27 abril 2011

Cristo: a negação do pecado


OU A IMPOSSIBILIDADE DE PECAR


Por Jorge Fernandes Isah*

Retornarei a um tema do qual me afastei por algum tempo, que causou alguma polêmica por aqui e exortações públicas de alguns irmãos para que eu voltasse à verdade. As postagens as quais me refiro são, entre outras:

A questão é que no conjunto do meu pensamento, sempre afirmei ser Cristo 100% Deus e 100% homem, em acordo com o que a Bíblia define claramente e que a ortodoxia ou a tradição da Igreja confirmou por séculos. Não tenho dúvida alguma de que a doutrina da divindade e humanidade de Cristo é bíblica e verdadeira. Portanto, não há o que se discutir quanto ao fato de que eu, eventualmente, esteja comprometendo esse princípio bíblico basilar da fé cristã, pois não estou, visto crer plenamente nele.

A Escritura está recheada de referências tanto à humanidade como à divindade de Cristo, de tal forma que não há como não reconhecê-la, a menos que se seja  movido pelo sentimento de querer destruir a verdade e corromper a revelação especial de Deus para os homens. Apenas mentes acostumadas à mentira e formadas nela podem conceber que o Senhor não seja homem e Deus ao mesmo tempo, de que ele não possua as duas naturezas. Não entrarei nos pormenores de como se deu a união hipostática do Senhor[1], visto não ser esse o objetivo deste texto. Se Deus quiser, no futuro, poderei abordar o tema.

Nos artigos citados, a questão que aventei e que gerou algum mal-estar foi o fato de fazer duas declarações e distinções não tanto ortodoxas [2]:

1) De que a natureza humana do Senhor Jesus era eterna [a essência; a mesma que nos foi dada por Deus e nos tornou à sua imagem e semelhança];
2) De que ele era diferente do homem, ou seja, não completamente igual ao homem por não possuir o pecado nem a possibilidade de pecar.

Em relação ao ponto 1, talvez eu faça uma nova abordagem mais à frente; talvez, não sei. Focarei agora o ponto 2, a nítida distinção que há entre Cristo e nós por causa do pecado que ele não tem e nós temos. Como sempre, farei a pergunta inicial: Não seria o pecado um diferencial fundamental a nos distinguir de Cristo?

Primeiro, a definição de pecado, o qual "é tudo o que é contrário ao caráter de Deus. Como a glória de Deus é a revelação do seu caráter, o pecado é uma insuficiência do homem em relação à glória ou ao caráter de Deus (Rm 3.23)" [3].

Considero uma ótima definição pois ela estabelece que o pecado é algo completamente exterior a Deus, e cuja natureza não se opõe meramente a ele, mas anula-o completamente. O pecado poderia ser entendido como uma reação radical à Deus, à santidade, autoridade, essência e natureza, bondade e perfeição, justiça e graça, numa tentativa pífia de tomar o seu lugar, substituindo-o por elementos antagônicos, díspares e viciados, como se a falsificação pudesse, em algum momento, revestir-se da autenticidade do Autor Supremo; onde a imitação assumisse o caráter próprio do original. Pois, onde há ordem, é impossível a desordem. Onde há o bem, é impossível o mal. Onde há santidade, não há pecado. Onde há justiça, não há injustiça. Onde há vida, não há morte. Na origem, não existe incerteza. Na unidade, não há dispersão. No eterno, não há efêmero. Por isso o pecado é a resistência ou a obstinação do homem em reconhecer a glória do Altíssimo.

É possível que alguém avente a hipótese de eu estar me entregando ao dualismo, o que não é o caso. A Bíblia afirma que todas as coisas foram criadas por Deus, estabelecidas eternamente em seu Decreto, de tal forma que nada, absolutamente nada, surgiu à sua revelia; pois toda a criação, seja espiritual ou material, veio a existir do nada; não havia substância pré-existente a qual Deus utilizou para formar o universo. O que vale dizer que tanto o mal como o pecado não são autocriados ou originários de outra "força", mas vieram à existência pela vontade decretiva de Deus. Portanto, tudo, em seus mínimos e irrelevantes detalhes, está sujeito ao Criador, sem que pudesse existir alheio à sua deliberação; e aqui, como já disse, inclui-se o pecado, o mal, a Queda, etc.

Mas o que isso tem a ver com Cristo?

Tudo!

Visto ser Deus, e por ele todas as coisas virem a ser, pois se assim não fosse não se realizariam; e por todas elas serem sustentadas pelo poder da sua palavra; reconhecemos o seu poder, autoridade e perfeição. Mais especificamente, o fato é que por suas naturezas e atributos perfeitos, Cristo jamais pecou. Mesmo em sua humanidade, ele não poderia pecar. O pecado é-lhe algo completamente exterior e estranho, assim como é para Deus, de tal forma que, em Cristo, o pecado não teria qualquer oportunidade de se manifestar, como não teve nem terá. Por isso é-me inconcebível a idéia da "possibilidade de Cristo pecar", como uma blasfêmia, uma afronta à sua santidade e perfeição. A humanidade de Cristo não é perfeita porque ele não pecou, mas ele não pecou porque ela é perfeita. Há uma diferença brutal nisso. A mera possibilidade de Cristo vir a pecar, ainda que como hipótese remota, afetaria a sua perfeição. Se não cogitamos o mesmo de Deus, porque o cogitaríamos para Cristo, sendo ele Deus? Ou seria Cristo duas pessoas em uma? Ou a combinação das duas naturezas gerando uma terceira? E assim teríamos uma personalidade esquizofrênica e conflituosa? A disputar, na confusão, um sentido incompreensível e não declarado na Escritura? Se na sua humanidade fosse possível, metafisicamente falando, o pecado, isso afetaria a sua perfeição e divinidade, pois ainda que as suas naturezas não se comuniquem, elas fazem parte da mesma pessoa, o Verbo. Não há dualidade em Cristo, mas unidade. Não é possível a imperfeição no perfeito. Nem o transitório no perpétuo. A singularidade de Cristo está em sua divindade-humanidade, mas também no fato de sua humanidade ser exclusiva. Nem mesmo o Adão pré-queda era como Cristo, visto ter pecado, e não ter podido não pecar [4].

