30 julho 2013

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 49: Autoridade e sustento pastoral - Parte 3




Por Jorge Fernandes Isah


Na semana passada, deixei dois textos para os irmãos meditarem a respeito do sustento pastoral mas, fazendo algumas pesquisas sobre o tema, cheguei à conclusão de que antes das pessoas objetarem o sustento elas objetam a autoridade pastoral e o próprio pastorado. Julguei melhor retornar ao tema e analisarmos as objeções que eles colocam, como, por exemplo, a de que a Bíblia, em momento nenhum, estabelece ou autoriza qualquer liderança na igreja. 

Na verdade, os pressupostos deles é que estão errados, pois partem do axioma de que não há liderança ou autoridade pastoral para, somente depois, irem às Escrituras, tomarem os versículos e darem toda uma interpretação diversa daquela que o texto enuncia; ao ponto de ensinarem que, quando a Bíblia fala que pastores, presbíteros e bispos devem ser honrados dentro da igreja, eles os colocam não como pertencentes a um corpo local, mas como homens que exercem este ministério em qualquer outro lugar, menos na igreja. É como se o pastor tivesse um chamado de Deus não para guiar o seu rebanho, mas para apenas e tão somente evangelizar os incrédulos, trazendo as ovelhas perdidas ao Evangelho e abandonando-as. 

O fato é que a própria Escritura designa uma função específica para aqueles que anunciam e preconizam as "Boas-Novas" aos perdidos, a qual é a de evangelista, e também a de missionário. É claro que essas funções ou ministérios se misturam, de forma que o pastor deve também evangelizar assim como o evangelista pode pastorear, mas é importante ter em mente que a função pastoral está voltada especificamente para o trabalho de apascentar e guiar o rebanho de Deus, ainda que o pastor o seja onde estiver.

Analisaremos alguns pontos da lista de objeções dos detratores do ministério pastoral, e deixaremos as objeções ao sustento pastoral para a próxima aula. 

A primeira colocação, que tem um caráter muito mais danoso e pérfido é o de incluírem o ministério pastoral no rol das heresias. Os irmãos sabem o que vem a ser heresia? Claro que sabem! Mas o significado da palavra heresia é escolha ou opção. No sentido teológico ela aponta para alguém que escolhe um desvio de doutrina ou algo que se opõe à verdade claramente revelada na Escritura; é uma visão equivocada, distorcida, corrompida daquilo que Deus revelou em sua palavra. Portanto, ao ver deles, quando uma igreja ou denominação [que em muitos casos o simples fato de ser igreja ou denominação já a torna em produto do anticristo ou diabólico] reconhece a liderança de um pastor, presbítero ou bispo, ela se enquadraria no grupo daqueles que desprezam a verdade, logo, é herética. O nível de ataque se revela frontalmente contra toda a igreja e toda a tradição da igreja e ao que a Bíblia revela. 

A primeira pergunta que eles não querem responder, e que responderemos, é: o que é um pastor?

É interessante notar que há uma verdadeira frente de ataque ao ministério pastoral por parte de grupos que odeiam toda e qualquer forma organizada de igreja. Eles chegam às raias da irresponsabilidade e da calúnia ao colocarem que a igreja não passa de uma tradição humana e, como tal, guiada por homens [não no sentido como a entendemos, formada por homens que são instrumentos de Deus na realização da sua obra], mas, ao assim procederem, querem dizer que não há nada divino nela, e se não há, a conclusão é lógica, o espírito da igreja tem a procedência maligna. Contudo, estranhamente, eles se apegam a escritos e ditos de homens que se organizam em grupos para defenderem suas ideias. Ora, por que a igreja milenar é um conceito falso, mas suas organizações muito mais recentes, cujos líderes são indivíduos que impõem, de certa forma, seus ensinamentos a outros homens, não é? Se igualmente formam um corpo de doutrina, e são doutrinados e doutrinadores? Uma pergunta que os líderes e seguidores desse movimento dos “sem-igrejas” não querem responder, um tanto por má-fé e orgulho e presunção, e outro tanto por ignorância mas também orgulho e presunção; porque os princípios que os norteiam são meramente especulativos, inferências, as quais não são moldadas pelo texto bíblico, mas tentam força-lo a calar-se no que diz e a dizer o que não diz. O que me leva a concluir que o espírito que os norteia não procede de Deus e tem origem no inimigo do homem, ao qual consideram um amigo, ainda que inconscientemente. 

Mais vergonhoso ainda é que as suas críticas partem exatamente da experiência, ou melhor, de um tipo de experiência fragmentada daquilo que veem na sociedade ou foi dito dela, daquilo que a falsa igreja se esmera em exibir, como se fosse a totalidade da igreja ou como se todas as experiências estivessem contidas nela. Criam um estereótipo no qual colocam todas as denominações e todas as organizações eclesiásticas como se fossem uma, numa espécie de unidade indistinguível. Desta forma, torna-se mais fácil associar os erros e desvios e pecados da falsa igreja e a doutrina espúria do falso evangelho como se fossem todas uma mesma concepção, guiadas pela mesma doutrina e motivação. É a arte de confundir para iludir, de espalhar uma mentira esperando que ela se torne verdade. Não dá para esquecer que a igreja é alvo do inimigo desde o princípio, e ele “levantou” muitos dos seus servos, e ainda os levanta, não para coibir o erro ou denunciá-lo [e muitos incautos se iludem com essa falsa piedade], mas para fazer parecer que toda a igreja está corrompida e que apenas alguns “iluminados” conhecem-na verdadeiramente e estão aptos a julgá-la. Mas, de onde vem a sua autoridade? Quem a outorgou?

Os ataques são autocontraditórios ao acusar-nos exatamente daquilo que eles mesmos fazem e não percebem fazer. Eles partem do princípio de uma autoridade, não investida por Deus, mas por cada um deles, uma autoridade ou muitas autoridades humanas, cujos pensamentos são endossados por um grupo cada vez maior de pessoas que não percebem estarem sendo fisgadas pela mesma rede que julgam denunciar: o grito em alto e bom som de que nenhuma liderança é bíblica, mas, afinal, como eles convivem com seus líderes? Ou apenas eles seriam bíblicos? 

Muitas de suas afirmações não são somente desrespeitosas e ofensivas, mas atentam à soberania de Deus, à autoridade de Deus sobre a igreja; e não poucos são unitaristas, combatendo a Trindade, de forma que fica evidente o propósito dos seus ataques à autoridade eclesiástica, o que é algo muito maior do que simplesmente aparenta ser: querem a desagregação da igreja e a demolição da fé cristã. Porque mantendo o homem afastado da igreja, que chances ele tem de estar próximo de Deus? [1]. Como o Senhor Jesus disse, éramos ovelhas sem pastor, sem direção, e é o que esses “cristãos” desejam perpetrar. 

Devemos notar que, apesar de haver uma pequena diferença entre os termos pastor, presbítero e bispo, em linhas gerais, a Bíblia os trata como aquele homem capacitado por Deus e designado pela igreja para cuidar, zelar, apascentar e proteger o rebanho do Senhor, buscando aquelas que se encontram desgarradas e trazendo-as para o aprisco, não abandonando-as, mas cuidado delas. Dentro deste contexto, a referência máxima do que significa “pastor” está em João 10, quando o Senhor se nomina "o bom pastor"; mas será o Senhor o único pastor? Será que Deus não instituiu na igreja homens que fossem responsáveis por preservar o seu ensinamento? Que guiassem o seu povo no Evangelho? E que guardassem a sã doutrina? Não há exemplos deles na Escritura?

Apontarei alguns versículos que tratam do tema, com uma pequena explicação. Quem desejar saber mais sobre o assunto, ouça o áudio desta aula, onde todos estes e outros pontos são abordados com maior exatidão. 


Em Ef 4.11, Paulo diz que Cristo deu “uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para pastores e doutores”, para edificação do corpo. Ele deu à igreja pessoas as quais qualificou para o aperfeiçoamento e induzindo ao bem e à virtude os santos.

