Durante esta vida, cabe realizar aquilo que foi determinado por Deus. Pecarei, errarei, e falhar acontecerão muitas vezes, mas a Sua Palavra nos exorta a fazer aquilo a que fomos chamados. Não tenho o chamado para o pastorado, mas posso ser um conselheiro, afim de exortá-las e confortá-las sabiamente no Evangelho; não sou um grande evangelista ou missionário, mas distribuirei folhetos, Bíblias e literatura para que o nome do Senhor seja proclamado; não sou o presidente de uma fundação que distribui remédios, roupas, assistindo aos necessitados, mas posso dar uma cesta básica ou ajudar financeiramente uma instituição idônea que cuide de crianças, velhos, drogados; não sou um mestre, um professor, mas posso transmitir o pouco que sei a quem ainda não sabe minimamente; posso sustentar missionários junto aos índios, nos países islâmicos, nos países comunistas, ou mesmo no sertão da Bahia.

Há muito o que fazer, e o que me impede de fazê-lo? Normalmente são desculpas esfarrapadas. Como minha avó dizia: desculpa de flatulento é barriga cheia. Servem apenas para acomodar-nos à consciência cauterizada pelo mundanismo, e dizer que, se ninguém liga, por que devo ligar? Se o mundo não presta mesmo, para que ajudar? Todos podem fazer algo, mas é que esperamos um toque 'apocalíptico', algo grandioso no qual todos possam ver o quanto se é bom; e este é o maior problema: deixar de olharmos para nós mesmos e olharmos para Cristo. Se eu puder tirar um segundo os olhos de mim e transferi-los para Ele, pode ter certeza de que estarei vencendo a batalha contra o mal. Se vou conseguir? Não sei. Somos inconstantes, cheios de baixos e alguns poucos altos, mas creio que Deus age em nós, e o fará até o dia do Senhor, pois é Ele quem opera em nós tanto o querer como o efetuar.

Apenas o estudo da Escritura pode nos revelar o propósito de Deus para as nossas vidas, e nos mostrar o caminho certo, revelando o erro. Sem a verdade absoluta, o erro é relativo, e mesmo, aceitável.

O ponto é: olhamos apenas para nós, nossos problemas e dilemas [com os quais perdemos um tempo desnecessário e, na prática, obtemos poucos resultados], ou para Cristo?

Deus é o único que tem a resposta.

27 março 2010

O Adão Caído... Antes da Queda











Por Jorge Fernandes Isah


Sobre a revelação natural, aquilo que se pode conhecer de Deus através da criação, é interessante que, passado algum tempo [um tempo significativamente pequeno, ao menos aparente], o homem que convivia com Deus no Éden abandonou o conhecimento direto com Deus para se "aventurar" na idolatria. Adão e Eva foram os primeiros idólatras entre as criaturas, se não contarmos satanás e os anjos caídos. Aqueles momentos em que conversavam diretamente com Deus, recebiam dEle o sustento material, em que foram designados para reinar sobre as demais criaturas, e, em especial, viram a demonstração da Sua misericórdia e poder, tudo isso, e muito mais que lhes era agraciado exclusivamente pela bondade divina, não foi suficiente para evitar que caíssem, dando ouvidos à serpente.

Fico a perguntar: Como foi possível? Estando ali, diante de Deus, no relacionamento pessoal e direto com o Criador, ainda assim, sem conhecerem o mal, sem saber o que era pecado, sem a liberdade de escolher o mal [até porque não poderiam escolher o que lhes era desconhecido], revelaram-se rebeldes, e desprezaram a ordem direta do Todo-Poderoso [até então, a única] para darem ouvidos à mentira de uma serpente. E, ao fazê-lo, claramente ignoraram e repudiaram todo o relacionamento íntimo que tinham com Deus em favor de uma suposta igualdade, de se tornarem como Ele.

A questão ali não foi de escolha, pura e simplesmente, pois como haveria uma reles serpente de se contrapor e impor no coração do casal, numa questão de minutos, a corrupção e rebeldia a Deus? [ainda que a serpente fosse a mais bela das criaturas, não passaria de uma criatura diante do Criador]. Teríamos de entender que Deus não criou um ser perfeito, mas um homem estúpido a ponto de avaliar e escolher insanamente a mentira em detrimento da verdade. Então, não nos seria difícil reconhecer em Adão e Eva a burrice típida da natureza humana, levando-os às escolhas inapropriadas.

Em todos os aspectos, Adão e Eva me parecem não ter o conhecimento de Deus, ainda que tivessem um relacionamento, ou um conhecimento parcial dEle. É mais ou menos o que se deu com Lúcifer. Ele tinha um relacionamento, não o conhecimento que somente pode ser dado pelo próprio Deus a quem quiser dar. O mesmo se deu com Judas Iscariotes. Por horas, meses e anos, teve um relacionamento direto com o Senhor, foi-lhe discípulo, mas de nada serviu-lhe esse relacionamento. Por que? Porque Judas não foi regenerado, nem teve a revelação especial de Deus, ao contrário, foi escolhido para manter-se morto em sua velha natureza. É preciso muito mais do que o simples relacionamento com Deus. Muito mais do que o conhecimento da Sua existência, pois até mesmo os demônios creem, e estremecem [Tg 2.19].

Trocando em miúdos: Lúcifer e os anjos maus, Adão e Eva, eu e você, somos pecadores miseráveis, e impossíveis de ter o conhecimento de Deus seja por qual método for, seja por qual esforço for, seja por qualquer ação ou decisão que tomemos. Apenas o próprio Deus pode se revelar, e o fará exclusivamente a quem quiser. As impressões de Deus existem como sensações inexatas, muito distante do Absoluto, e a prova está nas várias religiões que tentam inutilmente conhecê-lo a partir de suas próprias corrupções. O que se tem são tentativas frustradas na ilusão de se obter êxito. Por mais que o homem natural queira buscar a Deus [hipoteticamente, visto o homem não querê-lo, ainda que sinta a necessidade de tê-lo], o que deseja encontrar é qualquer coisa chamada "deus", não o Deus único, vivo e bíblico.

Em linhas gerais, o Éden não foi suficiente para que eles pudessem conhecer a Deus, o que somente através da regeneração, do novo-nascimento, é possível; levando-me a concluir que tanto Adão como Eva não cairam apenas [assim como satanás e os seus], mas não eram transformados pelo Espírito, e os seus corações de pedra não haviam sido transformados em corações de carne.

Não é interessante que a Bíblia nos revela que tanto Lúcifer como Adão eram obras-primas da criação? Por que então o relacionamento íntimo e direto com Deus os levou à rebeldia? Como disse anteriormente, eles tinham um relacionamento com Deus, não o conhecimento especial de Deus, possível apenas aos regenerados e aos nascidos-de-novo, aos transformados pelo Seu poder [mesmo os réprobos e o diabo têm um relacionamento com Deus: eles odeiam e desprezam-no, o que é uma forma de relacionamento].

Alguém pode dizer: como pode chegar a esta conclusão se Deus criou Adão e Eva perfeitos?

Ao que digo: perfeitos em relação a quê? Às outras criaturas? Ou a Deus? Seriam as criaturas perfeitas? Se eram, porque se rebelaram e caíram [a primeira queda foi de Lucifer, depois, Adão]?

A Bíblia diz que Deus considerou a criação do homem e tudo quanto tinha feito muito bom [Gn 1.31], porque tudo o que Deus faz é bom; mas não vemos nenhuma afirmação de que eram perfeitos. O fato de Adão ser a imagem de Deus ["imago dei"], assim como também somos, não quer dizer que ele fosse perfeito como Deus, assim como também não somos. Certamente eram perfeitos em relação a toda a criação, como "top" da criação. Dizer que pelo pecado essa perfeição decaiu nos leva ao seguinte questionamento: Adão caiu por causa do pecado ou pecou porque caiu? Ao comer do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, ele já estava em rebeldia, já havia pecado em seu coração, pois o ato primeiramente acontece no coração, interiormente, para depois ser consumado [Tg 1.15]: "Porque do coração procedem os maus pensamentos, mortes, adultérios, fornicação, furtos, falsos testemunhos e blasfêmias" [Mt 15.19].