Sabemos que o pecado traz consigo uma série de anomalias, e seus efeitos noéticos tornam o homem em inimigo de Deus; de maneira que ele sempre se oporá ao Criador, rebelando-se em sua pretensa autonomia, rejeitando-o, e agradando-se de não obedecer à sua vontade. O homem, se Cristo não o resgatar, estará irremediavelmente perdido, condenado. Este é o maior e definitivo dano provocado pelo pecado: a eterna separação de Deus. Seria a obra completa de sua realização: a morte eterna. Então, como é possível imaginar que Cristo poderia se enquadrar nessa condição, ainda que como uma probabilidade impossível? O próprio decreto eterno estabeleceu que Cristo encarnaria, assumiria a forma humana, e não pecaria. E ele é inexorável; não se movendo em sua irredutibilidade. Porém, a perfeição e santidade do Redentor vai muito além do decreto eterno, pois são atributos da sua natureza, mesmo em relação à sua natureza humana, que não estava sujeita à influência ou coerção do pecado.

Isso, por si só, já seria argumento suficiente para distinguir Cristo dos demais homens. Mas ao se dizer que a natureza de Cristo não é idêntica à do restante da humanidade, toma-se uma proporção desproporcional, ao ponto de se concluir que assim a sua obra expiatória não seria possível. Mas onde mesmo a Bíblia afirma que Cristo é idêntico, em todos os detalhes, ao homem? Esta não seria uma acertiva na qual se está mais preocupado em preservar a nossa condição de semelhantes a ele do que em reverenciá-lo por sua obra consumada? Ou mesmo revelar a sua singularidade na normalidade do homem? Ou sua pessoalidade na nossa incapacidade pessoal de ser como ele é? E poder glorificá-lo naquilo em que ele é, mesmo diferente de nós?

Veja bem, não nego ou relativizo nenhum ponto da ortodoxia cristã, mas acho um exagero e mesmo um despropósito, afirmar que Cristo é 'ipsis litteris" como nós, à parte de sua divindade. Com isso, não estou questionando a sua humanidade, nem que seja homem, mas questiono o fato de como nós, seres imperfeitos, iníquos, rebeldes e inconstantes em nossa irregularidade poderíamos ser comparados a ele, perfeito, santo, obediente, um com o Pai em sua absoluta unidade. Cristo é "sui generis", único, peculiar, fora do comum em sua Pessoa, ainda que tenha a mesma humanidade que nós... à exceção da disposição adâmica ao pecado.

Contudo, o pecado não é um mero detalhe... Assim como a disposição ao pecado também não é. E se todos, sem exceção, temos essa disposição, ao ponto em que o pecado se tornou inevitável em nossas vidas, Cristo não a tem, por isso, não pecou. A sua natureza humana, ainda que semelhante à nossa, é impecável. E isso faz uma enorme, grandiosa diferença, tanto nele, como na boa obra operada em nós, e que nos levará, infalivelmente a não mais pecar, pois, naquele glorioso dia, seremos feitura sua, de tal forma que em nós a sua glória imaculada consumar-se-á, e adquiriremos, por sua graça, a  sua perfeição que anulará o pecado, tornando-o extinto e ineficaz em sua inocuidade.

E essa é a mais viva esperança que o cristão pode desejar, quando, face a face com o Senhor e Salvador, seremos finalmente como ele é. E teremos enfim a sua natureza humana, em todos os seus detalhes, capacitando-nos à santidade e à impossibilidade de ceder ao pecado. Quando toda a obra planejada e posta em execução por Deus no tempo, na história, se consumará definitivamente. E somente ali os eleitos reconhecerão que nunca foram como ele, mas agora, eternamente, serão! Pois Cristo é a negação do pecado!

Notas: * Escrito e narrado por mim... mas o áudio chega sempre algumas horas ou dias depois.
[1] União Hipostática: é a união das duas naturezas, divina e humana, em uma Pessoa; o que faz de Cristo uma Pessoa Teoantrópica, ou seja, ele é ao mesmo tempo Deus e homem. 
[2] O fato da minha declaração não ser considerada "ortodoxa" não a inviabiliza como biblica. Muito da ortodoxia, e tem-se de definir o que seja ortodoxia primeiramente, é discutível inclusive por ortodoxos. E o que vale, necessariamente, é o princípio estabelecido na Escritura, mesmo que ele não seja considerado ortodoxo. Especificamente no meu caso, eu nego a heterodoxia do que disse, e afirmo que os meus postulados são bíblicos. 
[3] Dicionário Bíblico Wycliffe - pg. 1.485 - Editora CPAD.
[4] Sobre não concordar com a posição de Agostinho quanto à idéia de que o Adão pré-queda poderia "não pecar e pecar", ler o meu texto: "Todos esses anos... e nunca fica fácil"


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19 abril 2011

Livro do Mês: A Soberania Banida

Ouça este artigo:



A RUÍNA DO LIVRE-ARBÍTRIO

                                 Escrito e narrado por Jorge Fernandes Isah

Fiz uma primeira leitura do livro em 2008, quando já era calvinista... bem, um calvinista ainda inconsistente, mas posso garantir que a partir das refutações de Wright ao arminianismo, paganismo e ao humanismo, não ficaram dúvidas, nem pedra sobre pedra. Então, vi-me seduzido a novamente ler o livro. Não sem antes fazer a pergunta: "Por que reler 'A Soberania Banida'?"... Não foi difícil relacionar alguns motivos:

1- Grandes livros devem ser lidos e relidos.
2- A Soberania Banida é um grande livro, cujo tema é pouco divulgado e cujo material é escasso em português [Há de se ressaltar o esforço da Editora Monergismo em publicar obras sobre o assunto, em especial, as de Gordon Clark e Vincent Cheung].
3- Quando da primeira leitura, ainda caminhava meio que titubeante pelo Calvinismo, pois até pouco tempo antes era um amyraldiano sem saber, crendo ser calvinista. Então, provavelmente, muito do que li ficou perdido ou sequer foi visto por meus olhos limitados quanto à doutrina da graça.
4- Queria, e quero, avaliar o pensamento do Wright com o de Clark e Cheung, e ver até que ponto eles são semelhantes ou conflitantes.
5- A oportunidade de detalhar melhor aqui no blog o livro, o que não pude fazer na primeira leitura [o livro estava fora de catálogo, e peguei-o emprestado; fiz uma leitura rápida, para não "prender" muito o exemplar em minhas mãos]. 
6- Acho que este título merece ser mais conhecido e divulgado, e oro para que Deus me capacite a analisá-lo em alguns dos seus detalhes, sem tirar o desejo de quem porventura queira lê-lo. Ou seja, não ser explícito por demais e acabar por revelar mais da leitura do que deveria.