Atos 20.28: É Deus quem constitui os bispos para apascentar o rebanho de Deus;

1Tm 4.14: O presbítero ordenava, através da imposição de mãos, o ministro pastoral;

At. 14.23: Os anciãos eram eleitos pela igreja [assim como foi a igreja quem elegeu Matias para o lugar de Judas no apostolado];

At 16.4: Não somente os apóstolos, como querem parecer alguns, mas também os anciãos tinham a incumbência de estabelecer decretos e normas para as igrejas;

Tt 1.4: Os presbíteros eram estabelecidos de cidade em cidade;

Tt 1.5-9; 1Tm 3.1-10: Tinham de atender a certas qualidades para serem líderes na igreja, sem as quais, ninguém podia ser candidato ao episcopado.


Notas: [1] Com isso não estou afirmando que todos na igreja estão próximos de Deus. Sabemos que há o joio, e de que o joio foi semeado pelo inimigo, mas fora da igreja, como a Bíblia diz e já estudamos, o homem não está sob a proteção divina.
[2] Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico.
[3] Baixe o áudio desta aula em   Aula 47b - Autoridade Pastoral III.MP3

23 julho 2013

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 48: Autoridade e Sustento Pastoral - Parte 2



Por Jorge Fernandes Isah


Continuando o nosso estudo sobre a biblicidade da autoridade e do sustento pastoral, primeiramente, façamos um esclarecimento: Não sou pastor, seminarista, nem recebo salário da igreja da qual sou membro.

Segundo, muitos dirão: "Veja quantos pastores profissionais existem, que sugam tudo o que podem dos fiéis, extorquindo-os com falsas promessas de bênçãos enquanto se empanturram de dinheiro, gastando-o da forma mais mundana possível, em bens materiais e suntuosidade". Reconheço, é verdade. Há muitos líderes que "vendem" o Evangelho, tratando-o não menos que um produto rentável. Mas isso representa dizer que todos são mercenários? Que estão buscando o que lhes é próprio ao invés da glória de Deus? Não! E a despeito de todos os falsos mestres (os quais estão sob a ira de Deus), a Bíblia exorta a igreja a suprir as necessidades dos que pregam a palavra.

Terceiro, nossa igreja é pequena e de poucos recursos; auxiliamos o nosso pastor em seu sustento, contudo, ele trabalha secularmente seis dias por semana, 10 horas por dia, para suprir as necessidades de sua família. E percebo que se ele fosse um pastor de tempo integral dedicado à igreja, tanto os membros como os trabalhos evangelísticos seriam fortalecidos.

Quarto, não quero generalizar, mas, normalmente, os que atacam o sustento pastoral são aqueles que se acham dignos de serem crentes, desde que não tenham de sacrificar nenhuma parte dos seus bens. De certa forma, o que move os "mercadores da fé" é o mesmo que os move: a avareza, o amor ao dinheiro.

Quinto, há os que tentam espiritualizar o que não é espiritual. O Evangelho de Cristo é espiritual, porém, proclamado fisicamente pelo pregador, pela impressão de Bíblias (por mãos incrédulas, muitas vezes), em suma: por meios humanos. Tentar provar que a pregação do Evangelho não é trabalho (seja remunerado ou não) é contradizer o próprio tratamento dado à questão por Jesus (Jo 4.38, 5.17), e Paulo (1Co 3.8, 15.58; Cl 1.29; Hb 6.10).

Feito os esclarecimentos, analisemos alguns versículos que tratam do assunto:

1) "Quem jamais milita à sua própria custa? Quem planta a vinha e não come do seu fruto? Ou quem apascenta o gado e não se alimenta do leite do gado?" (1Co 9.7).

O que o apóstolo está dizendo? Aqueles que pregam o Evangelho que vivam do Evangelho (1Co 9.14). Paulo reinvindica o direito de ser sustentado em seu ministério pela igreja. Como afirma: "Ou só eu e Barnabé não temos direito de deixar de trabalhar?" (1Co 9.6). Provavelmente os coríntios acusavam Paulo de "mercadejar" o Evangelho, de procurar o benefício próprio, de pregar o Evangelho por motivos mundanos. Porém, revela-lhes que tanto ele como os demais apóstolos têm o direito de terem o sustento para si e suas famílias, e de que essa responsabilidade cabe à igreja (1Co 9.4-5). Não é o que parece ao afirmar "Esta é minha defesa para com os que me condenam" (1Co 9.3)? E "Digo eu isto segundo os homens?" (1Co 9.8). Ao que arremata: "Ou não diz a lei também o mesmo?" (1Co 9.8).

Paulo prossegue a argumentação protestando que, aquele que lavra e debulha (ou seja, aquele que trabalha), lavra e debulha com esperança de ser participante (1Co 9.10). E continua: "Se nós vos semeamos as coisas espirituais, será muito que de vós recolhamos as carnais?" (1Co 9.11). O apóstolo declara que esperava colher muito menos dos coríntios do que lhes tinha dado, mas ainda assim, esperava obter o necessário para a sua subsistência.

A sequência à qual Paulo expõe o seu pensamento é extremamente lógica, e impossível de não entendê-la, a menos que seja lida com premissas falhas. É o que muitos dirão, justificando-o com o v. 12: "Se outros participam deste poder sobre vós, por que não, e mais justamente, nós? Mas nós não usamos deste direito; antes suportamos tudo, para não pormos impedimento algum ao evangelho de Cristo".

Atentamos que o verso fala de um "direito" que o apóstolo possuía, o qual era o de ser mantido pela igreja. Porém, diante das dúvidas levantadas pelos coríntios, e da própria resistência da igreja em ajudá-lo, ele não "usou" esse direito, para que a descrença dos coríntios não aumentasse, e fosse "impedimento" para a proclamação do Evangelho. Dizer que Paulo censurou os ministros que são sustentados pela igreja é distorcer completamente o sentido daquilo que ele próprio diz.

Resumindo: Paulo não pregava o Evangelho por causa das recompensas, por aquilo que a igreja iria lhe dar; ele pregava o Evangelho por amor a Cristo e aos eleitos (2Tm 2.10), contudo, esperava que, como igreja, os irmãos suprissem as suas necessidades.

2) "Outras igrejas despojei eu para vos servir, recebendo delas salário; e quando estava presente convosco, e tinha necessidade, a ninguém fui pesado" (2Co 11.8).

Qual de nós, vendo o irmão em necessidade, vira-lhe as costas? Foi o que os coríntios fizeram em relação a Paulo. E ele os exorta com tristeza, sabendo que negligenciaram o seu compromisso para consigo; porém com o nítido objetivo de não somente apontar-lhes o erro, mas de levá-los ao arrependimento e correção. Senão, por que tocar no assunto?

Há quem entenda que Paulo está condenando os que recebem salário, como alguém que é "pesado" à igreja, um usurpador (ao contrário, o que ele diz dos coríntios é que suas atitudes eram usurpadoras, eles é que "roubavam" dos macedônios ao receber o Evangelho de graça, sem nenhum sacrifício).

É claro que há casos e casos. Aqueles que se utilizam da posição de liderança no ministério para o enriquecimento, a abastança material, o deleite carnal, o consumismo desenfreado, e o apego sórdido ao dinheiro (seja pastor ou não) comete pecado, e é injusto. Em outras palavras, quem age assim sequer é convertido. Porém, o fato de muitos agirem desta forma (e, infelizmente, parece que o pastoreio se tornou num novo "toque de Midas" o qual transforma tudo o que põe a mão em ouro), não representa que o princípio da subsistência ministerial seja antibíblico.

Novamente, Paulo escreve aos coríntios dando-lhes "um puxão de orelhas", entre outras coisas dizendo que eles deveriam agir e viver como igreja. Havia muita divisão entre eles, muito sectarismo; e para a sua tristeza, especialmente por que plantara a igreja, eles o desprezavam em detrimento aos falsos apóstolos (2Co 11.1215) os quais, certamente, eram os que o caluniavam junto ao povo.