Veja bem, é impossível que Adão pudesse escolher o mal sem conhecê-lo, mesmo que o diabo tenha-o influenciado e seduzido. Tinha de haver uma disposição no coração para o mal; tinha de haver a semente da corrupção para que o adubo maligno pudesse germiná-la. E isso me leva a crer que o casal do Éden, ao comer o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, apenas deflagrou o que já continha no íntimo: o pecado latente. Não parece esta a mesma opinião de Paulo? "Assim está também escrito: O primeiro homem, Adão, foi feito em alma vivente; o último Adão em espírito vivificante. Mas não é primeiro o espiritual, senão o natural; depois o espiritual. O primeiro homem, da terra, é terreno; o segundo homem, o Senhor, é do céu" [1Co 15.45-47]. Ele não vê Adão como um homem espiritual, mas natural, e o texto não diz que ele o foi apenas após a queda; porque não temos dois Adãos vivendo no primeiro Adão, um santo e perfeito que, caído, se tornou pecador e miseravelmente imperfeito. Ele tinha de, mesmo antes, já ser imperfeito, não-santo, não-regenerado; ainda que a maior de todas as criaturas, mas sem a imagem celestial, somente possível através de Cristo. Novamente, Paulo: "Qual o terreno, tais são também os terrestres; e, qual o celestial, tais também os celestiais. E, assim como trouxemos a imagem do terreno, assim traremos também a imagem do celestial...  Mas graças a Deus que nos dá a vitória por nosso Senhor Jesus Cristo" [1Co 15.48-49, 57]

No frigir dos ovos, Adão não tinha o conhecimento necessário de Deus, nem de si mesmo, apenas possível pela ação do próprio Deus; ele era uma criatura, não um filho; e a prova está no fato de comer o que lhe era proibido. Adão tinha um relacionamento, uma ligação com Deus que não o impediu de pecar; insuficiente, mesmo em um nível direto, para levar a conhecê-lo. Para isso, seria imprescindível reconhecer em Deus a Sua soberania, santidade, perfeição, e senhorio; reconhecer em si mesmo a imperfeição, a falibilidade, a corrupção, e a urgência de se sujeitar a Ele.

Neste aspecto, sem a queda, o homem jamais teria o entendimento adequado e verdadeiro do Deus santo e do homem transgressor. Sem a queda, seríamos criaturas "fora da realidade", vivendo em um mundo de esquizofrênia e ilusão quanto ao que somos e ao que o Senhor é. Por isso, ela foi inevitável, tinha de acontecer; sem a qual jamais os eleitos seriam cheios do amor divino, e Deus não poderia se manifestar plenamente ao Seu povo. O que nos remete à perfeição divina, à perfeição do decreto eterno, e tudo o que nele está determinado, inclusive o mal, o pecado e a queda.

Sem a revelação divina, a revelação especial [a Escritura inspirada, autoritativa, inerrante e infalível], não existe o conhecimento dEle; e todas as respostas serão tão-somente um esforço de se obtê-las no próprio homem, quando estão unicamente em Deus; restringindo-os, dando-os, a quem quer, segundo a Sua vontade; não sendo realizáveis pelo homem, incapaz de gerá-las por si e em si mesmo.

A afirmação de que a revelação geral é suficiente para que o homem compreenda Deus, a criação, e a si, é errônea, pois o "homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente" [1Co 2.14]. O que se tem é uma percepção da Sua existência e poder, contudo, impossível de levar à verdade [ainda que se apreenda uma ínfima parte dela, não se tem o todo; e sem o todo, a verdade é incompreensível]; antes, fomenta inúmeros enganos, na repetição tosca do mesmo erro: a fé no humano, como o sofisma devastador, altamente destrutível, apropriando-o ainda mais da condenação iminente, ao afirmar a possibilidade do homem ter comunhão com Deus por meios próprios, visto a loucura de Deus ser mais sábia do que os homens; e a fraqueza de Deus ser mais forte do que os homens [1Co 1.25]. E isso também foi inerente ao Éden, evidente não somente na queda, mas antes dela. Senão, como cairia Adão?

Apenas a revelação especial, as sagradas e santas Escrituras, a partir do novo homem, da nova natureza dada por Deus, resultará na transformação e regeneração da mente humana, tornando-a cativa a Cristo; ao ponto de, no glorioso dia do Senhor, estar completamente imune ao pecado e o mal, para que o eleito seja apresentado perfeito em Jesus Cristo [Cl 1.28].

A revelação natural torna o homem inescusável [Rm 1.20], ou seja, condenável e condenado; jamais capaz de levá-lo à salvação. Porque apenas por Cristo, a revelação única e final de Deus, o homem pode alcançar o conhecimento pleno e verdadeiro dEle. Este poder vem do alto, não do homem. E está acessível aos eleitos, àqueles a quem Deus quis se revelar, pois o espírito do homem sabe as coisas do homem, que nele está.

"Assim também ninguém sabe as coisas de Deus, senão o Espírito de Deus" [1Co 2.11], e os que receberam o Espírito que provém de Deus, para que pudessem conhecer o que lhes é dado gratuitamente por Ele [1Co 2.12].

Nota: Este artigo é a ampliação do meu comentário no blog do Roberto Vargas Jr, ao texto "O Revelado"; o qual recomendo a leitura.

21 março 2010

Santidade: Temporal ou Eterna?












Por Jorge Fernandes Isah

"Segui a paz com todos, e a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor" [Hb 12.14].

Primeiro, vamos definir a palavra santo, que quer dizer separado. Como Deus é santo, Ele é separado de toda a Sua criação. Existe a idéia errônea e antibíblica de que a criação é a extensão de Deus, como se tudo o que veio a existir pelo poder da Sua palavra fizesse parte dEle. Ora, esta visão é pagã, comumente chamada de panteísmo [grego: pan, "tudo", + theós, "deus"], a qual define ser Deus o todo, e o todo Deus; uma espécie de universalidade dos seres, onde o conjunto de todas as criaturas [materiais e espirituais], a sua totalidade, compõem a unidade de Deus. O problema desta doutrina é que a criação e o Criador se confundem e se fundem, assim como o infinito e o finito, o material e o espiritual, o que leva à idéia de que tanto um como o outro são autocriados ou podendo ser criados por outra força. Mas toda essa confusão é fruto de outra artimanha do maligno, sempre promovendo a mentira, o qual "não se firmou na verdade, porque não há verdade nele. Quando ele profere mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso, e pai da mentira" [Jo 8.44]. A Bíblia nos revela o contrário: toda a criação, seja o bem e o mal, material e espiritual, está separada de Deus, não é uma "extensão" dEle, nem subsiste e vive nEle, mas é sustentada e sobrevive por Ele.

Bem diferente do sistema proclamado pelos pagãos, anacrônico à Bíblia: a criação existe, vive e se mantém pelo poder de Deus, segundo a Sua vontade, nada além disso.

De certa forma, o entendimento errado dos atributos divinos leva até mesmo cristãos a cogitarem inadvertidamente uma espécie de "panteísmo". A confusão está na incompreensão da doutrina da onipresença e onisciência, que diz não haver lugar no universo onde Deus não esteja; não que está a ocupar todo o espaço, visto estar fora dele, mas no sentido de que tudo o que acontece, seja onde for, encontra-se diante de Deus e é promovido por Ele; e de que também tem o conhecimento perfeito de tudo, em seus mínimos detalhes, e nada pode escapar à Sua infinita presença. Como o salmista diz: "Para onde me irei do teu espírito, ou para onde fugirei da tua face? Se subir ao céu, lá tu estás; se fizer no inferno a minha cama, eis que tu ali estás também" [Sl 139.7-8]. O que a Escritura diz claramente é que Deus está em todos os lugares, não há recôndito que não alcance, o que é diametralmente oposto à idéia de que Ele é tudo, e tudo é Ele: "Porventura sou eu Deus de perto, diz o Senhor, e não também Deus de longe? Esconder-se-ia alguém em esconderijos, de modo que eu não o veja? diz o Senhor. Porventura não encho eu os céus e a terra? diz o Senhor" [Jr 23.23-24]

Como Criador de todas as coisas, Ele conhece todo o processo exaustivamente, desde o nascimento até a morte, da existência à destruição, sendo que nada acontece sem que seja da Sua vontade ou alheio a ela, "porque o Senhor dos Exércitos o determinou; quem o invalidará? E a sua mão está estendida; quem pois a fará voltar atrás?" [Is 14.27]. O esclarecimento é necessário para não se ter dúvidas de que Deus está separado da Sua criação, de que Ele não faz parte dela, mas está aparte dela; de que são coisas distintas, ainda que a criação seja completamente dependende de Deus e da Sua vontade, sem o que jamais existiria ou sobreviveria.

