Por Jorge Fernandes
Não desenvolverei uma exposição sobre liberalismo x fundamentalismo. Há artigos e livros que praticamente esgotam a questão, e indicarei as seguintes fontes:
1) Cristianismo e Liberalismo, J. Gresham Machen; cujos comentários estão em http://kiestoulendo.blogspot.com/2008/11/cristianismo-e-liberalismo.html
2) Com Vergonha do Evangelho, John MacArthur Jr; cujos comentários estão em http://kiestoulendo.blogspot.com/2008/08/com-vergonha-do-evangelho.html
3) A Guerra Pela Verdade, John MacArthur Jr.; cujos comentários estão em http://kiestoulendo.blogspot.com/2008/09/guerra-pela-verdade.html
4) Os Fundamentos – R. A. Torrey (editor); cujo comentário está em http://kiestoulendo.blogspot.com/2008/02/os-fundamentos.html
5) Áudios do Pr. Augustus Nicodemus, disponíveis no site Monergismo em
http://www.monergismo.com/textos/sermoes_audio/augustus_sermao_origem_fundamentalismo_liberalismo.htm http://www.monergismo.com/textos/sermoes_audio/augustus_sermao_avaliacao_fundamentalismo.htm
Dito isto, quero ater-me a uma questão similar às duas vertentes, ainda que distintas na forma, porém não na essência.
O liberalismo prima pela descrença no Deus bíblico e na revelação divina das Escrituras (a descrença pode ser em maior ou menor grau, mas sempre será descrença), não encarando-os de forma literal, mas compreendendo-os à luz (ou trevas) da cultura, dos costumes e do pensamento humano.
Para o liberal, a Bíblia não é a verdade absoluta nem para a atualidade nem para os povos à época em que foi escrita; devendo ser estudada dentro do contexto cultural daquele período histórico, a fim de que a sua mensagem seja adequada e válida. Desta forma, temos de adaptá-la aos nossos dias, ao contexto atual, para que tenha relevância na modernidade.
Para o liberal, afirmações sobre Deus e o homem reveladas nas Escrituras somente serão entendidas como verdades se suscetíveis ao crivo racional, aprovadas pela experiência e comprovadas pelo empirismo.
A finalidade é alcançar a descrença total no Deus bíblico, e na revelação bíblica. Os milagres, o nascimento virginal de Cristo, a Queda e o pecado da humanidade em Adão, a expiação vicária do Senhor Jesus, a Sua ressurreição, a condenação eterna e o inferno, tomam nova forma se expostos pela mente liberal, o que se pode chamar de "mentiras absolutas". Por conseguinte, se a revelação de Deus não é a verdade absoluta, o próprio Deus também não o é. E o que se vê é um cristianismo amorfo e adulterado, criado à imagem e semelhança da mente pecaminosa do homem.
Enfim, o ponto central é: combater a idéia do pecado, e de que o homem não tem de afastar-se dele. Assim, o liberal poderá conviver tranquilamente com suas transgressões sem culpa, sem arrependimento, sem a idéia da condenação, porque o Deus justo, reto e santo não se enquadra no protótipo do deus liberal. Tudo muito bem aprovado e comprovado pelas ciências humanistas, pela alma corrompida do homem rebelde.
Então, no “cristianismo liberal” (sic) não há a autoridade de Deus nem das Escrituras, mas do homem; um produto típico da mente em seu estado natural de deterioração.
Por outro lado, o fundamentalismo assume várias formas, algumas nem tão fundamentalistas, outras extremamente legalistas, onde há uma corrupção e descrença iguais às do liberal. Explico: tanto no liberalismo como no fundamentalismo legalista o importante é o homem, não Deus. Ou seja, qualquer coisa pode ser chamada de cristianismo, mesmo que Cristo não seja a sua autoridade, e não haja pontos inegociáveis, a não ser a salvação do homem pelo próprio homem, e o caráter condescendente e indulgente em seus desvios.