Ele defende-se de que, em nada é menor do que os demais apóstolos e, portanto, tem o mesmo direito que os demais tinham, inclusive o de viajar com sua família, como Pedro fazia (2Co 11.5). Mesmo solteiro, Paulo reivindica esse direito, o de constituir uma família e poder viajar com ela no seu ministério.

Temos de entender que o fato de Paulo pregar de graça aos coríntios, e os coríntios o receberem sem se preocupar com as suas necessidades, é motivo de glória para o apóstolo e de "desglória" para a igreja de Corínto, ainda que isso não os impediu de serem abençoados pela pregação do Evangelho. É o que ele diz: "Pequei, porventura, humilhando-me a mim mesmo, para que vós fôsseis exaltados, porque de graça vos anunciei o evangelho de Deus?" (v. 7).

À frente, no capítulo 12, vem-nos a confirmação: "Pois, em que tendes vós sido inferiores às outras igrejas, a não ser que eu mesmo vos não fui pesado? Perdoai-me este agravo... Eu de muito boa vontade gastarei, e me deixarei gastar pelas vossas almas, ainda que, amando-vos cada vez mais, seja menos amado" (2Co 12.13,15 - grifo meu). Parece-me que Paulo coloca os coríntios em pé de igualdade com as demais igrejas, a não ser pelo fato dele não ter sido "pesado" a ela. Em outras palavras, os coríntios estavam numa posição "inferior", em débito, por não terem com essa beneficência demonstrado "amor" ao apóstolo. É assim que Paulo os retrata: enquanto o seu amor por eles aumentava a ponto dele se sacrificar para pregar-lhes o Evangelho (o que implica em passar necessidades), a igreja de Corinto não se dispunha a auxiliá-lo em seu sustento, como prova de amor.

No fim das contas, o que importa é isso: o amor a Cristo e Seu Evangelho, o que resulta em obediência. 

Apêndice: De certa forma, o mesmo sectarismo que Paulo aponta entre os coríntios, vemo-lo hoje. A Igreja está tão dividida, inclusive pelos que pregam unidade, pelos sem "placas" nem "nomes", pelos que se julgam filhos "exclusivos" de Deus, pelos que se consideram "libertos" mas estão presos ao pior farisaísmo existente, e acabam por se esquecer do principal: pregar o Evangelho de Cristo crucificado (1Co 2.2).

Perdemos tempo com "outros" evangelhos, e negligenciamos o que realmente importa. Com isso, não quero jogar para "debaixo do tapete" os problemas da igreja, muito menos pregar o evangelho ecumênico. Longe de mim cometer estes pecados. Mas, se ao invés de gastar o precioso tempo de que dispomos tentando "corrigir" os erros de outras igrejas e denominações, preocupássemos conosco, nossos irmãos e igreja certamente estaríamos "salvando" a nós mesmos e aos nossos queridos... Um minuto! Não confunda uma frase hiperbólica com salvação de verdade, a qual apenas o nosso Senhor Jesus Cristo é capaz de realizar. Quero dizer é que, nos preocupamos em "salvar" os outros (pelo menos nos enganamos com essa idéia), quando na verdade o nosso objetivo é "revelar" o quanto estão errados e desviados do caminho; e assim nós mesmos acabamos nos desviando do caminho, substituindo o amor pelo legalismo, a mera acusação, e a autoexaltação. E, por favor, não confundam essa declaração com a condenação à disciplina bíblica, pois a disciplina é atributo da igreja, do corpo local, e não de irmãos isolados que falam por si só, como se fossem a própria voz de Deus (estes, se forem eleitos, são alvos da disciplina divina).

Deus levantará segundo a Sua santa vontade irmãos que farão o trabalho apologético, defendendo a fé bíblica apontando o erro daqueles que são antievangelho, e mesmo dos cristãos que "deslizaram" em um princípio ou outro. Mas, infelizmente, o que acontece é que, de uma hora para a outra, a maioria se arrogou e arvorou apologista, e saiu "atirando" para todos os lados, como uma metralhadora descontrolada.

Enquanto isso, sorrateiramente, o diabo planta dentro do corpo local suas heresias, mas como nossos olhos estão voltados para os erros alheios (de outras denominações e outros irmãos denominacionais, cuja disciplina não está ao nosso alcance), permitimos que a nossa omissão e desleixo corrompa-nos também.

O pior é que muitos nem sequer participam do corpo local, acreditando num cristianismo solitário e individualista, numa clara rebeldia aos princípios bíblicos que dizem defender. No fundo, se consideram superiores e melhores do que os mandamentos de Cristo; e sentam-se confortavelmente em suas torres de observação, desprezando-a, ridicularizando-a, pois sequer passa-lhes pela cabeça submeter-se à autoridade com que o Senhor investiu-a.

São "livres" para bater à vontade, contudo, esquecem-se de que, caso sejam eleitos, a mão disciplinadora de Deus está sobre eles. Se não forem, não há disciplina, mas a condenção eterna os aguarda.

A melhor forma de se pregar o Evangelho de Cristo é pregando o Evangelho de Cristo, e não combatendo o antievangelho. Qualquer um pode combater (pois nem mesmo argumentos precisa-se ter, apenas vontade, disposição), mas poucos são capacitados a viver o Evangelho, pois para isso é preciso ser convertido por Cristo, regenerado e lavado no Seu sangue.

A melhor forma de se lutar contra a fraude e a heresia é expondo a verdade bíblica. De nada adianta refutar a heresia se não se obedece aos mandamentos do Senhor, e assim fazendo-o, demonstra não amá-lO (Jo 14.15) e, "em vão, porém, me honram, ensinando doutrinas que são mandamentos de homens" (Mc 7.7).

Portanto, é urgente que antes de se entrar numa "caça às bruxas", que se viva o Evangelho, testemunhando a Cristo nosso Senhor. Fim do apêndice. 

Finalizando, transcrevo mais uma vez as palavras do apóstolo Paulo: "Os presbíteros que governam bem sejam estimados por dignos de duplicada honra, principalmente os que trabalham na palavra e na doutrina; porque diz a Escritura: Não ligarás a boca ao boi que debulha. E: Digno é o obreiro do seu salário" (1Tm 5.17-18); porque "se alguém também milita, não é coroado se não militar legitimamente. O lavrador que trabalha deve ser o primeiro a gozar dos frutos. Considera o que digo, e o Senhor te dê entendimento em tudo" (2Tm 2.5-7).

Timóteo ouviu.

E, nós?
Nota: 1- Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico 
2 - Baixe este áudio em Aula 47 A.MP3

15 julho 2013

Voltando de onde me desviei



De Jorge Fernandes Isah

Estou a descobrir um novo estágio no qual alguns cristãos estão se estabelecendo, e muitos já se fizeram mestres: o da auto-vitimização. Quer dizer que se criticar pode, mas ser criticado não pode?... Engraçado, se não fosse trágico. É o caso de se usar dois pesos e duas medidas; do pimenta nos olhos dos outros é refresco.

Porém há algo por trás disso tudo, a necessidade de se ser aceito, e a crítica ou exortação significar em rejeição. Para eu agir com amor, ao ver deles, tenho de contemporizar e fazer vistas-grossas ao erro. Mas ao que me consta, a Bíblia nos chama à responsabilidade de exortar uns aos outros, como adultos e maduros na fé, como responsáveis uns pelos outros, e como prova de amor fraternal, que no fim das contas é o amor que Cristo tem por sua igreja. Acontece que o papel de vítima, agir como um bebê mimado e choroso, é mais fácil e esconde da própria pessoa as camadas de erros que ela não quer ver, nem quer que os outros vejam. E o problema se agrava, pois vai trazendo um endurecimento, uma espécie de recalcitração, em que tudo me é permitido, convindo ou não, e ao outro nada, além da indiferença e do desprezo. No fim das contas, vai-se criando uma teia de desculpas, em que os fatos são grosseiramente distorcidos, jogados para debaixo dos tapetes, levando a pessoa a dar vasão à sua completa incapacidade de lidar com os problemas, em que a vitimização acaba por impedi-la de reconhecê-los e de enfrentá-los.