Entrando propriamente no cerne do livro, ele combate a falsa idéia de que o homem tem alguma influência em sua salvação, de tal forma que ela se tornaria uma obra humanamente meritória. E sua relevância está exatamente em não deixar que o homem, em momento algum, pense que isso possa ser possível; usurpando de Deus a honra, glória e louvor por toda a obra de salvação, desde quando a decretou na eternidade até a sua realização e consumação no tempo. Wright ressalta a impossibilidade de haver cooperação entre Deus e o homem, de maneira que somente um ou outro é o autor da salvação... Como o homem não pode salvar a si mesmo, e acredito que nem queira fazê-lo, a conclusão é de que todo o planejamento, execução e resultado podem ser creditados exclusivamente a Deus.

Em relação ao arminianismo, há de se dizer que, além de sua posição nitidamente antibíblica, ele foi uma espécie de irmão "univitelino" tanto do Iluminismo como do Racionalismo, gerando dessa depravação doutrinária/ideológica o liberalismo cristão e um sem número de apostasias e heresias; os seus filhos bastardos, a partir da formação do que se pode chamar a "tríade do Mal". Historicamente nenhum movimento esteve ligado a tantas distorções e corrupções do Evangelho quanto o arminianismo, e o que se pode perceber é sua influência autônoma em todas as formas de degeneração do Cristianismo bíblico criadas pelo homem natural. Entre várias  delas podemos citar como descendência direta o Universalismo, o Unitarismo [ao pender vergonhosamente para o Arianismo], o Reavivalismo de Finney e seu abominável evangelismo de resultados, pragmático, sentimentalóide, e avesso à doutrina e a razão. Muitas seitas têm em comum com o arminianismo o mesmo princípio: a suposta liberdade e poder da criatura de frustrar os desígnios do Criador.

Wright demole, ponto a ponto, os argumentos arminianos, os quais são provados inconsistentes e falsos, cujos princípios servem apenas à vontade autônoma do homem [o desejo em tê-la independente de Deus], capaz de se sobrepor e se impor até mesmo sobre a vontade divina. Para eles, é possível Deus ser Todo-Poderoso, soberano, controlar todas as coisas e, ainda assim, o homem ser livre e capacitado a ter em suas mãos as decisões de maneira totalmente livre, podendo até mesmo aprisionar "Deus" em suas vontades, anulando-o, como se o placebo pudesse, em sua inatividade e ineficácia, controlar, determinar e administrar a cura em sua neutralidade indeterminada.

Nesse quadro, onde fica a graça salvadora de Deus? Se é pela graça que somos salvos, seria possível ela estar sujeita ao livre-arbítrio humano? E como esse suposto livre-arbítrio se relacionaria com a natureza pecaminosa e a Queda? Estaria ele dissociado delas? Ao ver do arminiano, isso é possível, porém, ilógico e insustentável, especialmente quando a Bíblia nos revela que todos estamos debaixo do pecado, não promovemos o bem mas o mal, e não queremos nada com Deus, não ao ponto de nos arrepender da nossa iniquidade e sujeitar-nos ao senhorio de Cristo espontaneamente. Na verdade, o homem natural quer um Deus submisso e sujeito, uma espécie de “deus da lâmpada”, um gênio das mil e uma noites sempre disposto a realizar os desejos das suas criaturas,  numa obediência lacaíca, carnal e tola.

O fato é que, se Deus não operar em nós a regeneração, o novo-nascimento, chamando-nos eficazmente a reconhecer a obra de Cristo como suficiente e única para a salvação e justificação do ímpio, nada feito! Permaneceremos mortos em nossos pecados e iniquidades, distantes de Deus, longe da sua graça, sem a menor vontade de arredar um centímetro em direção ao seu trono de glória; refestelando-nos no pecado como porcos na lama.

Em quase todos os aspectos, o pensamento de Wright está em acordo com o de Clark e um pouco menos com o de Cheung, [provavelmente por McGregor e Gordon serem presbiterianos ao contrário de Vincent; e aí reside a necessidade daqueles subscreverem a C.F.W. enquanto este não] o que o torna em calvinista no sentido pleno da palavra, pois não se encontram presentes no livro as comumentes expressões antinomia, paradoxo ou mistério, para explicar algum princípio bíblico que não se queira reconhecer baseado na Escritura, a fim de não causar "mal-estar" entre leitores e ouvintes mais suscetíveis à verdade. Normalmente paradoxo ou mistério é utilizado para respaldar algum conceito humanista e enfraquecer ou desqualificar um princípio bíblico, a não ser no caso especifício da "graça comum", a qual o autor parece dar algum crédito, assim como a maioria dos calvinistas, mesmo que não se encontrem evidências para ela, ao contrário, a razão indica a sua inexistência como princípio revelado por Deus. Porém, reconheço que Wright não detalha o que venha a ser "graça comum", revelando, talvez, a sua irrelevância doutrinária.

O livro é um excelente tratado sobre a "soberania divina x livre-arbítrio" [quem considera possível uma união de forças entre elas está completamente enganado, pois são conceitos antagônicos e rivais], e os argumentos e princípios bíblicos são reveladores de que Deus é 100% soberano e o homem não é livre para fazer escolhas autônomas à parte do Criador, como se houvesse chance desse homem ser, de alguma forma, livre de Deus. Nada no universo é livre de Deus; portanto, o homem é livre apenas para pecar conforme a sua natureza iníqua.