O fundamentalismo clássico ergueu-se sobre cinco princípios bíblicos, em oposição ao ceticismo liberal:
1 - Inerrância das Escrituras: inspiração verbal-plenária da Escritura; 2 - Nascimento Virginal de Cristo: Jesus foi gerado pelo Espírito Santo; 3 - Expiação Vicária de Cristo: Cristo morreu pelos [em lugar de os] pecadores; 4 - Ressurreição Corpórea e Segunda Vinda de Cristo: Cristo está vivo e voltará; 5 - Historicidade dos Milagres: todos os milagres relatados na Bíblia são efetivamente fatos históricos.
O cristão bíblico é e sempre será um fundamentalista clássico ou histórico, ainda que não assuma o termo, dado à sua conotação pejorativa “plantada” pelos liberais, o qual muitos querem evitar.
Porém, há um tipo de fundamentalismo que prima pelo legalismo ou farisaísmo. Podem ser chamados de xiitas, radicais, ultra ou supra fundamentais. Eles não se misturam, no sentido de aversão a qualquer cristão que não se enquadre aos seus padrões religiosos. Note-se que não estou a falar dos padrões bíblicos, mas dos padrões religiosos que eles defendem. Esse tipo de fundamentalismo é uma perversão do cristianismo tal qual o liberalismo. Eles se consideram a “nata” dos cristãos, os verdadeiros e únicos cristãos e, portanto, são os “comissionados” por Deus para o patrulhamento teológico. Algo como os auditores ou fiscais encarregados de expurgar e banir qualquer irmão ou igreja que não se adequa às suas diretrizes (com exceção das mortes, se parecem muito com os inquisidores romanistas). Acabam por investir-se como promotores e juízes, absolvendo ou condenando ao céu e ao inferno segundo a sua conveniência doutrinária. É um postulado com o qual Deus não nos revestiu, mas que teimam em assumir. Então, dirigem sua artilharia contra quem discordar de apenas um dos seus dogmas; e a salvação já não depende da graça de Deus nem do sacrifício expiatório de Cristo, mas do seguir suas regras, parâmetros ou norma reguladora, ou seja, o farisaísmo.
Os liberais contemporizam os pecados alheios a fim de se verem absolvidos em seus próprios pecados. Os fundamentalistas radicais esquecem-se dos seus pecados, e de que foram pagos por Cristo na cruz do Calvário (caso sejam eleitos), e ficam, hipocritamente, à espreita do pecado alheio. Abandonam a si mesmos em prol de uma sentença nula; e esquecem-se de que, cada um de nós está nas mãos do Senhor supremo de todo o universo, e de que o pecado do homicídio é tanto pecado como a mentira, a soberba ou a farsa.
Se um assassino como Stalin, Hitler ou Fidel fosse regenerado e restaurado pelo sangue do Senhor Jesus Cristo, ainda que carregando a culpa por milhões de mortes, estaria salvo e viveria por toda a eternidade diante do trono de Deus.
Em contrapartida, se um ermitão ou monge que não praticou nenhum ato amoral ou pecaminoso contra o seu próximo morrer rejeitando a Cristo, estará irremediavelmente condenado ao fogo do inferno. Portanto, não nos cabe julgar os homens quanto à salvação ou perdição, visto que esse julgamento cabe única e exclusivamente a Deus, o eterno e supremo Juiz (o contrário é fazer-se de Deus, e pretender tirar-lhE a glória que somente a Ele pertence).
Cabe-nos tão somente julgar os atos e atitudes humanas, se elas estão em conformidade com a Palavra de Deus ou não, nada mais do que isso, para não incorrermos em pecado.
Tanto os liberais como os fundamentalistas radicais partem da mesma premissa: a negação de Deus; e acabam por ser filhos do mesmo pai: o diabo. Seus esforços são humanos, são seus próprios salvadores, e brincam de deus, cada um a seu modo.
Infelizmente, se não forem ovelhas do Bom Pastor, será o mesmo que brincar com fogo, e se queimarão... literalmente.
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