Então Deus é e está separado de toda a criação, ainda que ela seja consequência do Seu atributo de onipotência; porém como Deus é perfeito, puro e justo, é distinto da criação, que não possui a perfeição, a pureza e justiça divinas, sendo imperfeita, impura e injusta.

As obras de Deus não são Deus, ainda que existam por e para Deus, logo, pertencentes e sujeitas a Ele [tanto para nascer, viver ou morrer], sem que possam "contaminá-lO", antes é o Senhor quem as santifica ou não, segundo a Sua soberana vontade.

Por isso a Bíblia afirma que todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus [Rm 3.23]. Há uma separação natural entre o Criador e as criaturas em virtude de suas naturezas distintas, agravada pelo pecado [que torna as criaturas ainda mais distantes do Senhor], sendo que, do ponto de vista temporal, Deus se aproximará daquelas que foram salvas eternamente por Cristo, e jamais se achegará àquelas eternamente destinadas à perdição. 

Do ponto de vista atemporal, Deus sempre estará próximo do eleito, mesmo que, no tempo, ele ainda não seja convertido; pois a salvação aconteceu no tempo, mas foi decretada na eternidade. Graças a Ele, Cristo, o Cordeiro sem pecado, o qual morreu na cruz e ressuscitou para que os eleitos, diante de Deus, estivessem mais alvos e mais brancos do que a neve [Sl 51.7], sem nenhuma mácula, santos como santo é o nosso Deus, "porquanto está escrito: Sede santos, porque eu sou santo" [1Pe 1.16].

No tempo, a santidade se inicia na regeneração que o Espírito Santo opera em nós, como a boa obra de Deus iniciada e que atingirá o ápice na eternidade [Fp 1.6], quando o nosso corpo corruptível se transformar em incorruptível, e formos semelhantes a Cristo nosso Senhor [1Co 15.52-53]; quando não haverá mais morte, nem pecado. Ele operará a santidade através da incorruptível "palavra de Deus, viva, e que permanece para sempre" [1Pe 1.23]. Portanto, o ser santo é algo inalcançável para o homem, somente o Senhor é quem pode torná-lo e fazê-lo separado do mundo, e ligado a Ele; tirados do meio da Sua criação, de entre as criaturas corruptíveis, tornando-o filho adotivo em Cristo, e assim será mantido pelo Seu poder e graça.

Eternamente, já somos salvos antes da fundação do mundo, muito antes do nascimento e queda do primeiro homem, pois o decreto divino estabeleceu que os eleitos, em número certo e definido, seriam tantos quanto Deus escolheu, conheceu e predestinou para serem conforme a imagem de Cristo [Rm 8.29]. Desta forma todos os eleitos [mesmo os que ainda não foram regenerados no tempo] já são salvos e santos. Pode parecer estranho que um homem em pecado, irregenerado, tenha comunhão com Deus. A Bíblia diz que o Senhor abomina o pecado. Porém, como o Espírito Santo faria uma obra de regeneração em um pecador? Haveria como Deus ter comunhão com o ímpio? Segundo as Escrituras, não! A pergunta é: em que ponto o homem deixa de ser ímpio? Como é possível ao homem sair da esfera pecaminosa para a santa? Teríamos de concordar com os arminianos de que somente após escolher a Deus o homem poderá ter comunhão com Ele. Ou seja, a decisão humana o santifica ao ponto de ser capaz de reconhecer em Cristo o seu salvador, e então, somente então, ter o privilégio de comunhão com Deus. O que remeteria os méritos da regeneração ao homem, não a Deus. Mas há uma profusão de textos bíblicos que desmentem essa hipótese. Paulo diz: "Não há um justo, nem um sequer. Não há ninguém que entenda; Não há ninguém que busque a Deus.Todos se extraviaram, e juntamente se fizeram inúteis. Não há quem faça o bem, não há nem um só" [Rm 3.10-12]

O dilema persiste: o homem não pode se tornar santo nem Deus ter comunhão com o pecador. Logo, Deus, que está fora do tempo, já nos tem como santos, porque fomos santificados eternamente. Ao promulgar o decreto eterno, sendo o Senhor imutável, e de que toda a Sua vontade se realizará infalivelmente, "pois nenhum dos teus propósitos pode ser impedido" [Jó 42.2],  mesmo sem ainda existir, o eleito já está salvo, já é santo. A vontade e decisão em eleger um povo para Si não aconteceu no tempo, mas muito antes dEle criar o tempo. Também escolheu que o processo ocorresse no tempo e, por nossas limitações, tomássemos consciência da pecaminosidade natural, do estado degradante, da morte iminente e incontestável, caso não tivesse nos escolhido. Pois a santidade divina é que nos impede de permanecer no pecado, transformando pecadores em santos aos nossos olhos, mas aos Seus olhos já fomos santificados pelo sacrifício de Cristo, muito antes do Senhor morrer na cruz.

A questão é de perspectiva: quando olhamos para nós mesmos, não temos a visão do resultado [ainda que a Bíblia nos revele o fim de todo eleito: a eternidade diante de Deus]. O fato de estarmos no tempo revelará um encadeamento de situações, as quais serão reveladas progressivamente, indicando o estado de regeneração ou de corrupção. Mesmo assim, para muitos, será impossível conhecer o real estágio em que se encontram, e o fim que os aguarda; apenas no dia do Juízo tomarão conhecimento de que estavam mortos, e permanecerão mortos. Ao passo que, para o Senhor, não somente os fatos, mas todo o fim já é do Seu conhecimento. Como tudo ocorrerá segundo o Seu desejo, seguindo rigorosamente o decreto eterno em que todos os detalhes foram determinados, Deus conhece os Seus escolhidos, e já os tem por certo como Seus. Ou seja, para nós, é um processo; para Deus, já está tudo consumado.

Certo é que somos nós a alcançar a santidade [não é Deus quem a alcança por nós; já que Ele é e sempre foi santo, e não precisa alcançar nada, pois é e sempre foi o perfeito Senhor do universo]. Deus nos capacita, nos habilita e transforma para sermos santos, constituindo-nos o corpo do Seu Filho Amado, o qual é a cabeça. E assim seremos um com todos os escolhidos, os quais são justificados exclusivamente por Deus. A obra é dEle, mas nós é que somos feitos santos e mantidos santificados. Assim, devemos sempre buscá-la, clamar ao Senhor que nos transforme a cada dia, para que a boa obra seja concluída naquele dia.

E, ao fim, como o próprio Senhor disse, seremos um com Ele, assim como o Pai é um com o Filho [Jo 17.21]; separados para Ele, por intermédio dEle, para a Sua glória; definitivamente afastados do pecado, da morte, da corrupção e do mal; o que não é panteísmo, mas Cristianismo bíblico, por que as criaturas destinadas à perdição estarão irremediavelmente separadas de Deus na eternidade, ao contrário de nós.

Alerta: nada do que disse seja mal-interpretado; a santidade é uma obra completa de Deus nos eleitos, mas se o homem não é santo, e despreza a santidade, não é eleito, nem "verá a vida, mas a ira de Deus sobre ele permanece" [Jo 3.36].

10 março 2010

Elmer Gantry: Entre Deus e o diabo

 












Por Jorge Fernandes Isah

Assistindo ao filme Elmer Gantry1, "Entre Deus e o Diabo", estrelado por Burt Lancaster e Jean Simmons, não pude deixar de me impressionar com a estarrecedora descrição e semelhança com o movimento reavivalista evangélico americano. Há de tudo um pouco: falsos e eloquentes sermões, e técnicas para atrair, comover e impactar a platéia. De certa forma, muitos grupos religiosos da atualidade se baseiam, ou muito bem poderiam ter se baseado, em cenas do filme. Seria o caso da realidade imitando a ficção.

É claro que o filme tem um toque caricato, farsesco, como o de uma sátira, mas pela impressionante semelhança com os movimentos evangélicos atuais (os neopentecostais e movimentos da fé), não é difícil reconhecer também a caricaturização das quais muitas igrejas tornaram-se reféns. Como na vida real, no filme há de tudo um pouco: mercantilismo, charlatanismo, pragmatismo, exibicionismo, megalômanos a exalar o fétido odor diabólico.O púlpito é um palco. Os ministradores, atores. E a igreja, uma assistência patética.