Um capítulo deveras interessante é o que Wright destina a análise dos supostos "versículos arminianos" na Bíblia. Escolhendo aqueles usados pelos autonomistas para defenderem suas posições [a partir da descontextualização], o autor, partindo-se do pressuposto de que não há contradição na Bíblia, e de que é impossível se afirmar um sistema e o outro ao mesmo tempo, ou propor uma simbiose entre eles [o que chamou de "calminianismo"], assegurou que o versículo em si pode não ensinar qualquer doutrina distintivamente calvinista, mas o ponto a ser estabelecido é que os arminianos não têm qualquer base para citá-los em seu favor.

Desta forma, provado que os supostos "versículos arminianos" não ensinam o arminianismo, livres de preconceito, poderiam explorar a possibilidade de realmente haver versículos na Bíblia que tornam inevitável o conceito calvinista da salvação.

Os versículos são agrupados tematicamente da seguinte forma:
1) Sobre o livre-arbítrio;
2) O termo vontade;
3) Escolhas humanas;
4) Ordens;
5) Convites;
6) A utilização do termo "livre-arbítrio" em algumas versões da Bíblia;
7) E, mais detidamente, nos únicos dois versículos "obviamente arminianos", ironicamente assim chamados por Wright, demonstram não haver nada de arminianismo neles.

Há a indicação do livro de John Owen "The Death of Death in the Death of Christ", publicado pela Banner of Truth, e disponível no Brasil resumidamente com o título "Por Quem Cristo Morreu?", publicado pela Editora PES.

Qualquer arminiano que ler esse capítulo em especial [desde que não se endureça a ponto de não ver a verdade, apegando-se tolamente à mentira], se certificará da fraqueza e verá desmoronar a sua interpretação quanto ao "arminianismo bíblico". Ele até poderá não aceitar a doutrina calvinista da salvação, mas não haverá como continuar proclamando a teoria antibíblica do arminianismo e o seu mote principal: o livre-arbítrio.

O autor aborda ainda a questão do determismo bíblico, da responsabilidade x liberdade, e do suposto dilema "Deus e o mal", prato-cheio para humanistas ignorantes e cristãos igualmente mal-informados.

Ao final do último capítulo, Wright esboça 5 razões para não se aderir à teoria do livre-arbítrio a partir das 5 máximas dos próprios "livre-arbitriristas".

Creio que, por isso, muitos decidem fugir de livros tão reveladores como "A Soberania Banida", contando-se com exposições frágeis, conflituosas, incoerentes e irracionais de autores não comprometidos com a verdade ou que apenas se enganam, iludidos pela mentira.

Notas: 1- Ao final de cada capítulo há uma lista de leitura adicional; infelizmente, em sua esmagadora maioria, não disponível em português.
2- "A Soberania Banida", escrito por R. K. McGregor Wright, e publicado pela Editora Cultura Cristã
3- Todos os meus comentários ao livro podem ser lidos AQUI
4- Na seção "Textos Selecionados", em "Cristologia & Soberania de Deus" e "Apologética & Outros", pode-se encontrar vários artigos em que abordo as questões da impossibilidade do "livre-arbítrio" e também sobre "responsabilidade x liberdade".
5- Avaliação do livro: [*****] Excelente!

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22 março 2011

Fragmento de um diálogo sobre algumas coisas e outras também













Por Jorge Fernandes Isah

Ontem estava escrevendo um longo texto e por uma daquelas coisas que somente Deus pode explicar, perdi-o [ainda que eu saiba que foi por lerdice e descuido meu]. Tentei de todas as formas recuperá-lo, porém sem sucesso. Apelei para irmãos e amigos, nada! Como minha oração, sempre antes de escrever, é para que Deus seja glorificado pelo texto, crendo na sua soberania e providência, confortei-me com o fato do Senhor querer que eu o melhorasse ou simplesmente não o escrevesse. Ainda não me decidi a reiniciá-lo, nem sei se o farei, porém, certamente, não era da vontade divina que fosse postado hoje. E aceito sua decisão como santa e perfeita; o melhor para mim mesmo e os leitores.

Como os meus textos emergenciais se esgotaram [uso-os para o caso de não produzir algo novo, arquivando-os nos momentos de "vacas-gordas" para desarquivá-los nos momentos de "vacas-magras"], reproduzirei parte de um diálogo, que pode ser considerado alternativo. Foi travado com um irmão, a quem sou grato pela amizade e por nossas esparsas mas sempre edificantes conversas. Espero que ao ler e se identificar como o “irmão B”, ele entenda que mais do que um "tapa-buraco" é também uma forma de homenageá-lo, no que vinha cogitando há algum tempo. Por isso, mantê-lo-ei em sigilo, ainda que possa ser descoberto [não lhe pedi autorização para publicar o nosso bate-papo], e algumas modificações no texto foram necessárias para mantê-lo no anonimato. Orando para que o bom Deus seja glorificado.

Vamos à conversa!

