15 novembro 2013

Estudo da C.F.B. 1689 - Aula 55 - Dons apostólicos: Há apóstolos, hoje?


Por Jorge Fernandes Isah

Desde o início do século passado, com as manifestações carismáticas surgidas na Rua Azuza, em Los Angeles, em 1906, pelas mãos do ministro negro, William Joseph Seymour, que o Cristianismo, em nome de um "reavivamento", tem ensaiado uma série de experiências que remontam aos primórdios da Igreja Primitiva, mais especificamente o período apostólico, no séc. I. Mas, esses dons teriam realmente voltado? Ou eles estariam circunscritos a um momento histórico específico, e o que temos, hoje em dia, nada tem a ver com o Espírito Santo, pois houve um hiato de quase dois mil anos entre aquele e este período? Seriam as formas atuais as mesmas das realizadas antigamente? E estariam em conformidade com os relatos bíblicos e aplicados convenientemente como relatam os registros sagrados?

Primeiramente, devemos definir o que vem a ser dons apostólicos, mas antes disso, quem são os apóstolos e qual era a sua missão. A palavra apóstolo significa enviado ou mensageiro, aquele que anuncia algo ou alguém, e, no Novo Testamento, a missão deles era a de anunciar Cristo e o seu Evangelho; e, para isso, teriam de ser comissionados pelo próprio Senhor, chamados por ele para exercerem essa missão, não sendo possível que alguém se autointitule ou denomine-se a si mesmo com tal, sem sê-lo. Não há, na Escritura, um só apóstolo que não tenha recebido o seu mandato diretamente do Senhor, como nos revela o evangelista: "E, quando já era dia, chamou a si os seus discípulos, e escolheu doze deles, a quem também deu o nome de apóstolos" [Lc 6.13], e que não tenha convivido com ele e testemunhado a sua ressurreição ]At 1.21-22]. 

Alguém pode dizer que os apóstolos tinham o poder de nomear outros apóstolos e que esses poderiam nomear outros e mais outros, continuamente, numa espécie de apostolado sucessório, aos moldes do que a Igreja Católica reivindica para o papado. Contudo, não se tem, na Bíblia, qualquer referência a essa ordem sucessória, e os que hoje tentam reclamar para si mesmos algum apostolado nada mais fazem do que repetir o erro romanista, ao qual dizem oporem-se mas acabam por defendê-lo e inseri-lo em suas práticas não-bíblicas. 

Alguém ainda pode insistir que Matias, o apóstolo nomeado a substituir Judas Iscariotes, não foi diretamente nomeado por Cristo. Mas, espere um momento, para quem propõe a ação do Espírito Santo em eventos no mínimo discutíveis como os levantados pelo movimento carismático atual, pois estão muito aquém ou além do texto bíblico, por que não reconhecer a ação do Espírito de Deus na escolha do novo apóstolo? Houve oração e clamor para que ele, que conhece todos os corações, mostrasse qual, dentre José e Matias, seria o escolhido, "para que tome parte neste ministério e apostolado... E, lançando-lhes sorte, caiu a sorte sobre Matias" [At 1.23-26]. Alegar que coisas estranhas à Palavra são supostamente manifestações do Consolador [o qual é o Espírito de Cristo] e de que ele não interviria em algo tão vital para a expansão do Evangelho, parece-me um contra-senso. 

Ainda alguém pode alertar para o fato de Paulo não ter convivido com Jesus, e ainda assim, foi feito apóstolo. Realmente, ele não foi testemunha direta do ministério terreno do Senhor [ainda que tenha sido indiretamente], mas, de uma forma especial e exclusiva, foi chamado pelo próprio Cristo, sendo testemunha ocular da sua ressurreição. É o que ele nos diz: "Paulo, apóstolo (não da parte dos homens, nem por homem algum, mas por Jesus Cristo, e por Deus Pai, que o ressuscitou dentre os mortos)" [Gl 1.1], e, ainda, ao falar das aparições de Cristo: "E por derradeiro de todos me apareceu também a mim, como a um abortivo. Porque eu sou o menor dos apóstolos, que não sou digno de ser chamado apóstolo, pois que persegui a igreja de Deus" [1Co 15.8-9], e, mais uma vez: " Porque aquele que operou eficazmente em Pedro para o apostolado da circuncisão, esse operou também em mim com eficácia para com os gentios" [Gl 2.8]. Ora, temos que Paulo se colocou em posição de igualdade no ministério apostólico de Pedro, apenas com a distinção quanto aos seus ouvintes, o alvo da sua pregação. 

Logo, não se pode falar em apóstolos modernos, pois nenhum dos que assim se intitulam preenchem as características necessárias: o chamado direto de Jesus, sobretudo, como testemunhas irrefutáveis da sua ressurreição. 