Outro ponto, é que falta maturidade para se tratar com essas e outras questões, e digo maturidade em todos os sentidos, moral, intelectual e espiritual. Todo mundo anda melindrado demais, meio paranoico, vendo cavalo com chifres onde não se tem. Anda-se muito em voga fazer "tempestade em copo d'água", como se as coisas nos afetassem além da conta, ganhando dimensões catastróficas, o que é tratá-las com uma super-importância e o super-poder de nos atingir que elas não têm. Quando hiperbolizamos sentimentos e situações, nossas reações também se tornam exageradas, ao extremo, e fugimos da realidade, criando para nós um outro tipo de "realidade", o que acaba por nos afastar de Deus, do próximo e de nós mesmos, ainda que nós e muitos dos "próximos" acreditemos que todo esse extremo é real.

Novamente, a imagem que me vem é a de crianças mimadas e despreparadas. E boa parte da culpa está nas pessoas ao redor que não vêm o que está acontecendo ou não querem ver; se vêm, fingem-se de cegas. Isso é amor? Isso trará crescimento? Até quando daremos tapinhas nas costas dos outros, vendo-os se destruírem? Ou caminharem para o inferno? Não sei, mas penso que a nossa geração tem sido omissa, individualista e covarde em vários aspectos. Cria-se uma redoma, e colocamos nelas pessoas como se fossem animais em exibição: vemos, mas não as tocamos, porque não queremos ou porque tememos; mantendo-as em um mundo entrópico

De certa forma, alguns nichos no meio cristão andam agonizando e, para piorar a situação, pensam que são os salvadores da pátria, que a solução está exatamente na agonia. Na verdade, a vida cristã é bem simples, mas requer algo difícil demais para os homens: a submissão, em nome do amor, o que na maioria das vezes significa humilhar-se. Por isso somos tão rudes, mal-educados, presunçosos, egoístas e soberbos, sempre dispostos a virar a mesa, a botar para quebrar; queremos autonomia, mas uma autonomia que não se aceita no outro, pois o que se quer é tê-lo como um satélite a orbitar ao nosso entorno. E aí está o grande problema: ser coerente com um discurso que somente é possível enquanto se fala, mas jamais quando se ouve.

Temo por parte da igreja, com toda a sua panaceia, a ministrar placebo aos seus membros, seja acreditando na sua eficiência, seja ministrando-a dolosamente. O resultado será sempre crentes fracos, sofrimento, dor e... tapinhas nas costas. Com isso não digo que temos de ter respostas para tudo, nem responder a tudo, mas jamais dizer aquilo que nós mesmos não queremos ouvir. Se não é bom para nós, por que tem de ser bom para o outro? Se não aceito, por que o outro deve aceitar? Por isso, cada vez mais, temos cristãos com discursos inflamados, soluções debaixo da manga, críticas a torto e a direito, onde a piedade existe apenas como prova de amor próprio, mas quanto ao outro, soterrou-na o orgulho.

E as experiências com muitos crentes acabam por torná-las tão ou mais difíceis do que com incrédulos, que muitas vezes revelam um caráter mais humilde, tão necessário à conversão quanto a uma vida cristã verdadeira. E fico a me perguntar: por que eu e você somos tão orgulhosos? Por que chegamos a esse ponto? 

Não será porque acreditamos que já chegamos lá [ainda que não assumamos publicamente a nossa perfeição], enquanto desprezamos os sinais no meio do caminho e embrenhamo-nos perdidos no mato?

De minha parte, voltarei léguas e léguas, se necessário, para retomar o caminho do ponto onde Cristo me disse: "Vem!". E eu fui.


Nota: Começou como um texto cujo alvo eram os outros, e acabou acertando em mim, ou seja, a carapuça serviu.

27 junho 2013

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 47: Autoridade pastoral - parte I



Por Jorge Fernandes Isah


Dando sequência ao nosso estudo sobre a igreja, analisaremos o aspecto da autoridade e sustento pastoral. Neste estudo, já falamos sobre vários pontos da igreja verdadeira e as marcas que ela detém, inclusive, a sua autoridade sobre o crente. Apesar desta doutrina ser extensamente descrita na Escritura, há cristãos que não a reconhecem, e, por isso, desprezam-na. O que está ligado mais ao individualismo e à autossuficiência do homem moderno [o qual tolamente se acha "senhor de tudo" e autoridade final] do que da sua não expressividade canônica. Vivemos tempos em que os crentes encontram-se tão ou mais rebeldes do que os mundanos, acreditando em uma liberdade capaz de prescindi-los de qualquer autoridade, ainda que muitos digam reconhecê-la em Cristo, mas rejeitam-na completamente ao desconsiderar a autoridade que ele deu à igreja e aos seus ministros; o que acaba por levantar a seguinte dúvida: se não reconhecem a autoridade eclesiástica que veem, como reconhecerão a Cristo que não veem? Eis a questão!

Iniciemos então pelos versos de 1Ts 5.12-13: "E rogamo-vos, irmãos, que reconheçais os que trabalham entre vós e que presidem sobre vós no Senhor, e vos admoestam; e que os tenhais em grande estima e amor, por causa da sua obra. Tende paz entre vós". 

A palavra "presidir" significa “estar à frente”, “governar”, “superintender”, mostrando uma qualidade de liderança, comando, de alguém que tem autoridade sobre outro(s), que os direciona, levando-os à obediência e ao cumprimento de determinadas ordens. Interessante frisar que a obediência do crente em relação ao seu pastor ou presbítero é a mesma a qual o pastor e presbítero devem estar sujeitos, a qual é a autoridade da igreja; e, por isso, não é possível que eles ordenem ou orientem um ou mais membros a agirem divergentemente das deliberações do corpo local. É uma via de mão-dupla, na qual o pastor e presbítero são aqueles que primeiro devem proteger as resoluções que a igreja deliberou e não transtorná-las. Não há lugar para o despotismo ou a autoridade à revelia do corpo local, pelo contrário, a autoridade pastoral se fundamenta no poder com o qual o Senhor investiu a sua igreja, e a ela está sujeita.

Apenas como um adendo à nomenclatura, já que utilizo termos correlatos e que em algumas denominações referem-se a funções distintas, creio que os vocábulos, bispo, pastor e presbítero são sinônimos e significam, de maneira geral, a posição daquela pessoa madura e experiente na fé capaz de guiar e alimentar o rebanho do Senhor. Os oficiais da igreja governam não para si mesmos, como dito, nem a partir de autoridade própria, mas da autoridade investida por Deus, como servos [1Pe 5.1-4, conf Mt 20.26-27].

E a prova maior de que nada do que estamos dizendo é falso, baseia-se no fato de o próprio Deus, através do seu Espírito Santo, dar esses dons à igreja. É o que Paulo nos diz em Efésios 4.10-13: "Aquele que desceu é também o mesmo que subiu acima de todos os céus, para cumprir todas as coisas. E ele mesmo deu uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para pastores e doutores, querendo o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para edificação do corpo de Cristo; até que todos cheguem à unidade da fé, e ao conhecimento do Filho de Deus, a homem perfeito, à medida da estatura completa de Cristo".