FRAGMENTOS DE UM DIÁLOGO

Eu: Você conhece o Instituto Ronaldo Lidório? Acho que é assim que se escreve, especializado em literatura e filosofia medieval?
B: Conheço não. Tem site?
Eu: Mandam sempre letters para mim com promoção de livros... Os títulos são interessantes, mas queria saber se são confiáveis... Parecem escolásticos... Estou tentando achar o link, mas está perdido no meu "lixo" [rsrs]
B: rsrs...  Acho que vale ler escolásticos. Não todos [o que é impossível], nem muitos. Mas alguns, sim... Aquino, por exemplo. Eu tenho respeito por parte da tradição católica... Não por suas heresias, claro!... Mas eles são bons em história e filosofia... Tanto quanto a razão sem redenção pode ser [mas você sabe que creio que mesmo o católico pode ser salvo, ainda no catolicismo].
Eu: Li o livro do Étienne Gilson, o Filósofo e a Teologia... Gostei demais! Ele é escolástico, faz uma defesa de Aquino; mas uma defesa apropriada da Escritura e da teologia cristã sobre todas as demais ciências.
B: Eu não diria que ele é escolástico, mas tomista.
Eu: Até já comprei outro dele, da Paulus, baratinho no Submarino; onde ele comenta as divergências entre Aquino e Agostinho.
B: Mas é por aí.
Eu: Não é a mesma coisa? Escolasticismo [1] e Tomismo? [2].
B: Não. O escolasticismo é aquela escola medieval. Os tomistas podem ser escolásticos no método ou simplesmente seguidores, mais ou menos de perto, de Aquino.
Eu: Achei que tomista fosse algo derivado diretamente de Aquino, como Calvinista de Calvino, etc
B: E os escolásticos tinham divergências gritantes entre si. É mais o método medieval de filosofar que uma linha específica... Tomista sim. Escolástico não. Tomás é só um dos escolásticos.
Eu: Ah... pois o Gilson é tomista então... Defende Aquino com unhas e dentes.
B: Este livro do Gilson aí me interessou.
Eu: Achei o link... é Raimundo Lúlio... nada a ver com Lidório... O livro é muito bom. Dê uma chegada no meu blog de livros... Fiz alguns comentários... Bem, nada que possa animá-lo.
B: Falaram muito bem desse livro que você está lendo.
Eu: Já terminei.
B: Quero ler também, mas pensei no de Agostinho versus Tomás.
Eu: Está no lacre. Ainda não li. Mas posso dar uma folheada e lhe contar mais ou menos o teor.
B: Curti. Manda ver
Eu: Ok. Mas compra o Filósofo e a Teologia... Você que entende do negócio vai gostar muito mais... Eu, que não entendo, gostei tanto que quero comprar outros livros do Gilson.
Eu: Vai o link do Raimundo Lúlio . Se puder dar uma olhada e depois me dizer o que vale a pena comprar,  ficarei muito grato.
B: Nunca consegui ir muito longe... na Introdução a Agostinho... Sempre paro no meio do livro. Mas é muito bom.
Eu: De qual editora?
B: Peraí... Paulus... Humm... Não deu vontade de nada ali no site que você indicou...  Achei que eles editassem os medievais.
Eu:O que comprei do Gilson e ainda não li é Por que São Tomás criticou Agostinho... Rapaz, a Introdução a Agostinho é do Gilson! Pena que esteja esgotado... mas vou ver se encontro na Estante Virtual.
B: Esse sei que é bom.. Esse também do "Agostinho x Tomás de Aquino" parece ser legal... Só não concordo com a premissa de que o que há de ser questionado no pensamento de Agostinho advém de uma fonte não cristã... Em contraste com a fonte de Tomás. Ambos beberam de fontes não cristãs.
Eu: O Étienne é um cristão. E deve analisar pelo ângulo da teologia cristã.
B: Sim, mas é um cristão tomista, que vê em Tomás a síntese perfeita... Cara, já leu Schaeffer?
Eu: Isso é verdade... Sim. Tenho uns quatro livros dele. Mas li a maior parte quando ainda era recém-convertido. Certamente perdi muita coisa... Mas estou para relê-lo. Depois que fizer uma limpa na fila [rsrs]... E tenho de parar de comprar livros... Mas é quase uma doença compulsiva... Uma obsessão [rsrs]
B: Meu, leia! Leitura obrigatória para entender o problema da síntese.
Eu: A trilogia que começa com O Deus que intervém?
B: Problema do qual nem o mestre escapou [Agostinho], embora sua síntese seja a mais harmônica possível... Talvez porque Platão fosse melhor que Aristóteles! rsrs.... São esses livros mesmo.
Eu: Tenho a trilogia. Vou colocar na lista de prioridades... Interessante que o Gilson diz que Aquino não era aristotélico... Como todos dizem que ele era.
B: Mas era. Obviamente não de todo. Como Agostinho também não era de todo platônico.
Eu: Bom saber essas diferenças... Agora só terei de ler Platão e Aristóteles para descobri-las [rsrs].
B: rsrs... Não precisa. Ler um pouco sobre eles já ajuda. Eu nunca li Aristóteles. Já li Platão. E gostei muito.
Eu: Comprei o Apologia de Socrátes... É pequeno, mas ainda não li. Vou ver se faço isso esta semana ainda.
B: É muito bom esse... Mas lembre-se apenas que não é literatura cristã!
Eu: Conversando com você e mais alguns irmãos, vou acabar virando filósofo sem ter de passar por uma faculdade.
B: rsrs... Bom! Muito bom!... Precisamos de filósofos cristãos.
Eu: Claro! Gosto de teologia, mas leio romances seculares, culinária, história... E, agora, filosofia!
B: Culinária, é?... Curto muito!
Eu: Sim. Também. Falta-me tempo e meios... Sou chato. Quero tudo do melhor. Então, me limito na prática... Bem, tenho de ir. Depois, nos falamos mais. Abraços.
B: Abração!


Foi realmente um bom papo; e espero que Deus nos possibilite ter outras vezes.

Notas: [1] Escolasticismo é o exercício da atividade racional (ou, na prática, o uso de alguma filosofia determinada, neoplatônica ou aristotélica) com vistas ao acesso à verdade religiosa, à sua demonstração ou ao seu esclarecimento nos limites em que isso é possível... o fundamental é levar o homem a compreender a verdade revelada.
[2] Tomismo são os fundamentos da filosofia de Tomás de Aquino, conservados e defendidos pelas correntes medievais e modernas que nele se inspiram. Especialmente em sua relação "razão e fé", que consiste em confiar à razão a tarefa de demonstrar os prâmbulos da fé, de esclarecer e defender os dogmas indemonstráveis e de proceder de modo relativamente autônomo(excetuando-se o respeito das verdades de fé que não podem ser contraditas) no domínio da metafísica e da física. [Fonte: "Dicionário de Filosofia" - Nicola Abbagnano]

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05 março 2011

A ética do velho-oeste

             