Há apelos, comoção, cartaxe, latidos, gritos, convulsão, e tudo o que de pior o sincretismo tem produzido nas últimas décadas, numa espécie de "orgia" espiritual. Em muitos momentos, tem-se a impressão de estar em um culto na igreja evangélica mais próxima, na desordem sonora, na metalinguagem espaventosa, nas encenações abusivas e licenciosas, buscando resgatar através do sentimentalismo e da banalização um "novo cristianismo", explosivo em sua profusão cênica, porém, burlesco, deformado e inócuo em seu caráter religioso. 

Abriu-se mão do princípio para se valorizar apenas os meios, desde que o fim se tornasse exequível e imediático. No fim das contas, é um show como outro qualquer, onde se tem de mobilizar a platéia, criar empatia, fazer valer cada centavo gasto e ganho, iludi-los com uma espécie de salvação onde Cristo não está evidente, nem é-se possível encontrá-lo ou distingui-lo na mensagem, mesmo entre aparente piedade, mesmo que na ingenuidade.

Elmer Gantry é um ambulante, uma espécie de caixeiro viajante, que lança a sua lábia sobre os incautos, vendendo produtos imprestáveis por preços extorsivos. É um bêbado, mulherengo, mentiroso e fanfarrão, que, da noite para o dia, se vê alçado ao posto de pastor; de vendedor ambulante fracassado a pastor itinerante de sucesso.

A interpretação histriônica de B. Lancaster confere um ar de comicidade e zombaria ao seu personagem, capaz de rir-se de si mesmo e da sua imoralidade. É um homem sem escrúpulos, que vê naquela oportunidade a chance de fugir de sua vida miserável. Não há como não vê-lo como um bufão,que em sua tolice consegue enganar uma multidão de tolos ainda maiores do que ele. Burt consegue dar uma áurea de simpatia ao personagem, e, em muitos momentos, é possível acreditar que todo o seu empenho não passou de uma diversão, uma brincadeira ingênua, na qual sequer acreditou. Mas à medida que os "frutos" vão surgindo: conversões em massas (os números são meticulosamente citados), o volume de ofertas, o auxílio de igrejas e organismos religiosos, e os convites para novas "campanhas" em cidades grandes fazem aumentar substancialmente a fama da "tenda evangelística", Gantry começa a acreditar no seu poder de mobilizar milhões de pessoas e dinheiro. Ele crê literalmente na sua força.

Inicialmente ele é a sombra da irmã Sharon Falconer, uma profetisa/evangelista errante, sem vínculo denominacional, extremamente carismática (em todos os sentidos), e que arrebata uma platéia cativa à sua elegância e suavidade quase angelicais. Jean Simmons (uma atriz fantástica) tem uma interpretação diametralmente oposta a de Burt L. Ela é contida, delicada, quase diáfana, como se flutuasse por entre os cenários, mas alcança um brilhantismo poucas vezes visto em Hollywwod. Por isso, talvez a dúvida que se tem: se ela acreditava realmente em sua santidade ou, como Elmer, estava a aproveitar-se da situação, já que a coisa toda parecia dar certo. Não é assim que os movimentos arminianos-positivistas acreditam? Se o negócio funciona, é sinal de que Deus está a dirigi-lo e abençoá-lo, do contrário, por que daria certo? (At. 5.38-39).

Uma das frases mais emblemáticas é quando Sharon diz ao Sr.Lefferts, o qual se recusava a ajoelhar-se para uma oração (um jornalista ateu que acompanhava a "tenda" enquanto fazia pesquisas para uma futura reportagem sobre o movimento.O auter-ego de Sinclair Lewis): Você pode não acreditar em Deus, mas ele acredita em você! (citação livre, não literal do texto). Demonstrando de que forma o humanismo consegue corromper os valores cristãos, invertendo a ordem ao fazer Deus ter fé no homem, quando somos nós que devemos crer nEle, conforme ordenam as Escrituras.
 
O filme é uma crítica ácida ao evangelicalismo emergente americano (o livro é de 1926),  permeado pela hipocrisia, a desfarçatez e a teatralidade, capaz de produzir a tolice e o engano ao invés de homens salvos e servos verdadeiros.

Por ter lido Lewis na adolescência, percebi que a crítica ao evangelicalismo reavivalista americano à "lá Charles Finney", subentende-se uma crítica ao capitalismo. Sinclair era um dos mais ferrenhos combatentes do "american way of life" presente em muitas de suas obras, por exemplo, Babbit (provavelmente a mais famosa). Ele usa o Cristianismo como palco para demolir o mercantilismo e a sociedade hipócrita e imoral obstinadamente servil ao dinheiro de sua época. Como crítico de costumes, Lewis até que se sai bem, apesar de ser um autor relegado ao pó do esquecimento, e que não tem nenhum apelo às novas gerações cada vez mais bestializadas e estúpidas. Não que Lewis seja um gênio. Não que o seu discurso seja verdadeiro. Na verdade, ele não é, duplamente. Mas deve ser lido e avaliado como o porta-voz de uma época; e que pode ser útil para se averiguar também a presente geração. Na verdade, ele não era um marxista, mas um liberal que rejeitava veementemente suas raízes tradicionais e campesinas.

Voltando ao filme, Lefferts, o jornalista, diz em sua matéria de capa do jornal Zenith sobre a "tenda": O que é uma caravana? Uma igreja? Uma religião? Ou um circo, onde o espetáculo são as atrações bizarras? (novamente, citação livre, não literal).

Ainda que saido da boca de um ateu (creio que Lewis o era, apesar da educação religiosa tradicional), não seriam os questionamentos do autor um alerta para o momento em que vivemos? Não estamos numa espécie de "vale-tudo", onde o desprezo a Deus e Sua palavra são tão notórios que Ele se utiliza da voz dos ímpios para condenar o que estão a fazer com a igreja? Não estamos tão obliterados, cegados pela vaidade, na crença de que temos super-poderes e somos super-homens, que um réprobo pode ser usado para nos alertar? Como diz o ditado: em terra de cego, quem tem um olho é rei.

Ainda que o mundo não seja capaz de julgar a igreja, nem o possa fazer, por que rejeitamos os alertas e persistimos em blasfemar o nome de Cristo entre os incrédulos? (Rm 2.24). 

Porém, ao final, cumprir-se-á o alerta de Cristo: "Toda a árvore que não dá bom fruto corta-se e lança-se no fogo. Portanto, pelos seus frutos os conhecereis. Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? e em teu nome não expulsamos demônios? e em teu nome não fizemos muitas maravilhas? E então lhes direi abertamente: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniqüidade" (Mt 7.19-23).

Porque o homem prudente escuta as Suas palavras, não o cainhar do lobos. 

Nota: 1- Elmer Gantry/Entre Deus e o Diabo (título em português)
Diretor: Richard Brooks, EUA, 1960
Elenco: Burt Lancaster (ganhador do Oscar de ator principal), Jean Simmons, Arthur Kennedy, Dean Jagger, Shirley Jones, Edward Andrews, Patti Page, John McIntire, Rex Ingram, Hugh Marlowe, Philip Ober
Roteiro: Richard Brooks
Baseado na novela Elmer Gentry, de Sinclair Lewis (o primeiro escritor americano laureado com o prêmio Nobel, o qual declinou receber)
Música: Andre Previn
Produção: United Artists
Cor:145 min.

04 março 2010

Pecado Não É Múltipla Escolha!

 















Por Jorge Fernandes Isah

Não tenho por hábito transcrever diálogos pessoais, mas recebi o pedido de ajuda de um irmão. Orei, e respondi-lhe. Alguns dias depois, escreveu-me aflito por cair novamente no pecado. Eis suas palavras:

“Preciso de uma mudança, eu não quero servir Jesus desse jeito, com pecado; eu lembro da passagem que fala de Acã e seu pecado escondido fez o arraial de Deus regredir. Eu faço a obra de Deus, prego, evangelizo, mas peco. Por favor, me ajude eu preciso restaurar o temor que eu tinha no meu primeiro amor, o medo de pecar é algo que eu já perdi, mas quero recuperar isso”.

A minha segunda resposta:

É difícil ajudá-lo a distância, sem conhecê-lo. Mas se esta é a vontade de Deus, que assim seja.

O ideal é que você tivesse um irmão maduro na fé, alguém que pudesse auxiliá-lo, como lhe disse, alguém com o qual convivesse, que estivesse próximo. Preferencialmente, procurando o auxílio do seu pastor. Sei como são essas coisas de timidez, pois também sou tímido, e não gosto de me expor. Mas você tem de entender que, no caso da Igreja, como membro do Corpo, faz o Corpo sofrer, ainda que os irmãos não saibam. Pois Cristo, como a cabeça, sabe. Paulo descreveu a situação assim: “de maneira que, se um membro padece, todos os membros padecem com ele; e, se um membro é honrado, todos os membros se regozijam com ele" [1Co 12.26].