Deus deu a alguns membros da igreja funções e ministérios especiais, de forma que nem todos estão num mesmo nível funcional, numa igualdade de atribuições, o que não pode ser nem significa inferioridade ou superioridade espiritual de um membro sobre o outro. Se entende-se a questão como uma mera disputa de poder, em que um pode mais sobre o outro, a coisa deixa de ser espiritual para ser essencialmente carnal. Afinal, todos são servos do mesmo Senhor, e o que nos diferencia é o dom que o próprio Deus entregou a um e não a outro, e que entregou a outro e não àquele. Parece, contudo, que o pastor, bispo ou presbítero são os alvos mais adequados para os insubordinados, que chegam ao extremo de desqualificá-los, menosprezá-los e até alegando a antibiblicidade de seus dons. Ora, se não são bíblicos, por que a Escritura se esmera em designá-los, descrevê-los e qualificá-los? O fato de haver falsos pastores e mestres serve de negação para que não sejam reconhecidos os pastores verdadeiros e que temem ao Senhor, servindo-o? Em quê a quantidade daqueles que não honram o seu ofício e, em muitos casos, são servos de satanás, anula a biblicidade do ministério e autoridade pastorais? Com a palavra, os detratores...

O que Paulo exorta-nos é, ao contrário, reconhecer a autoridade pastoral, não como algo a ser realizado por soberba, orgulho ou vaidade, mas reconhecendo que o pastor ou presbítero é aquele que serve mais humildemente dentro do corpo local. É por isso que atitudes como a de crentes que difamam e denigrem o dom pastoral, de maneira genérica, agem com soberba e orgulho muito superiores à que afirmam denunciar. De forma irresponsável e insana querem colocar todos no mesmo balaio em que deveriam estar alguns. No fundo, toda essa empáfia serve apenas para desculpá-los diante de si mesmos, demonstrando, via de regra, desdém para com a igreja e o Evangelho, e um ensimesmamento, em que o intento é a glória do próprio umbigo.

A alegação de que tratam é que, se a maioria dos pastores está preocupada com os seus próprios interesses, conclui-se que todos os pastores também estão; se a muitos roubam, todos são ladrões; se há farsantes, todos são impostores. Isso é de uma arrogância sem par! E de uma leviandade ainda mais diabólica, nada condizente com a vida cristã. Alegam-se oniscientes a ponto de mapearem todo o universo eclesiástico, condenando-o, sem saírem de suas poltronas. Têm por fato algo que não passa de especulação; e por direito algo que não foge de uma reivindicação. É por isso que a Bíblia zelosa e sabiamente detalha em minúcias quem está apto e quem não está ao ministério pastoral. Infelizmente, há aqueles que querem os holofotes sem que tenham o chamado de Deus. Há os que nem mesmo são convertidos, ou os que são declaradamente ímpios em suas atitudes e desregramentos. Porém, nada disso invalida o dom dado por Deus. E ele se preocupou em evitar que tais trapaceiros se instalassem no seio da igreja. Paulo em 1 Tm 3:1-7 e Tt 1:5-9, adverte para as qualidades que um pastor, presbítero ou bispo devem ter, e o cuidado necessário para que a igreja decida-se em alçá-los a esses postos. E as características, como indicativas de um chamado divino, são reveladas exteriormente, de forma que qualquer um possa vê-las, percebê-las e confirmá-las. Paulo nos dá uma lista de distintivos que não são subjetivos, mas claramente objetivos e assinaláveis. Especialmente que ele não seja neófito, "para não se ensoberbecendo-se, não caia na condenação do diabo" [1Tm 3:6]; a maturidade espiritual e a experiência na vida cristã devem ser pontos fundamentalmente analisados pela igreja para sancionar um líder. E isso não nos remete, necessariamente, à questão da idade, pois há jovens muito mais maduros que velhos, ainda que, cronologicamente, espera-se que um velho seja mais sábio que um moço.

A questão é que o erro está, na maioria das vezes, no pouco zelo com que a igreja estabelece seus líderes. Há casos em que um ministro é chamado à liderança sem que preencha correta e adequadamente os princípios estabelecidos pela Escritura para assumi-la. Indicações e até mesmo a excelência acadêmica [graus e títulos que ele tenha] falam mais do que a sua vida cristã. Prima-se hoje mais por um diploma teológico do que pelo testemunho cristão. Com isso não estou desmerecendo o estudo, e, sobretudo, o esforço de quem estudou anos para obter uma designação acadêmica. Mas ela não é tudo, e muitas vezes torna-se em nada, dada as inúmeras heresias que campeiam entre seminários e faculdades teológicas, além de um desprezo a Deus e sua palavra, e o próprio fato de alguns estarem no ministério sem chamado, santidade, zelo, e, mesmo sem conversão. O que me leva a defender severamente a formação de líderes no âmbito da igreja, dentro da própria igreja, primeiramente para que o seu chamado seja confirmado por ela, segundo, para que o testemunho do candidato, no decorrer dos anos, sirva de "certificado" para o cargo, e, terceiro, para que ele seja conhecido de todos os membros, e ele os conheça igualmente. Mas este é outro assunto, para outra hora...

Voltando ao ponto central, da autoridade pastoral, leiamos Hb 13.17: “Obedecei aos vossos guias e sede submissos para com eles; pois velam por vossa alma, como quem deve prestar contas, para que façam isto com alegria e não gemendo; porque isto não aproveita a vós outros.”

A expressão "guias" fala daqueles que vão à frente e conduzem o rebanho, nitidamente dando-nos a ideia de liderança, daqueles que exercem o cuidado das almas, dos membros do corpo local. Mas, com isso, se quer dizer que há um grupo de irmãos que "fazem" o trabalho de Deus e outro que somente assiste? Não! Ao menos, nunca devia ser assim. Uma igreja que age dessa forma não entende o seu papel, nem compreende a obra que tem de realizar. Uma igreja assim é presa fácil para homens astutos, os lobos vorazes e cruéis que desejam destruir o rebanho, conforme Paulo descreveu em Atos 20.29. Devemos nos lembrar de que uma igreja bíblica não se constitui de um grupo de irmãos ativos e um grupo de irmãos passivos, aqueles controlando estes e estes, simplesmente, submetendo-se ao controle daqueles: “pelo contrário, cooperem os membros, com igual cuidado, em favor uns dos outros” (1Co 12.25). Isso é sabedoria, que vem dos céus, para a glória de Deus.

Continuaremos, na próxima aula, analisando a biblicidade da autoridade pastoral.

Notas: 1 - Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico;
2 - Para maior consideração e detalhes, ouça o áudio da aula;
3- Baixe esta mensagem em aula 47.mp3

16 junho 2013

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 46: "Uma marca cristã desprezada"


Por Jorge Fernandes Isah



A Bíblia aponta-nos vários dos nossos deveres como cristãos e como membros do corpo local:

- Orar uns pelos outros [Tg 5.13-16];

- Exortar e edificar uns aos outros [1Ts 5.11, Hb 3.12-14] - Exortar é uma palavra que traz vários significados, como: Aconselhar, persuadir; animar, encorajar, incitar; sempre em relação à uma vida de fé genuína e santa ao serviço de Deus;

- Levar as cargas uns dos outros [Gl 6.2];

- Sujeitar-nos uns aos outros [Ef 5.14-21].

Estes são princípios estabelecidos por Deus para que o seu povo caminhe em unidade e santidade, cumprindo o mandamento do Senhor de amar ao próximo como a si mesmo. Na verdade, o ensino que temos é até superior, de amar o próximo mais do que a nós mesmos, pois foi assim que Cristo agiu ao entregar-se por nós. Ele nos amou com um amor superior, levando-o à cruz para que fôssemos libertos do pecado e condenação, a morte eterna e definitiva. Devemos ter em mente sempre o outro, especialmente o irmão, caminhando com ele, lado a lado, em meio às tribulações, tristezas, sofrimentos e dores que o mundo nos infringe, sustentando-nos mutuamente. Por isso somos admoestados a orar, exortar, instruir-nos reciprocamente; a carregarmos os fardos duros e pesados uns dos outros, de forma que ele se torne mais leve para o irmão, o qual também auxiliar-nos-á a diminuir o peso das nossas cargas.