Por Jorge Fernandes Isah

                 Muito se fala em ética, hoje em dia, mas acho que poucas pessoas a relacionam com a lei e com a moral. Há até mesmo uma idéia de que ela pode prescindi-las, chegando ao cúmulo de ser equiparada a um simples pensamento, como uma maneira pessoal de melhor se relacionar e conviver na sociedade, sem contudo ser aplicável. É mais ou menos como um homem feio achar que cortar os cabelos e fazer a barba tornará a sua aparência melhor, quando a falta dos pêlos apenas ressaltará ainda mais a sua feíura. Porém, isso levaria a uma confusão ética, pois uma ética individual pode mesmo ser uma anti-ética, já que estará baseada no subjetivismo, à mercê de elementos como o desejo, intenção, preferência, etc. Esse tipo de distinção é falacioso, pois não há diferença entre a ética pessoal e a social, visto toda a conduta individual ter um significado que afetará tanto o indivíduo que decide quanto as outras pessoas que não tiveram o poder de decisão mas serão atingidas por ela. Portanto, é necessário que a ética esteja vinculada a um padrão. Como o homem é caracteristicamente um ser social, as decisões individuais terão, na maioria das vezes, implicações na sociedade. Mas qual seria esse padrão? E, ainda, pergunto: é possível haver ética sem moral? E moral sem um corpo legal que a estabeleça? Ao meu ver, isso é impossível, especialmente no Cristianismo.
                  Primeiro, tem-se de definir o termo: o que é ética? Segundo o Michaelis: 
Ética - sf (gr ethiké) 1- Parte da Filosofia que estuda os valores morais e os princípios ideais da conduta humana. É ciência normativa que serve de base à filosofia prática. 2- Parte prática da filosofia social, que indica as normas a que devem ajustar-se as relações entre os diversos membros da sociedade.
                   Outra definição seria: "Ética é a pesquisa da natureza moral do homem com a finalidade de se descobrir quais são as suas responsabilidades e quais os meios de cumpri-las. A ética compartilha com outros empreendimentos humanos a busca da verdade, mas distingue-se deles na sua preocupação com aquilo que o homem deve fazer, à luz da verdade desvendada. Ela não é simplesmente descritiva, mas também prescritiva no seu caráter" [1].
                  Nossas decisões e valores serão influenciados por um padrão normativo, seja a moralidade, a falsa moralidade ou a imoralidade. Para um cristão, o aborto é algo imoral e anti-ético; para um abortista não é mais do que uma opção possível, dentro de uma moral e ética deturpadas.
                Então, repetindo a pergunta: qual o padrão a se usar?
           Para nós, e o restante da sociedade, deveríamos baseá-la na perfeição e santidade divinas, o padrão moral máximo pelo qual o homem rejeitaria valores abomináveis e ofensivos a Deus e, por conseguinte, ao próprio homem.  E esse padrão está no código moral divino, a sua lei, dada a todos os homens sem exceção. Mesmo um não-crente será favorecido por ela, ao ponto de poder viver tranquilo e em segurança, sabendo que qualquer infrator receberá a pena justa na proporção do crime comentido. Isso seria o mais próximo que a Bíblia revela de algo que chamamos erroneamente de graça comum; mas que em nada agracia o bandido.
                  Portanto dizer que a ética não é derivada da moral e da lei, é dizer que não há ética, pois quem estabelece o sistema pelo qual ela existirá é exatamente a lei e a moral.
            O mundo evoca a todo instante um relativismo e um pluralismo visando  aniquilar a moral e a ética como absolutos; como um sistema de valores pelos quais a sociedade decidirá e julgará através das escolhas corretas, baseada na verdade, a qual é o próprio Deus; revelando e dando-a através das Escrituras, a sua palavra fiel, inerrante e infalível, para que o homem viva ordeiramente no mundo. Assim, em sua justiça, retidão e santidade, a lei de Deus é transposta como o padrão perfeito de ética e moral para todos, de forma que os justos serão beneficiados por ela, pela justiça que ela traz, e pelo prazer em segui-la; enquanto os injustos serão punidos por ela, pela igualmente justiça que ela traz, a qual rejeitam deliberadamente. 
             É claro que, por causa da queda e do pecado, o homem sempre quererá e buscará, ou se inclinará, a tomar as decisões que são opostas ou contrárias a Deus e sua lei, e também contrárias ao seu semelhante. Em muitos casos, se aglutinarão em grupos onde se defenderão, em busca da não observância da ética cristã, em flagrante oposição aos princípios bíblicos, num sistema corporativista onde o indivíduo é privilegiado em sua sanha de pecar e infringir a lei divina sem qualquer sanção ou restrição.
           Em muitos casos, os cristãos, aqueles que deveriam defender os valores morais e eticamente bíblicos, também se opõem a eles, reservando-se em grupos igualmente antinomistas, os quais consideram possível guardar a lei apenas em seus corações e assim estarem distantes do seu justo julgamento. No fundo é um habeas-corpus preventivo, as avessas, onde o infrator tem assegurado o livre trânsito social para cometer todos os tipos de crimes, além de um salvo-conduto para aterrorizar, perseguir e vitimar inocentes, trazendo-lhes perigo real e imediato, numa espécie de orgia pavorosa; onde o pecado pode ser livremente cometido, disseminado, e até mesmo estimulado, ensinado e defendido como o padrão de liberdade alcançada pelo homem em que se reconhece unicamente a auto-satisfação, a qual é a referência de si para si mesmo; e nisso, a comunidade será sempre a primeira e a última a pagar o alto preço por sua própria conivência com a impunidade; onde o pecado é consagrado no altar do individualismo. Estranhamente, sem que se perceba, enclausurado está o indivíduo, vitima do próprio individualismo; a marca mais resistente do pecado a destruir-lhe a alma.
              Este é o caráter máximo da não observância da lei e da ética: a liberdade que se busca em pecar sem qualquer sentimento de culpa, sem qualquer coerção, de tal forma que o amor ao próximo será um amontoado de palavras vazias, pois o não se subordinar a ele [no sentido de que o amar a Deus e ao próximo o disporá na posição de dependência e humilhação] o colocará na condição ilusória de apelar à autonomia de que até mesmo o amor deve-se sujeitar à liberdade pessoal de fazer o que se quer e como se quer, sem o menor constrangimento, sem qualquer tipo de sujeição ou obediência a Deus. Partindo-se do princípio de que não existe autonomia, mas uma tentativa frustrada de se tê-la, chega-se facilmente à conclusão de que o amor pelo qual se apela também é utópico.
            O grande dilema de muitos cristãos é imaginar que Deus somente pode ser obedecido pelo eleito, e de que o não-eleito estará livre para desobedecê-lo explicitamente; o que pode nos colocar na situação embaraçosa de não exigir dos outros que se dê a devida honra a Deus, e assim reconhecer a nossa própria dificuldade em também fazê-lo. Ora, Deus é Senhor de todas as coisas, e tudo está sujeito a ele, quer se queira ou não, e a ordem é para que todos, sem exceção, sejam obedientes e cumpram seus mandamentos. Como muitos cristãos resguardam-se a si mesmos o direito de pecar, considerando-o algo normativo e usual [interessante o número de crentes a afirmar a impossibilidade de não pecar, quando isso deveria ser uma vergonha para qualquer um], de certa forma essa impossibilidade é transferida para os ímpios como algo natural e do qual nada podem fazer. Realmente, não se pode acrescentar coisa alguma ao que já é perfeito, a lei, como o limitador, o inibidor da maldade no homem natural. Se temos o Espírito Santo e a lei a nos orientar e interferir em nossa vontade de maneira que não pequemos, aos não-eleitos resta-lhes apenas a lei como freio, na qual os seus destinos encontram-se eterna e definitivamente selados.
              O fato é que a pretensa autonomia não existe, e nada mais é do que o homem encontrando um jeitinho de permanecer escravo por meio de um sistema de valores não-cristãos que lhe dará a falsa idéia de estar livre de Deus, quando mais do que nunca ele está preso ao que lhe pode ser mais danoso: a insubordinação e a rebeldia contra o Senhor. E a consequência será a condenação eterna pela mesma lei que teima em transigir e desprezar.
             Por se ter vários tipos de ética, e o homem estar sujeito a elas, as quais são injustas e falhas em suas premissas de salvaguardá-lo a partir da desordem em si mesmo, o resultado será a imperfeição a serviço da imperfeição, dentro de uma relatividade em que o senso cultural e temporal do conhecimento humano, que poderá abastecer-se no passado de práticas falidas que ressurgem não como esperança, mas como afronta à dignidade humana, e, primeiramente, um insulto ao próprio Senhor; converter-se-á na busca infrutífera pela verdade, distanciando-se de modo que encontrá-la será encaminhar-se à completa impossibilidade. O passo seguinte é satisfazer-se em tornar a mentira numa aparente verdade, como se possível fosse buscar em nós mesmos aquilo que somente pode existir no Deus vivo e verdadeiro, e que é a sua essência. Quando esse princípio é abandonado, o homem se torna na própria farsa; de criá-la com o propósito do auto-engano; num esquema em que a realidade não pretendida é o resultado do processo pelo qual a irrealidade desejada não se concretiza. Guardadas as devidas proporções, seria o mesmo que deixar uma matilha de lobos cuidando das ovelhas, na expectativa de que nenhum mal recaía sobre elas. Haverá sempre a busca insensata de se burlar, de falsear a verdade e ver-se livre da moral e ética bíblicas.
                 Podemos citar, como exemplo, a ética marxista que na verdade é a não-ética, pois para eles tudo é possível, até os mais hediondos, reprováveis, imorais e ignóbeis atos a fim de que a revolução seja vitoriosa. No processo revolucionário tudo é possível, menos a moral e a ética. E como eles, muitos cristãos estão a se misturar e a sujar as mãos no sangue dos santos, imbuídos de uma luta na qual serão também vítimas [se já não são], pois servem apenas de “escada”, de trampolim, para que se atinja o poder e, então, os tolos serem sumariamente descartados; ou, ainda pior, se juntarão definitivamente em suas fileiras imorais e pervertidas sem nenhum peso na consciência ou escrúpulo, pelo contrário, com a certeza do dever cumprido em nome da “causa” que inadvertidamente supunham ser de Deus.
             Há éticas de todas as formas e para todos os gostos: existencialista, utilitária, naturalista, etc, mas todas como conseqüência da rebelião, da rejeição do homem natural a Deus; que se quer ver livre de qualquer padrão justo e santo, assim como o porco se refestela na lama, sujando-se ainda mais. É como está escrito: “Quem é injusto, seja injusto ainda; e quem é sujo, seja sujo ainda” [Ap 22.11].
               Por isso, a maioria das pessoas quer viver no padrão coletivo em que o comportamento individual seja o reflexo objetivo da servidão e de alimentar o mal, operando a degradação própria e plural, como autênticos "fora-da-lei".