Depois que lhe escrevi, tenho orado por sua vida e pedido a Deus que o liberte desse vício e pecado, e meditado na sua situação. Como contei, fui viciado em pornografia e sexo por muitos anos, até a minha conversão, e sei como esses pecados nos controlam e dominam. No início, quando da conversão, há uma parada abrupta em nosso comportamento pecaminoso, é como se não houvesse nenhum desejo e vontade em pecar. Acontece que a nova natureza em Cristo faz com que a natureza carnal fique adormecida. Nessa fase, somos apenas de Cristo, queremos ir aos cultos, fazer evangelismo, ler a Bíblia, orar e falar de Jesus para todas as pessoas de uma forma inimaginável, quase compulsiva.

Então progressivamente perdemos esse "furor" inicial, e acontece da nossa antiga natureza ressurgir pouco a pouco. Começamos a ouvir músicas seculares, a ver tv, cinema, e tantas outras atividades tal qual antigamente. Voltamos aos antigos amigos, e consideramos que somos fortes o suficiente para enfrentar o mundo. Paulo foi claro ao nos alertar: Aquele, pois, que cuida estar em pé, olhe não caia” [1Co 10.12]. Logo, começamos a olhar para as mulheres com um olhar diferente, quase como no passado, e sentimos desejos de ver o que é proibido, e de atentar para o proibido. O pecado nos atrai novamente, e somos atraídos por ele. Então, meu irmão, só há duas opções:

1) Nos rendemos ao pecado, e pecamos, ainda que depois venha o arrependimento.

2) Resistimos ao pecado, mesmo sabendo que Deus é misericordioso para nos perdoar.

O problema não é o pecado em si, ele é conseqüência do nosso relacionamento com Deus, ou da falta dele. Naquele momento, Deus é menor do que o desejo de pecar. Naquele momento, o pecado [seja qual for] é o meu deus. A questão é: amo o Senhor verdadeiramente a ponto de considerar não pecar, e não pecar quando tentado? Ou o meu amor é insuficiente para resistir ao pecado? [lembrando-me do novo-nascimento, a velha natureza estava soterrada, inativa, pela nova natureza. O que precisamos fazer é soterrar novamente a antiga natureza, e com ela, as práticas pecaminosas].

O mais importante é não gastar tempo ouvindo a própria voz. Ela lhe trará uma gama de ilusórias desculpas, que podem trazer alívio momentâneo, mas jamais o curará. De uma forma ainda pior, poderá cauterizá-lo e colocá-lo em uma posição de acomodação ao pecado. Ouça a voz de Deus, o qual fala pela Escritura Sagrada. Não canse de repetir para si mesmo: pornografia é pecado! E, ao crente, somente há uma forma de se relacionar com o pecado: rejeitando-o, derrotando-o, impedindo-o de se levantar da sarjeta, do monturo.

Não se engane com as mentiras que diz e já tem preparado para a ocasião, elas somente o manterão escravizado. Antes não rejeite a verdade, e se lance humildemente aos pés do Senhor. Diante dEle não há como nos exaltarmos e pecarmos [a tentativa soberba do homem em se sobrepor a Deus, de se exaltar acima dEle, como se isso fosse possível]. Diante dEle estaremos sempre humilhados, submissos, e em posição de não-pecado, não-autoglorificação, de não-rebeldia, mas de submissão, negação a si mesmo, de reconhecimento da nudez, pobreza, cegueira e iniqüidade humanas; e necessitados da Sua graça e sustento físico-espiritual. Como João o Batista disse: "É necessário que ele cresça e que eu diminua” [Jo 3.30].

Não deixe a mentira tomar conta da sua mente, e dizer que você é o que jamais foi. Leia e medite na verdade, a Bíblia, através da qual Deus nos fala e nos ensina a trilhar os caminhos santos para os quais Cristo nos chamou, capacitando-nos pelo poder do Espírito Santo.

Por que não devo pecar? Por que é uma ordem? Ou por que o meu amor a Deus é tamanho que não transgredirei a Sua ordem? Veja bem, não pecarei não porque estou com medo da punição [se fosse assim, ninguém pecaria], mas não pecarei porque amo ao Senhor de tal forma que o meu amor não me permitirá ceder ao pecado. Se o meu coração estiver cheio, repleto de Deus, não haverá lugar para pecar. Como digo sempre: onde há amor, não há pecado. Onde há pecado, não há amor.

A masturbação, especificamente, não é um pecado instantâneo. Ela não acontece por um impulso incontrolável, por um "repente", como se diz aqui em Minas. Ela é progressiva, um processo. Primeiro você se entrega ao deleite de olhar ou imaginar formas femininas, depois não se contenta apenas em imaginar, mas há a cobiça, o desejo de realizar algo com aquele corpo, por fim, como não é possível fazê-lo, você se rende ao alívio imediato, para não ficar mais pensando e sofrendo por não tê-lo, e por pensar e sofrer com o que pensa. Mesmo sabendo que é pecado, mesmo sabendo que desagrada a Deus, mesmo sabendo que será levado a pecar novamente, a sensação é por demais agradável; mesmo sendo escravizante, ainda assim, é algo incontrolável quando se peca a primeira, a segunda vez, quando não se refreia, peca-se por desordem. Pelo coração não estar acomodado, em conformidade com a santidade. Entra-se em um círculo vicioso... e, somente Deus para nos tirar dele.

Não vejo saída a não ser a oração, a mortificação da carne [o jejum é uma arma poderosa], afastando-se de tudo o que o remete à lascívia, à cobiça, ao prazer ilícito. Exteriormente somos "fisgados", mas o problema está no interior, no coração. Como o Senhor Jesus disse, é dele que procedem todos os males [Mt 15.17-18]. Porém, um coração cheio do amor por Deus será um coração vitorioso na luta contra o pecado.

Pedro diz: "Visto como o seu divino poder nos deu tudo o que diz respeito à vida e
piedade, pelo conhecimento daquele que nos chamou pela sua glória e virtude; pelas quais ele nos tem dado grandíssimas e preciosas promessas, para que por elas fiqueis participantes da natureza divina, havendo escapado da corrupção, que pela concupiscência há no mundo. E vós também, pondo nisto mesmo toda a diligência, acrescentai à vossa fé a virtude, e à virtude a ciência, e à ciência a temperança, e à temperança a paciência, e à paciência a piedade, e à piedade o amor fraternal, e ao amor fraternal a caridade. Pois aquele em quem não há estas coisas é cego, nada vendo ao longe, havendo-se esquecido da purificação dos seus antigos pecados. Portanto, irmãos, procurai fazer cada vez mais firme a vossa vocação e eleição; porque, fazendo isto, nunca jamais tropeçareis. Porque assim vos será amplamente concedida a entrada no reino eterno de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo" [2Pe 1.3-11].

Em outras palavras, o apóstolo está dizendo ao crente: você é um eleito de Deus, resgatado da condenação por Cristo, feito co-herdeiro em Cristo, participante da glória e da graça de Deus em Cristo, portanto, viva como um eleito, não como um ímpio!

Pedro está nos exortando a viver segundo o chamado que Deus nos deu. Somos eleitos, então vivamos com tal, e não como o pecador que antes éramos.

No seu caso, posso fazer muito pouco ou nada além de ouvi-lo, de exortá-lo, de orar por você. Está em suas mãos resistir ao pecado e levar uma vida santa diante de Deus.

Novamente, voltemos a Pedro: "Portanto, cingindo os lombos do vosso entendimento, sede sóbrios, e esperai inteiramente na graça que se vos ofereceu na revelação de Jesus Cristo; como filhos obedientes, não vos conformando com as concupiscências que antes havia em vossa ignorância; mas, como é santo aquele que vos chamou, sede vós também santos em toda a vossa maneira de viver; porquanto está escrito: Sede santos, porque eu sou santo" [1Pe 1.13-16].

Pedro reafirma aqui o que disse anteriormente: você é um eleito, viva como tal; não se entregue às práticas dos gentios e incrédulos, que antes fazia. Porque o chamado de Deus para o Seu povo é o chamado à santidade.