Sabemos que é pelo poder de Cristo, por sua bondade e misericórdia, que recebemos o consolo e o alívio nas atribulações, pois, sem ele, nada seríamos ou poderíamos realizar. Contudo, é estimulante saber que os irmãos se interessam pelo nosso sofrimento e dores, e esteja, cada um segundo o dom que o Senhor dá, disposto a reconhecê-las como também suas, já que os membros colaboram, cada um, para o bem do corpo. Creio que o Senhor nos deu essas orientações para não nos preocuparmos além da conta, além do necessário, com os nossos problemas, também. Este é o caráter pedagógico do auxílio, não nos deixar entristecer exageradamente, mais do que a tristeza convém e, de certa forma, alegrar-nos no zelo e sustento para com o irmão aflito [parece contraditório, mas o sofrimento do outro pode nos "tirar" do círculo vicioso em que muitas vezes nos encontramos, em meio aos problemas triviais e corriqueiros do dia-a-dia. E a nossa tristeza com a aflição alheia pode tornar-se na alegria dele, de não se reconhecer sozinho e abandonado em sua luta, fortalecendo-o, de forma que ele também nos fortalecerá. Na física esse princípio seria chamado de "lei da ação e reação", em que o amor e a piedade atribuídas retornam-nos de forma equivalente].

Acredito que esses são pontos que não suscitam muitos debates, gerando divergências. Normalmente são esquecidos ou relegados ao nível do desinteresse, seja por considerá-lo algo trivial, reles, sem muita importância, ou por certa soberba de se achar que já o alcançou e de que as etapas a serem vencidas são outras. Ledo engano! Em um mundo cada vez mais individualista e rebelde, a igreja também tem se individualizado e se rebelado contra os preceitos divinos. Igualmente, cada vez mais, os crentes se consideram autônomos e donos dos seus narizes, de forma que o sustento, auxilio e piedade se tornam escassos, quase invisíveis. Não que devemos alardear aos quatro cantos o auxílio ou consolo ou sustento que devotamos ao próximo, mas é que o próprio estado de coisas tem revelado o quão distantes estamos de viver uma vida verdadeiramente cristã, aos moldes bíblicos. Quase ninguém se interessa mais por uma prática cristã, no sentido de fidelidade à Escritura e de dar os frutos que o Espírito produz no homem regenerado. Os holofotes estão ligados e cada um quer a sua porção de luz, sem se preocupar em ser ele próprio a luz. Muitos reduzem a vida cristã a falar de Cristo para as pessoas, e eu já vi incrédulos repetirem versículos, referirem-se a Jesus, como muito crente não é capaz de fazer. Mas, então, tem-se um detalhe: ele fala bem, até mesmo com probidade e correção, mas a sua vida pessoal não espelha sequer um milímetro do que diz. E é este o ponto principal do qual não podemos nos esquecer, e do qual o Senhor alertou-nos: pode uma árvore má dar frutos bons e vice-versa? [Mt 7.17-20].

A parábola dos talentos assevera mais fortemente este ponto [Mt 25.14-30 cf. Lc 12.42-48]; no sentido de que somos mordomos do que Deus nos dá, e quanto mais ele nos dá, mais devemos honrá-lo, produzindo os frutos proporcionais à sua dádiva. Ou seja, somos ordenados a cuidar com amor, empenho e dedicação de tudo o que dispomos e que nos foi ofertado graciosamente. Não fazê-lo implicará em omissão, negligência e desobediência, resultando na ordem que o Senhor profere: "Tirai-lhe pois o talento, e dai-o ao que tem os dez talentos. Porque a qualquer que tiver será dado, e terá em abundância; mas ao que não tiver até o que tem ser-lhe-á tirado".

Assim devemos proceder em tudo, na vida pessoal, profissional, e na igreja. Há os que pensam ser possível uma vida aparente ou "mínima" no corpo de Cristo. Penso que se enganam a si mesmos os que assim agem. A vida cristã tem de ser intensa em seu zelo, amor, e em produzir os frutos para a glória de Deus. É claro que tudo isso é proporcional ao que Deus nos deu e capacitou-nos a gerir. Ele não dará mais do que podemos suportar, como está escrito: "Não veio sobre vós tentação senão humana, mas fiel é Deus que não vos deixará tentar acima do que podeis, antes com a tentação dará também o escape, para que a possais suportar" [1Co 10.13]. O verso se refere diretamente à tentação para o pecado, mas podemos, por princípio, levá-lo a todos os aspectos da vida, pois Deus não dá um fardo maior do que podemos carregar, já que, com o fardo, nos dá juntamente os meios de suportá-lo.

Voltando à parábola dos talentos, um servo ganhou cinco talentos, enquanto o outro dois, e o último um. Quando o Senhor voltou, os servos foram prestar-lhe contas. O primeiro devolveu-lhe dez talentos, o segundo quatro, e o último o mesmo talento que recebeu. Ou seja, este não soube o que fazer com o que Deus lhe dera, não soube aplicar o seu dom, ao contrário dos demais. Por isso foi reconhecido como mau e negligente servo, e lhe foi tirado o dom. A parábola nos remete a reconhecer Deus como o doador de tudo, inclusive dos nossos talentos e dons. Aquele que não sabe aplicá-los correta e convenientemente é como se não os tivesse; como um cego que quer ver ou um surdo que quer ouvir, com o agravante de que ele tem olhos e ouvidos bons, mas não sabe usá-los ou não os quer usar [Rm 12.4-8].

Na igreja do Senhor, devemos sempre buscar o melhor para nós e os demais irmãos e sermos o melhor que podemos ser, inclusive para nós mesmos, sem nos esquecer de que maior amor tem aquele que dá a vida por seu irmão. Parece um refrão de um cântico antigo ou um slogan, mas para nós tem de ser uma bandeira pela qual vivamos.

Este preâmbulo tem o objetivo de se chegar a dois outros pontos, que considero mais polêmicos e problemáticos dentro da igreja:

1) A autoridade eclesiástica – [1Ts 5.12-13, Hb 13.17]. Os oficiais da igreja governam não para si mesmos, nem a partir de autoridade própria, mas a autoridade investida por Deus, como servos [1Pe 5.1-5, conf Mt 20.26-27];

2) Sustento pastoral - 1Tm 5.17; Lc 10.7; At 28.8-10.

Os quais serão expostos e discutidos nas próximas aulas. 


Notas: 1) Baixe esta mensagem em Aula 46.MP3
2)  Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Biblico

07 junho 2013

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 45: "A fiel disciplina da igreja"


Por Jorge Fernandes Isah


RESUMO DA AULA PASSADA:

Na aula passada falamos das marcas de uma igreja verdadeira, fundamentais para distingui-la em meio a tantas denominações que se auto intitulam cristãs.

1) A Fiel pregação do Evangelho - Estudamos que a marca principal é a pregação do Evangelho, não de qualquer "evangelho", mas o Evangelho de Cristo. Conforme o Senhor Jesus nos entregou, em Mt 28.18-20, a "Grande Comissão", a obra de proclamar a sua palavra e fazer discípulos, batizando-os.

2) A correta ministração das ordenanças -
- O Batismo - Mt 26.19-20;
- A ceia do Senhor - Lc 22.19-20.