Nota: [1] Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, II, pag. 86 - Editora Vida Nova.
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28 fevereiro 2011

Livro do mês: Deus e o Mal, o problema resolvido


          Por Jorge Fernandes Isah


Antes de ler textos esparsos de Clark e Cheung no Monergismo, eu vivia interrogando irmãos mais experientes na fé [e que são pessoas letradas, que entendem muito de teologia] sobre as implicações do mal na soberania de Deus. Normalmente a resposta era de que não havia respostas. Há, mesmo entre calvinistas, a idéia de que Deus é soberano e o homem é livre em algum aspecto. Mas eu não conseguia conciliar as duas coisa, nem mesmo via essa tal liberdade decantada, em livros e sermões, na Escritura. O que eu via era o homem agindo sempre segundo o propósito divino; e ao me deter no texto do Antigo Testamento, a coisa ficava ainda mais claramente delineada e exposta.

Livros como o de Jó, Isaías, Jeremias, João e Romanos, foram decisivos para eu abandonar completamente a possibilidade de conciliar a soberania de Deus com a liberdade humana, seja na forma de livre-arbítrio ou livre-agência.

Então acostumei-me a ouvir que havia paradoxos na Bíblia e de que eles existiam conjuntamente como uma espécie de  "mistério", ao qual Deus não nos revelou. Porém, nada disso me confortava; e lendo grandes teólogos [Spurgeon, LLoyd-Jones, Sproul, Piper, etc] a coisa toda não se resolvia. Era como se eles caminhassem até a conclusão final e, quando estavam prontos para enunciá-la, parassem, retrocedessem, e se conformassem com o tal do "mistério" ou do "paradoxo". Eu continuava frustrado e decepcionado, mas já vislumbrava uma hipótese que não assumia efetivamente por medo e temor do que viessem a pensar ou falar de mim [não é agradável para um crente ser visto como herético ou heterodoxo, ou quando menos, um irresponsável por cogitar o que muitos não consideravam possível. Sempre ouvia: "irmão, você está querendo ir onde os santos não ousaram ir. Cuidado!". Era quase uma "praga" proferida, de que não me arriscasse a ir, senão...].