Paulo também diz: "E, se Cristo está em vós, o corpo, na verdade, está morto por causa do pecado, mas o espírito vive por causa da justiça... De maneira que, irmãos, somos devedores, não à carne para viver segundo a carne. Porque, se viverdes segundo a carne, morrereis; mas, se pelo Espírito mortificardes as obras do corpo, vivereis. Porque todos os que são guiados pelo Espírito de Deus esses são filhos de Deus... Quem nos separará do amor de Cristo? A tribulação, ou a angústia, ou a perseguição, ou a fome, ou a nudez, ou o perigo, ou a espada? Como está escrito: Por amor de ti somos entregues à morte todo o dia; somos reputados como ovelhas para o matadouro. Mas em todas estas coisas somos mais do que vencedores, por aquele que nos amou. Porque estou certo de que, nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir, nem a altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor" [Rm 8.6-39].

Viva no Espírito, no amor do Senhor, e você morrerá todo dia para a carne. Não é fácil, mas não há outro caminho. Arrependa-se, coloque-se nas mãos do Senhor integralmente, viva o Evangelho de Cristo, viva por meio dEle, para Ele, e, certamente, Deus o libertará desse pecado. Na verdade, você já foi libertado pelo sacrifício do Senhor na cruz, assuma então a sua condição de eleito, e viva como um crente, como um servo guiado pelo Senhor, buscando-o, sujeitando-se, humilhando-se, glorificando-o, através do poder do Espírito Santo e da Palavra; pois o único antídoto contra o pecado é a santidade. Desejar mais do que qualquer outra coisa ser como é o nosso Senhor: santo!
 
Ore, ajoelhe, clame a Deus, implore, se humilhe diante dEle, arrependa-se com o que de mais intenso e verdadeiro haja dentro de você, e, certamente, odiará o pecado e amará cada vez mais a Deus.

Continuarei orando por sua vida, para que Cristo o liberte, dando-lhe discernimento e sabedoria para enfrentar essas tentações. Como disse anteriormente, a tentação ainda não é o pecado, mas quando passamos por ela sem resistência, o pecado invariavelmente acontecerá. A tentação é a chance que se tem de não pecar, o último recurso antes do desfecho final: a queda!

Escreva quando quiser e precisar.

PS: Acho que seria bom você pensar, pelo menos por enquanto, em afastar-se das pregações. Continue a evangelizar, a falar de Jesus para as pessoas; a orar, ler as Escrituras, meditar nelas. Buscar literatura de qualidade que o ajude a combater o pecado. Mas não considero, biblicamente, qualquer possibilidade de você se manter em algum ministério, seja a pregação, o louvor, ou qualquer outro, enquanto estiver rendendo-se ao pecado. Não seria correto para com Deus nem a igreja. Você disse que se converteu este ano, portanto, muito pouco tempo para assumir certas funções no Corpo local. Como Paulo diz, o neófito [novo na fé] não deve assumir liderança, "para que, ensoberbecendo-se, não caia na condenação do diabo" [1Tm 3.6]. Talvez o seu problema esteja aí. Mas é algo que apenas você poderá responder, então, pergunte a si mesmo sinceramente: por que estou no ministério? O que me motiva a exercê-lo?
Quem sabe, Deus já não esteja dando a resposta?

25 fevereiro 2010

Cura Bíblica ou Placebo Psicológico?
















Por Jorge Fernandes Isah

Lendo o livro do Dr. Jay Adams, "Manual do Conselheiro Cristão"1, percebi que ele bate repetidamente na mesma tecla: de que à parte da Escritura é impossível qualquer mudança ou cura espiritual.

O homem poderá se debater e se bater com diversas metodologias, desde as pretensamente mais científicas até as não-científicas; porém, sem que se creia nas orientações da Bíblia, a mudança mais radical, o novo nascimento, é inatingível; visto essa condição somente ser possível pelo poder do Espírito Santo o qual nos predispõe, transformando a antiga natureza em uma nova natureza, para que sejamos capazes de seguir o Seu norteamento.

Desta forma o não-crente somente terá uma esperança viva e verdadeira se, pela operação divina, converter-se à fé no Evangelho de Cristo. De outra forma, andará em círculos, amenizando aqui e acolá seus problemas, que "volta e meia" retornarão, sem que haja uma solução. São placebos sem nenhuma eficácia, o mesmo que tomar comprimidos de açúcar (que podem matar ao invés de curar, se a pessoa for diabética, p.ex).

Outra posição do Dr. Adams é a da necessidade de confrontação com o cliente (a utilização do termo se dá pelo fato do autor não ver o aconselhado como paciente). Enquanto ele não souber claramente qual é o seu problema, e esse problema não for tratado através do arrependimento e do perdão (sobretudo o arrependimento diante de Deus para receber o Seu perdão); confrotado pela sua natureza caída e a de seus semelhantes (a impiedade humana) diante da graça divina, esse homem será um homem sem esperança.

Ao contrário, se tiver a mente de Cristo, e for inundado por ela, aprenderá a viver uma vida relativamente desprovida de raízes neste mundo, e isso será uma imensa alegria, pois viverá como se peregrino e estrangeiro fosse. Como definiu o autor: "Toda mudança prometida por Deus é possível. Toda qualidade requerida por Deus, da parte de Seus filhos remidos, pode ser atingida. Deus supriu cada recurso para tanto necessário... sua pátria está nos céus (FP 3.20), e, por isso, há esperança de alegre mudança no aconselhado pela graça de Deus"2.

A mudança na crença do que é o homem a partir de conceitos "mascarados" pelo próprio homem, como a sua bondade inerente, a sua animalidade inerente, a sua irresponsabilidade inerente, a relatividade das relações e da moral, tornam em infrutíferas, perniciosas e catastróficas a metodologia humana para se tratar os desvios e os problemas espirituais (inorgânicos). A abordagem não-cristã é inútil e apenas escravizará o "doente" numa espécie de redoma que o próprio método o direcionará e aprisionará.

Por exemplo, existe a abordagem do conhecimento do especialista (freudianismo) em que o aconselhamento somente deve acontecer por métodos e técnicas apropriadas (segundo eles). Nela os problemas são resultados dos eventos externos ocorridos na vida do cliente, o que retira do cliente qualquer responsabilidade, pois os fatores que o levaram ao problema decorrem das ações de outras pessoas. Interessante que esse método tende a "inocentar" o cliente e a culpabilizar quem vive ao seu redor. E, assim, o indivíduo vive num círculo vicioso onde a culpa dos seus problemas se deve à socialização deficiente, onde o cliente sempre será a vítima, e as outras pessoas com quem conviveu em seu passado ou mesmo no presente, são os criminosos. E isso determinou-lhe uma consciência rígida (superego), a qual se encontra em conflito com os seus desejos normais (id), levando-o às dificuldades, à sua não adaptabilidade, gerando os vários e duradouros conflitos da vida.

Portanto, o perito terá de desfazer aquilo que os outros fizeram, reverter esse quadro pela psicanálise, retrocedendo ao passado do cliente, fazendo-o reviver pessoas e situações desagradáveis, a fim de torná-las, durante as sessões, agradáveis, reestruturando o sistema de valores do aconselhado. Esse método é longo e está envolto em um emaranhado de especialização que torna o psicanalista em uma espécie de "super-homem" com todos os poderes sobre o cliente. Ele cria uma dependência e um vínculo que impedem o paciente até mesmo de decidir sobre si mesmo, pois muitos são internados por ordens desses mesmos peritos, que controlarão a sua vontade e desejos tornando-os em corpos sem almas.

Da mesma forma, ainda que o padrão seja diferente, o behaviorismo de Skinner, se posiciona como a escola de modificação comportamental baseada no empirísmo. Para eles, o homem é apenas um animal, e, por isso, produto do seu meio ambiente. Novamente, temos uma causação externa ao cliente. Ele não é culpado por seu comportamento nocivo, o qual é somente consequência do seu convívio social.

Para Skinner, falar ao menos em responsabilidade é uma insensatez. "A solução aventada por Skinner consiste em descobrir cientificamente as contingências relacionadas à conduta 'deficiente' (todos os julgamentos de valores fazem parte da mitologia), para então, com base nos informes obtidos, reagrupar as contingências ambientais, a fim de reprogramar as reações do paciente. Isso é feito mediante o uso de recompensas e controles que provoquem a aversão"3. Em outras palavras, seria o mesmo que domesticar o homem como se domestica um cão selvagem, treinando-o para fazer exatamente o que o "dono" quer. Porém, ao meu ver, os animais foram criados por Deus para servirem ao homem; e, especificamente neste caso, o que vemos é o homem no mesmo nível dos animais, servindo a um grupo elitista que se considera como um semi-deus. Desta forma, o método utilizado não é o da confrontação bíblica, mas o da manipulação, ao qual muitos aconselhadores cristãos se submeteram (p.ex., Dobson).