Paramos no item 3) que é "O fiel exercício da disciplina".
Deixei, para os irmãos lerem durante a semana, dois versos, os quais leremos, novamente, agora:

Mt 18.15-20: "Ora, se teu irmão pecar contra ti, vai, e repreende-o entre ti e ele só; se te ouvir, ganhaste a teu irmão; Mas, se não te ouvir, leva ainda contigo um ou dois, para que pela boca de duas ou três testemunhas toda a palavra seja confirmada. E, se não as escutar, dize-o à igreja; e, se também não escutar a igreja, considera-o como um gentio e publicano. Em verdade vos digo que tudo o que ligardes na terra será ligado no céu, e tudo o que desligardes na terra será desligado no céu. Também vos digo que, se dois de vós concordarem na terra acerca de qualquer coisa que pedirem, isso lhes será feito por meu Pai, que está nos céus. Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles.".

e

1Co 5.1-5: "Geralmente se ouve que há entre vós fornicação, e fornicação tal, que nem ainda entre os gentios se nomeia, como é haver quem abuse da mulher de seu pai. Estais ensoberbecidos, e nem ao menos vos entristecestes por não ter sido dentre vós tirado quem cometeu tal ação. Eu, na verdade, ainda que ausente no corpo, mas presente no espírito, já determinei, como se estivesse presente, que o que tal ato praticou, Em nome de nosso SENHOR Jesus Cristo, juntos vós e o meu espírito, pelo poder de nosso Senhor Jesus Cristo, Seja entregue a Satanás para destruição da carne, para que o espírito seja salvo no dia do SENHOR Jesus".

- O que fica claro para os irmãos nesses textos?

- Podemos falar em disciplina na igreja?

- Como? Por que?

Primeiramente, no texto de Mateus, temos, uma ordem cronológica no evento:
- Um irmão encontra-se em pecado;

- Ele é advertido por outro irmão, mas persiste no erro;

- É chamado à presença de mais um ou dois para, novamente, ser exortado ao arrependimento;

- É levado finalmente à igreja, visto não ter se arrependido;

- Ainda assim, se insistir em permanecer no pecado, não arrepender-se, revelando um coração duro e empedernido, a igreja deve considerá-lo como gentio ou publicano, como um incrédulo.

Então, temos o Senhor Jesus investindo a igreja de autoridade, da sua autoridade, ao dizer que onde dois ou três estiverem deliberando em seu nome, ali ele estará [v.19-20].

E, qual é a autoridade da igreja?

A que ela se refere?

Apenas em assuntos ligados à doutrina?

À ordem do culto?

Em deliberar como serão gastos os recursos financeiros da igreja?

Ou também nos assuntos relativos ao comportamento escandaloso de seus membros?

Há uma ideia de que esse verso se refere, pura e simplesmente, a qualquer reunião de crentes, o que é verdade, mas, no contexto de Mateus 18, especificamente, ele nos diz da autoridade com a qual Cristo investiu a igreja para deliberar, decidir, dirimir e aplicar todas as resoluções que foram tomadas no âmbito eclesiástico, inclusive, em relação à conduta dos seus membros. Mais do que estar no nosso meio [não entendam que eu esteja menosprezando ou conferindo somenos importância a um fato essêncial e fundamental: Cristo presente no seio da sua igreja], deu-nos a autoridade para resolver todas as questões relativas à igreja, inclusive, a de juízo, em e pelo seu nome. Quando decidimos algo, o fazemos em o nome de Cristo, e é ao nome dele que devemos honrar e ser leais.

Por isso Cristo está a tratar exatamente do pecado de um irmão e da necessidade de discipliná-lo. Não é algo ultrapassado, sem cabimento, nos dias atuais, pois os mandamentos do Senhor são eternos, e nenhum tratamento humano, seja filosófico, psicológico ou pedagógico pode suprimi-lo. De forma que a prática da disciplina eclesiástica é uma prova de maturidade, e amor cristão, tanto a Deus, como à igreja, como também ao irmão empedernido. Mantê-lo em seu pecado é dar um "empurrãozinho" em direção ao inferno; e se alguém considera o desdém como forma de acolhida, saiba que ele é prova maior de rejeição, de falta de apreço, e do exercício de um certo sentimento de superioridade que leva a não fazer caso da desgraça e do mal que acomete o pecador, mas também da igreja conivente com o seu pecado.

Quando se aborda o tema da disciplina estamos tratando diretamente de dois aspectos: a dependência do crente à igreja e a autoridade da igreja sobre o crente.

Alguém tem dúvidas de que seja isso o que o Senhor está dizendo?

Penso que a igreja, ao se omitir quanto a esse assunto, revela alguns sérios problemas.

Vamos agora a 1Co 5.1-5; não vou transcrevê-lo novamente.

O que salta aos olhos dos irmãos nesta passagem?

O pecado, escândalo, de um irmão levou Paulo a comparar a igreja com o mundo, ou melhor, a considerá-la mais pecaminosa do que o próprio mundo.

O que os irmãos entendem quando Paulo chama os Coríntios de estarem "ensoberbecidos" [vaidosos, orgulhosos, soberbos]? Não é esse o sinal de desprezo que apontei acima?

A soberba, que é um tipo de autossuficiência, de se considerar superior e até mesmo intocado ou inatingível, levou a igreja a:

- Negligenciar e fazer vistas-grossas ao pecado;

- Tornou-se conivente com o pecado, associando-se a ele;

- Faltou o temor do Senhor, levando-a à insensatez [Pv 9.10];

- Faltou-lhe amor e piedade para com o irmão em pecado, sabendo que a prática exercida por ele flagrantemente afrontava a Deus;

- E eles mesmos desprezavam o conselho divino e a sua Lei;

- Por fim, tudo isso levou a igreja de Corinto a não se envergonhar do pecado daquele irmão, de forma que ele permanecia no meio deles. Paulo alertou-os de que o orgulho impediu-lhes de tirá-lo dentre eles [v.2].

Em seguida, invocando a autoridade dado por Cristo, falando em nome dele, pela união que há entre o espírito de Paulo e dos irmãos de Corínto [aqui temos o princípio da igreja invisível, espiritual e universal da qual já falamos, e pela qual a igreja tem autoridade para deliberar em todos os assuntos a ela pertinentes, em conformidade com o que Cristo disse em Mt 18.19-20, em uma clara relação entre o que o Senhor disse para fazer e Paulo, como apóstolo da igreja, fez], ele entrega o tal irmão pecador a Satanás, para que a carne seja destruída e o espírito seja salvo [v.5].

O que lhes parece isso? A carne destruída e o espírito salvo pela disciplina da igreja? Mas como se dá isso? E, por que?

Paulo diz o mesmo de Himeneu e Alexandre em 1Tm 1.20, entregando-os, como blasfemadores, a Satanás. Aqui não é possível saber se ele já é salvo ou não, ainda que pareça que não. O certo é que ele comete um pecado grave, e ao que tudo indica foi exortado individualmente por um ou outro irmão, não arrependeu-se e insistiu na rebeldia. A igreja, portanto, tem o dever de excluí-lo, para que, estando fora da proteção da igreja, padeça nas mãos de Satanás e reconheça e busque a necessidade de perdão. Deus utilizará o diabo para disciplinar, na carne, àquele homem.

Hebreus 12.4-13 parece-me a chave da resposta. O apóstolo nos remete ao castigo que não é punitivo, mas educativo, pedagógico, como se gosta de dizer atualmente. Com o objetivo de sarar, de curar e, porque não, salvar o perdido. Veja bem, não é possível saber se aquele irmão era salvo ou não; o texto aponta para o fato dele não ser salvo, pois precisaria ser entregue ao diabo para que o fosse, mas o certo é que o castigo tinha o intento de curá-lo, e sará-lo do quê? De uma vida de pecados, empedernida, e que resistia ao arrependimento. E tudo isso é prova de amor de Deus para com os seus, e da igreja para com os irmãos.

Qual atitude é mais fácil para um pai que sabe do envolvimento do seu filho com as drogas, por exemplo? Procurar curá-lo [e muitas vezes com atitudes que vão contra a vontade rebelde do filho de se drogar, podendo ser a internação ou entregá-lo à justiça] ou abandoná-lo ao próprio vício, como muitos pais e mães agem atualmente? Em qual delas ele demonstrará amor verdadeiro? Em qual delas temos piedade e misericórdia?