Um belo dia, deparei-me com Gordon Clark [de quem nunca ouvira falar], e um pouco depois, Cheung. Lê-los foi um alívio, como se tivesse tirado toneladas de peso às costas, pois eu me certifiquei de que não era louco, nem herético, ou simplesmente um provocador, mas de que minhas dúvidas eram honestas, verdadeiras, e de que outros haviam pensado assim como eu. É claro que havia semelhança entre a minha interpretação e a dos autores citados, sem contudo a clareza e a pontuação dos múltiplos detalhes que expunham, e que não deixou também de ser uma descoberta, à medida que os lia. Poder ordenar aquilo que eu cria bíblico, a partir da busca pela lucidez e o conhecimento necessários para entendê-lo [em constante oração e leituras bíblicas e teológicas], trouxe-me o desejo de meditar e aprender sobre a soberania de Deus, e de como ele controla o mal segundo os seus santos propósitos. Este foi um momento de muita alegria  e, juntamente com ela, o alívio por não estar sendo apenas um tolo, teimoso ou blasfemo como muitos supunham que eu era.

Quando finalmente tive em mãos o PDF do "Autor do Pecado" [cujos comentários podem ser lidos aqui; e hoje produzido em formato de livro físico], praticamente todas as minhas dúvidas sanaram-se [dentro da minha limitação teológica e intelectual, claro!].

Agora, com “Deus e o Mal” em mãos, penso que se tivesse lido-o anteriormente, e até mesmo antes do Autor do Pecado, a coisa teria sido mais fácil e menos dolorosa.

Interessante que Gordon Clark é chamado de o “Agostinho da América” e, exatamente neste livro, ele diverge e combate a idéia de Agostinho quanto ao mal e o livre-arbítrio. É claro que a alcunha não quer indicar subserviência nem a defesa de todos os princípios propostos pelo Pai da Igreja, até porque, Agostinho, no final da vida, negou alguns pontos que defendera anteriormente [li, não sei onde, que um desses pontos é o livre-arbítrio, mas preciso buscar a fonte].

Ainda mais interessante são os argumentos que Clark advoga, muito parecidos com os que defendi em meus comentários sobre a questão do mal e o livre-arbítrio exposto por Agostinho no livro "Confissões" [e que podem ser lidos acessando o link]. Também, de uma forma mais clara, defendi-os em alguns textos aqui no Kálamos: "A Incoerência do Livre-Arbítrio",  "Mysterium Compatibilista" e "Preso na própria armadilha".

Agora, ao ler "Deus e o Mal", deparo-me com um pensamento muito próximo do que eu mesmo considerei anteriormente; o que novamente reavivou aquela antiga alegria de estar sendo guiado por Deus a utilizar-me mais da razão no trato com o texto bíblico e com livros teológicos. Sem dúvida, Gordon Clark está mil anos-luz ou mais à minha frente, e nem que eu vivesse mais cem anos o alcançaria. Porém, saber que mesmo incipientemente minha mente está sendo renovada diariamente pelo Espírito Santo, em si mesmo já é uma fonte de enorme e viva alegria.

Ao final do livro, posso declarar que, apesar de não ser um grande volume no tamanho, ele o é no seu conteúdo. Clark lançou por terra qualquer ideia de misticismo e irracionalidade na compreensão escriturística, e de que somente podemos fazê-la corretamente se os pressupostos também o forem. A Bíblia se autoexplica, e qualquer apelo fora dela trará apenas confusão, fruto da ignorância e da manipulação de conceitos e termos por parte daqueles que querem afastar-se da verdade.

Chamou-me também a atenção, e já havia percebido em outros textos, o fato de Clark defender a CFW, ou melhor, a interpretação correta da CFW quanto à questão da livre-agência [indicando o erro interpretativo da maioria que a lê]. Eu sempre tive a impressão de que a CFW era compatibilista, não determinista, mas Clark assegura-nos a sua determinação quanto à rejeição de qualquer liberdade do homem que o coloque numa condição de ser livre de Deus.

Ao definir a livre-agência como uma "causa necessária ou secundária", controlada por Deus, para que o homem realize exatamente aquilo que ele decretou eternamente, em que o homem é livre em sua vontade ou volição, mas não nas causas que o levaram a querer aquilo, a coisa toda, que mais me parecia um "artifício" para fugir do determinismo bíblico, tomou outros contornos. Mas é algo que ainda terei de meditar, terei de assimilar e rever, para depois aceitar. McGregor Wright tem a mesma posição de Clark, e Cheung parece diferir dos dois, aproximando-se muito mais do que eu mesmo acredito, de que livre-agência não passa de um termo criado para, ao mesmo tempo afastar-se da expressão "livre-arbítrio' e defender a liberdade humana sem a qual não haveria responsabilidade [os textos que indiquei poderão auxiliar no entendimento do que efetivamente penso].

Um trecho interessante, mais uma exortação à defesa da fé, fugindo do apelo "sensorial" que o humanismo quer prestar ao Cristianismo bíblico, é o capítulo final do livro, intitulado "A crise da nossa era". É um apêndice, talvez não escrito por Clark, mas revelador e profundo, ainda que seja uma pequena peça a analisar o estado em que boa parte da igreja atualmente se encontra.

E tenho para comigo, assim como o subtítulo do livro diz, que o problema está resolvido.

Nota: Mais do que uma crítica ou um ensaio, esta postagem tem o caráter de depoimento, de testemunho. Considerei que devia um agradecimento especial aos dois autores, ainda que não possam me ouvir e ler, e um agradecimento especial ao Felipe, da Editora Monergismo, por ser usado por Deus para publicar esses livros que, de outra forma, provavelmente não chegariam ao leitor brasileiro que não lê em inglês. Esta postagem foi mais uma atitude de gratidão a eles do que qualquer outra intenção. E que venham outras obras de Gordon Clark em português.

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