Para ele, o homem é tão destituído de valor quanto qualquer animal; e assim, podem fazer do homem qualquer tipo humano desejado, começando pela manipulação genética e então estabelecendo as contingências ambientais desejadas. O objetivo é o de criar rebanhos, como gado. Mas, mesmo entre peritos tão obstinados, não há unidade, e determinar o que quer que fosse seria impossível, visto não haver valores fixos, nem padrões, pois tudo é relativo, está a ser descoberto ou mesmo pode não ser o desejado.

Da mesma forma outras abordagens seguem o mesmo padrão de controlar, dominar e aprisionar os clientes aos seus métodos. Não há desejo real de libertá-los.

Sem o uso das Escrituras, sem a conversão, sem o arrependimento, sem que o Espírito Santo atue no homem, sem a santificação, sem a confrontação bíblica, sem que a criança seja ensinada nos caminhos do Senhor, todos esses métodos se tornam em uma louca prisão, onde o cliente não obtém cura, e necessita constantemente estar "conectado" ao especialista e sua metodologia, sem que muitas vezes se saiba exatamente o que ele tem, nem como "curá-lo".

Uma boa dica de série televisiva é Monk, cujo personagem sofre de transtorno compulsivo, o chamado "toc", e se mete em hilárias situações (ainda que a série faça da psicanalise uma "válvula de escape"; de onde o personagem não consegue escapar, e se mantém completamente dependente, preso ao método).
Há outras como Criminal Mind e Lie To Me (nitidamente adeptas do método de Skinner) que abordam o homem a partir do seu comportamento. Em última análise, eles sempre poderão solucionar os casos criminosos baseados na personalidade, no seu passado, e em suas relações. Acontece que sendo o próprio homem quem investigará esses elementos, assegurar que ele os compreenderá e solucionará é impossível. Como séries policiais, elas não se propõem a garantir a cura do cliente (nem estão preocupadas com esse aspecto), mas apenas descobri-lo, revelando-lhe a identidade através dos crimes. Mesmo que o objetivo seja minimamente alcançável, tenho dúvidas da sua eficácia.

Outra interessante série no campo psicológico voltada para os animais é o Encantador de Cães, ainda que esteja fundida a uma crença holística (espiritualista panteísta), mas que também analiza os comportamentos dos humanos, no caso, os donos, a partir do mesmo princípio em que os animais são examinados.

Voltando ao Dr. Adams, ele se posiciona frontalmente contra os métodos anticristãos, os quais, perpassados por técnicas esotéricas, obscuras, não revelam a verdade do paciente, nem o colocam em contato com a realidade, sua e do mundo em que vive. Pelo contrário, eles o transportam para um mundo paralelo, onde não há solução, apenas contemporização e uma cura intangível. 

Com o alicerce sólido [a Escritura] o crente poderá erguer uma metodologia cristã coerente com o alicerce; enquanto o incrédulo sempre distorcerá esses aspectos com seus pecados e sua posição não-cristã de vida. Porém, o conselheiro cristão poderá trazer à luz a verdade obscurecidamente refletida pelo incrédulo a partir dos princípios e metodologia bíblicos. Ele jamais deverá buscar e incorporar a esses princípios e metodologia elementos alheios e antibíblicos. Técnicas que aparentemente são eficazes somente o distanciarão ainda mais da eficiência escriturística.

Infelizmente o eclético e o cristão "moderno" (diga-se pragmático e liberal) partem da premissa de que não existe base bíblica que sirva de alicerce, e, invariavelmente, pegarão tudo de que dispoem à mão para tentar construir algo que funcione, mas que ao final, será apenas um trabalho sem efeitos reais e verdadeiros.

Na ânsia de se obter resultados a qualquer custo, esquece-se de que há somente um caminho que o assegurará: a sabedoria e o conhecimento bíblico com o qual o homem é transformado à imagem de Cristo. Em sua rebeldia, o que o homem faz é afastar-se de Deus, e buscar em si mesmo o deus (in)capaz de curá-lo.

O crente não pode agir como alguém que ao final não tem nada, quando Deus lhe deu tudo, tanto o alicerce como os materiais a fim de construir um sistema bíblico.

O pressuposto principal é o da inspiração divina da Escritura, a qual tem o poder de:

1) Ensinar, estabelecendo normas de fé e de vida.

2) Repreender, mostrando de modo convincente aos crentes que errarem, como e de que forma estão vivendo no erro.

3) Corrigir, endireitar novamente a partir das Escrituras a fim de que o crente se firme outra vez.

4) Disciplinar na justiça, pois as Escrituras permanecem operando em nós, estruturando-nos na disciplina diária, conduzindo-nos à piedade.

Esses quatro usos das Escrituras delimitam quatro atividades básicas do aconselhamento bíblico:

1) Atividade aquilatadora, o crente, alicerçado na Bíblia, não encontra dificuldade alguma em fazer juízo sobre as questões. Por exemplo, a Bíblia diz que o homossexualismo é pecado. Para o crente, a questão está resolvida.

2)Atividade convencedora, na qual a Palavra revelará o padrão divino de santidade a fim de que haja arrependimento do aconselhado, e não uma busca infrutífera por um alívio. Condutas pecaminosas sempre trarão consequências danosas às vidas das pessoas; logo, o conselheiro, ao invés de minimizar ou contemporizar o pecado, deve mostrá-lo, levando o cliente à convicção de sua rebeldia. Somente a ação do Espírito Santo mediante a Palavra poderá ajudar o aconselhado a buscar o "reino de Deus e a Sua justiça", através da qual ele experimentará o verdadeiro alívio e a verdadeira felicidade.

3)Atividade Transformadora - As escrituras, eminentemente práticas, levarão o crente não somente a reconhecer o seu pecado, mas a como ser restaurado, recuperado do pecado. A Bíblia deve ser usada de modo prático, da forma como Deus tencionou que fosse empregada.

4)Atividade Extruturadora - O discipulado através da disciplina no ensino regular e ordenado da Palavra, pela Palavra, tornará o crente habilitado para toda a boa obra; porque não há nada que o homem de Deus não esteja adequadamente preparado pelas Escrituras.

Portanto, a metodologia a ser aplicada no aconselhamento não pode ser o ajuntamento e colagem de toda espécie de coisas à Bíblia, e sim, usarmos os recursos do conhecimento divino no aconselhamento, através do estudo árduo e contínuo das Escrituras.

É preciso conhecer os problemas humanos, e descobrir as respostas dadas por Deus. E o único método é através do estudo e ensino das Escrituras.

Para completar, o aconselhamento cristão é uma prerrogativa de qualquer crente, mas, sobretudo, ele tem de vir sob a autoridade investida por Cristo e a Igreja; portanto, segundo Adams, é função primordial dos pastores, os quais são preparados escrituristicamente para tal, e outorgados por Deus e a Igreja para cumprirem essa missão, como vocação especial. 

Infelizmente, do último século para cá, o aconselhamento tem sido adotado secularmente por profissionais da área médica; e os médicos devem se ocupar exclusivamente com os problemas orgânicos, ou seja, com a saúde física do homem. Assim, "não há lugar, no esquema bíblico, para o psiquiatra como médico de especialidade separada. Essa casta, que a si mesmo se nomeou, veio à existência ante a expansão do guarda-chuva médico a fim de incluir as doenças inorgânicas (qualquer que seja o seu sentido)"4.

Ao investirem-se de prerrogativas as quais não lhe cabem, como as do psicólogo e psiquíatra, eles deixam de cumprir verdadeiramente a sua missão para tornarem-se em ministros seculares, metade médico (uma parte insignificante) e metade sacerdote secular (uma parte avantajada), corrompendo todo o objetivo do aconselhamento e, por conseguinte, da medicina. Até porque muitos vêem o aconselhamento como uma forma de não-aconselhamento, relativista, em que o aconselhado é estimulado a falar ao invés de ouvir, onde não se busca o resultado objetivo (no caso do crente, a santificar-se e amoldar a sua imagem à de Cristo).