O Segundo ponto a ser analisado é sobre a sua missão. Lembre-se de que à época, os apóstolos estavam num período de transição entre a antiga e a nova aliança, e de que a igreja estava sendo formada. Eles, como emissários de Cristo, confirmariam indubitavelmente a verdade de que muitos sabiam, ainda que vagamente, acerca de Jesus, sua missão, morte e ressurreição, como um fato indiscutível e impreterível, levando-a tanto a judeus como a gentios. Toda a obra apostólica se baseava nesse fundamento, de que Cristo não somente era o Messias mas o Filho de Deus. O aspecto final dessa missão foi que os apóstolos, inspirados pelo Espírito Santo, escreveram e legaram à igreja, em todos os tempos, a santa e bendita palavra de Deus. Nem uma só linha do Novo Testamento foi redigida por alguém que não fosse apóstolo ou estivesse diretamente ligado a um deles, no caso, eram seus discípulos que, orientados pelas fontes primárias e sob a supervisão do Espírito, relataram os fatos relacionados à pessoa de Jesus e seu ministério. 

Com isso, chega-se facilmente à conclusão de que não há mais revelações divinamente inspiradas a serem transmitidas à Igreja, visto que o Cânon encontra-se concluído, não necessitando a nenhum crente nenhuma outra orientação que não esteja contida na Escritura Sagrada; o que nos leva a reconhecer que o ministério apostólico transcorreu em um determinado momento da história, e de que a missão daqueles homens chegou definitivamente ao fim, sem que houvesse sucessores ou novos mensageiros. Até, porque, a Igreja está edificada "sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, de que Jesus Cristo é a principal pedra de esquina; no qual todo o edifício, bem ajustado, cresce para templo santo no Senhor; no qual também vós juntamente sois edificados para morada de Deus no Espírito" [Ef 2.20-22], e, se uma casa não pode ter mais do que uma fundação, onde nelas são construídas paredes, colunas, vigas, telhado, piso, etc, como seria possível outro fundamento além daquele onde são dispostos o princípio da fé, de que Cristo é a pedra de esquina? Além de desnecessário é absurdo, e representaria a "invenção" de outra fé, de um outro "cristianismo", o que muitos têm se especializado e empenhado em produzir. 

Outra conclusão facilmente alcançável é: a igreja, quando se afasta desse entendimento, ainda que seja minimamente, se torna alvo acessível para a investida dos falsos-mestres e profetas e seus absurdos doutrinários. Invariavelmente acabam por apostatar a fé, negando a verdade e penetrando a mentira, instalando-se nela como uma genuína aberração religiosa, agindo ímpia, incrédula e dolosamente na admissão e difusão de ideias contrárias e excludentes à fé uma vez dada aos santos. Se no AT havia o ministério em que os profetas de Deus expunham publicamente a falácia e malignidade dos falsos-profetas, hoje, cabe-nos, como Igreja, denunciá-los e expô-los como charlatões e falseadores da verdade. O princípio para isso é um só, orientarmo-nos e deixar-nos guiar pela Escritura, através da qual o Espírito Santo nos falará e conduzirá em toda a verdade. 

[Continua na próxima aula]

Nota: 1- Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico
2 - A foto desta postagem é um "Autorretrato como o apóstolo Paulo" [Rembrandt, 1661].

2 comentários:

  1. O melhor argumento contra os "apóstolos" modernos é a questão dos fundamentos.
    Não há como se por novos fundamentos, logo um ministério que existiu num tempo histórico (quando os fundamentos eram colocados) e não tem como surgirem hoje.

    Hoje somos "paredes" somente.

    Sobre os dons fico curioso, não os dons apostólicos mas os dons de uma forma geral para igreja Antecipo que aceito os dons para os dias de hoje. Não quando apresentados de forma novas revelações (não existem tais coisas), mas sim quando apresentados como forma de edificação e consolo da igreja.

    Se pensas diferente, vai ser difícil enfrentar meus argumentos... "Qui medu..." risos...

    ResponderExcluir
  2. Grande Natan!

    Estava com saudades de nossas "querelas"... [rsrs].

    Não sei quanto aos seus argumentos, se enfrentáveis ou não... O fato é que há dons na igreja atualmente, e que são distribuídos segundo a vontade do Espírito, e há dons que nitidamente tinham como foco serem "sinais" para os incrédulos, testificando que a palavra proferida pelos apóstolos era verdadeiramente a palavra do próprio Deus.

    Por isso devemos distinguir o que são dons apostólicos [exclusivos de um período ou era na história da Igreja] dos dons presente nos nossos dias. Como esta postagem é uma introdução, a qual se complementará na próxima semana, aguardo suas objeções para vermos até onde devo correr .. [rsrs].

    É um assunto polêmico, mas, no decorrer dos estudos, pude constatar que a Bíblia nos guia corretamente no entendimento acertado do que são os dons apostólicos e o porquê deles se restringirem a um momento histórico.

    Um grande abraço!

    Cristo o abençoe!

    ResponderExcluir