A função do conselheiro é a de, com sabedoria e ensinamento bíblico, orientar o aconselhado a abandonar as práticas que lhe são nocivas, notadamente as práticas anti-cristãs, e pecaminosas.

Nota: 1 - "Manual do Conselheiro Cristão" - Dr. Jay Adams - Ed. Fiel 
2 - Idem - pg. 40
3 - Idem - pg. 85
4 - Idem - pg. 22

18 fevereiro 2010

deus, não é Deus











Por Jorge Fernandes Isah

Deus é Deus. Não importa o que eu pense, nem se penso. Ele continua Deus. Não importa o que eu faça, nem o que não faça. Ele é Deus. Não importa o que creia, nem o que não creia. Ele permanece, e sempre será Deus. É uma afirmação simplista? Sim. Mas nela está contida uma verdade absoluta: Deus não é outra coisa a não ser Deus. Ainda que eu me aventure a rotulá-lo ou redefini-lo, nada o fará deixar de ser o que é: “eu sou o que sou” [Ex 3.14].

Nem a fé, nem o ceticismo. Nem as boas obras, nem as más. Nem a morte, nem a vida. Nem o bem, nem o mal. Ou qualquer outra coisa que eu seja ou produza. Ainda que o universo não existisse, Deus é Deus. Imutável, Todo-Poderoso, Soberano, Perfeito, Justo e Santo.

Então se dirá: como sabe essas coisas? Como saber que Deus é Deus? Não dependerá daquilo que apreendo dEle, de como o vejo e me relaciono? Deus não depende de mim?

A verdade é que todas as criaturas têm um relacionamento com Deus. Seja a matéria ou a anti-matéria, seja o físico ou o espiritual, seja forma ou amorfa, viva ou morta, certa ou errada, possível ou impossível, verdadeira ou falsa. Tudo se relaciona com Deus, pois Ele é o criador de todas as coisas, e nada pode vir à existência sem que Ele determine que exista, nem mesmo os pensamentos, nem mesmo o que não pensamos; “porque todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez” [Jo 1.3].

Ele não depende em nada de nós.

Até mesmo o que não existe se relaciona com Ele, pois por sua vontade não o trouxe a existência. Nada pode autoexistir ou surgir sem que Ele queira, pois seu plano é certo e infalível. Como está escrito: “Sabei que o Senhor é Deus; foi ele que nos fez, e não nós a nós mesmos” [Sl 100.3].

[Apenas como uma hipótese ou uma hipérbole, o não-relacionamento é uma forma de relacionamento].

Os réprobos relacionam-se com Deus, rejeitando-o, desprezando-o, blasfemando, opondo-se, pecando e cultivando a impiedade como afronta à Sua santidade. Não importa se consciente ou inconsciente, se voluntário ou involuntário, tencionando fazê-lo ou não, se por dolo ou distração, se livre ou obrigado, o fato é que todo pecado, e por conseguinte toda criatura, tem um relacionamento com o Criador: O Senhor olhou desde os céus para os filhos dos homens, para ver se havia algum que tivesse entendimento e buscasse a Deus. Desviaram-se todos e juntamente se fizeram imundos: não há quem faça o bem, não há sequer um” [Sl 14.3]. E isto vale também para satanás e seus anjos.

Ao final, todos têm um relacionamento com Deus, independente de se querer ou não; independe da vontade, pois tudo no universo está sujeito a Ele, contido e limitado pelo Seu poder: pois o Seu “reino é um reino eterno; o teu domínio dura em todas as gerações” [Sl 145.19]. Foi o que Paulo também disse: “Porque nele vivemos, e nos movemos, e existimos; como também alguns dos vossos poetas disseram: Pois somos também sua geração” [At 17.28].

A dependência seja em qual nível for revelará o tratamento que Deus dispensa e a forma como nos portamos diante dEle. Nada acontece por acaso, nem cairá no esquecimento, porque o “Senhor guarda a todos os que o amam; mas todos os ímpios serão destruídos” [Sl 145.20]; ainda que faça o sol se levantar sobre maus e bons, e a chuva descer sobre justos e injustos [Mt 5.45]. O que me leva a concluir que o Senhor tem um relacionamento pessoal com cada uma de Suas criaturas, tanto as eleitas como as réprobas, pois até mesmo estas cumprem o Seu propósito eterno, segundo os Seus desígnios, de criar “até o ímpio para o dia mal” [Pv 16.4].

Contudo o relacionamento ou dependência de Deus não significa conhecimento, saber quem Ele verdadeiramente é. Apenas aqueles que são predestinados e chamados para serem conforme a imagem de seu Filho, para que “ele seja o primogênito entre muitos irmãos” [Rm 28.29], podem conhecê-lo. Não digo reconhecê-lo por algumas particularidades, pelos indícios que a criação nos revela da Sua majestade, pela impossibilidade de haver o acaso e a aleatoriedade na vida, mas pelo que é, e nos revelou de Si mesmo.

Em linhas gerais, Deus se revelará apenas a quem quiser, pois não é um exercício do quanto podemos conhecê-lo, mas do quanto quer que saibamos. Ainda que não seja a essência do versículo, ele pode muito bem ser aplicado nesta situação: “assim, pois, isto não depende do que quer, nem do que corre, mas de Deus que se compadece” [Rm 9.16]. Ele é misericordioso até mesmo em Se revelar, e isso é simplesmente fantástico: a forma como o Todo-Poderoso quis se mostrar. Porém se não for por Ele, não o será. Se não for pela regeneração da mente natural, o homem não o conhecerá. Se não for através da revelação especial, o que se apreende será apenas uma concepção incompleta, não elucidativa, errônea, ao ponto em que não passará de uma mera criação humana, transformando em lenda ou ficção o que é real e verdadeiro.

Estará evidenciada a incapacidade do homem, por si só, de conhecê-lo. E ela não poderá ser corrigida se não for pelas mãos de Deus. Se Ele não transformar o barro dando-lhe vida, o novo-nascimento, nada feito. “Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus... Não te maravilhes de te ter dito: Necessário vos é nascer de novo” [Jo 3.3, 7].

Pois os regenerados, as ovelhas, serão apartadas dos bodes; aquelas à direita, e estes à esquerda. Então o Senhor dirá aos que estiverem à sua direita: "Vinde, benditos de meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo" [Mt 25.34]. E dirá também aos que estiverem à sua esquerda: "Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos" [Mt 25.41].

As ovelhas não são bodes, nem os bodes, ovelhas. E Cristo não os confunde; antes criou-os separados, com propósitos distintos, com o fim de ser glorificado; e naquele dia, todos verão a Sua obra concluida. E ela passa necessariamente pela regeneração dos pecadores, aqueles que receberam a Sua misericórdia e não nasceram do sangue, “nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus” [Jo 1.13], o qual ordenou que assim fosse, antes da fundação dos séculos, para a nossa glória também. Porque o que o olho não viu, e o ouvido não ouviu, e não subiu ao coração do homem, é o que Ele preparou e reservou aos que o amam. Revelando-as pelo seu Espírito; “porque ninguém sabe as coisas de Deus, senão o Espírito de Deus” [Rm 2.11]

Tais coisas são reveladas através da Bíblia Sagrada, a própria voz do Senhor falando aos nossos ouvidos. Mostrando-nos o que Ele é, o que somos, as promessas que nos são reservadas, na esperança de que se cumprirão infalivelmente, porque assim nos diz, e assim será. Como escrevi certa vez, não há silêncio nas Escrituras. Jamais Deus se calará àqueles que tiveram seus ouvidos abertos, a mente aberta, o coração de pedra transformado em carne; pois somente Ele é capaz de dar vida ao defunto, tirando-o das trevas e levando-o para a luz, Jesus Cristo, o qual "eu vi, e tenho testificado que este é o Filho de Deus"[Jo 1.34].

Porque Deus estará sempre a se revelar ao Seu povo, para que o conhecimento seja entre Pai e filhos, através do Unigênito, Cristo, em cujas mãos estão todas as coisas, e nas quais fomos entregues, porque ouvimos a Sua voz e Ele nos conhece, e nos deu a Sua vida para que jamais pereçamos, como ovelhas desgarradas levadas ao aprisco pelo Pastor [Jo 10.27-28].

Como está escrito: “Eu sou o bom Pastor, e conheço as minhas ovelhas, e das minhas sou conhecido” [Jo 10.14].

Sem Cristo e o Evangelho, o conhecimento de Deus é impossível! E se tem apenas o deus que se quer, e no qual estupidamente se acredita.

E esse deus, não é Deus!