Certa vez, vi uma declaração impactante de uma mãe na Tv. O seu filho estava envolvido em crimes, um jovem de 15 anos, e ela preferiu entregá-lo à polícia do que vê-lo caminhar a passos largos para a morte prematura. Ela disse ter tentado de tudo para demover o filho da vida de crimes, e não houve mudanças. Então, em um ato desesperado, ela o denunciou. Muitos a criticaram por essa atitude. Muitos entenderam que a posição dela não traria resultados à correção do filho. Mas, entendo que, na simplicidade daquela senhora, ela agiu como uma verdadeira mãe que ama o seu filho. Ela não foi negligente nem omissa, preferiu a dor de denunciá-lo, e levá-lo certamente à condenação, do que vê-lo viver uma vida miserável de crimes [e as suas lágrimas e a expressão de sofrimento eram evidências claras de como o seu coração estava partido e angustiado]. Ela vislumbrava, na prisão, uma chance que ele não teria levando a vida que levava do lado de fora... Ela entregava o filho à justiça para que pudesse resgatá-lo novamente. Tal qual Paulo diz, ela esperava que ele, no fim de tudo, se salvasse da vida criminosa e da morte iminente.

Então, temos que o princípio da disciplina da igreja visa o arrependimento, e deve ser aplicada em amor, piedoso e misericordioso, que levará, como consequência, caso o irmão se arrependa, ao perdão por parte da igreja e de Cristo [não nessa ordem, claro!].

E isso traz tristeza à igreja, e deve trazê-la também ao irmão em pecado, como Paulo diz em 2Co 2.4-11. Aqui, exatamente, encontramos uma outra exortação relativa a esse mesmo irmão, de que a igreja o perdoe e não aja de maneira excessivamente dura para não aumentar-lhe a tristeza. Ao que tudo indica, esse irmão se arrependeu, mas a igreja não parecia muito disposta a perdoá-lo e tratá-lo novamente como a um irmão. Tem-se de ter cuidado para não extrapolar o ensinamento bíblico e não agirmos no mesmo nível de carnalidade do pecador.

Mas, e se o irmão não se arrepender? Como deve proceder a igreja? Este é o segundo objetivo da disciplina, manter a unidade da igreja. Um exército dividido, sem um objetivo comum, o de glorificar a Deus, não subsiste.

Leia o que Paulo diz em 2Tm 3.1-9 e 4.2-4; e veja o que João, chamado de o apóstolo do amor, nos diz em sua Carta segunda, versos 9-11:

“Todo aquele que prevarica, e não persevera na doutrina de Cristo, não tem a Deus. Quem persevera na doutrina de Cristo, esse tem tanto ao Pai como ao Filho. Se alguém vem ter convosco, e não traz esta doutrina, não o recebais em casa, nem tampouco o saudeis. Porque quem o saúda tem parte nas suas más obras”.

A palavra “prevaricar” significa proceder mal; transgredir a moral, os bons costumes: aquele jovem prevaricara. Vti: Faltar a, deixar de cumprir: Prevaricar aos deveres, às promessas. Corromper, perverter. 

É preciso entender que o crente não pode nem deve ser motivo de escândalos para a igreja, o que, consequentemente, significa escândalo para o nome de Cristo. Por isso há tantas e tantas advertências ao comportamento e modos de agir do cristão. É nosso dever testemunhar, não somente com palavras mas com atos, tudo o que nos foi entregue por Deus como a sua vontade, de que sejamos irrepreensíveis e exemplos para os homens e a sociedade. Ser luz no mundo não é outra coisa a não ser guia-lo [o mundo] na verdade, tirando-o das trevas, do engano, da mentira e do pecado. Mas se nós mesmos estamos em trevas, como podemos enxergar o caminho, seguir a Cristo, e levar outros conosco?

Para finalizar, entendemos que a disciplina pode ser exercida de várias formas, desde a simples exclusão do irmão das atividades de liderança, o não participar da Ceia do Senhor, até, em último caso, a exclusão do rol de membresia. Mas estes serão assuntos que abordaremos mais detidamente à frente. Por hora, é-nos necessário ter a certeza de que a disciplina eclesiástica é bíblica e uma das mais importantes marcas de uma igreja verdadeiramente cristã.

Notas: 1- Baixe o áudio da aula em Aula 45.MP3
2- Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico

03 junho 2013

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 44: "Marcas da Igreja Verdadeira"


Por Jorge Fernandes Isah


Um  rápido resumo da aula anterior:
  • Igreja como organismo [corpo vivo]; 
  • Igreja como organização [corpo local]; 
  • Igreja invisível e universal [todos os santos em todos os tempos];
  • Igreja visível [onde há os joio e o trigo, ainda que o trigo seja verdadeiramente a parte visível da igreja universal.
Como distinção, temos o exemplo do ladrão da cruz, que faz parte da igreja universal, a igreja espiritual que reune os crentes de todos os tempos, mas não chegou a fazer parte da igreja visível, do corpo local.

Mt 13.24-30; Mt 13.47-50; Mt 3.12


As Marcas da Igreja

1. AS MARCAS DA IGREJA EM GERAL.

PERGUNTAS: 
  • PODEMOS DIZER QUE HÁ MARCAS QUE INDIQUEM UMA VERDADEIRA IGREJA? 
  • QUAIS? 
  • ATÉ QUE PONTO ELAS SÃO NECESSÁRIAS PARA QUE SEJA PARTE DA IGREJA DE CRISTO?
a. Sentia-se pouca necessidade destas marcas quando a igreja era claramente uma só. Mas, quando surgiram as heresias, tornou-se necessário indicar certas mudanças pelas quais se pudesse reconhecer a igreja verdadeira. Enquanto a igreja crescia, cresciam também as investidas do inimigo para destruí-la. Já, à época dos apóstolos, um número grande e heresias conviviam com a sã doutrina; elas mesmas, as igrejas heréticas, se autodenominavam igrejas de Cristo, como membros do Corpo. Portanto, com o passar do tempo, foi necessário indicar algumas marcas pelas quais se pudesse distinguir a igreja verdadeira da falsa.

Havia um padrão da verdade ao qual a igreja deve corresponder, e reconheciam esse padrão na Palavra de Deus.


2. AS MARCAS DA IGREJA EM PARTICULAR.

a. A fiel pregação da Palavra. [Mt 28.18-20 – Evangelização e discipulado]
Esta é a mais importante marca da igreja. A fiel pregação da Palavra é o grande meio para a manutenção da igreja e para habilitá-la a ser a mãe dos fiéis. Que esta é uma das características da igreja transparece em passagens como:
  • Jo 8.31, 32, 47; 14.23; 1 Jo 4.1-3; 1Ts 5.21; Ap 2.2
Atribuir esta marca à igreja não significa que a pregação da Palavra na igreja terá que ser perfeita para que ela possa ser considerada como igreja verdadeira. Tal ideal é inatingível na terra; só se pode atribuir à igreja uma pureza "incompleta" de doutrina.

Uma igreja pode ser relativamente impura em sua apresentação da verdade, sem deixar de ser uma igreja verdadeir. Paulo escreve à igreja de Corinto, onde os pecados campeavam, e muitos deles eram mais vergonhosos e infames do que os produzidos pelos ímpios, contudo, ainda assim, o apóstolo se refere a ela como igreja, e aos seus membros como irmãos. 

Mas há um limite além do qual a igreja não pode ir, na apresentação errônea da verdade ou em sua negação, sem perder o seu verdadeiro caráter e tornar-se uma igreja falsa. É o que acontece quando artigos fundamentais de fé são negados publicamente, e a doutrina e a vida já não estão sob o domínio da Palavra de Deus.

E é a palavra de Deus que retém as instruções instituídas pelo próprio Deus e que devem ser cumpridas pela igreja – At 2.41-42.
[Esta passagem sugere a seguinte ordem: conversão, batismo, admissão à igreja local, andar ordeiro, observância da Ceia do Senhor e da oração coletiva]

b) Ordenanças: Ordem, lei, prescrição [1Co 1.2].
Que a reta administração das ordenanças é uma característica da igreja verdadeira, segue-se da sua inseparável conexão com a pregação da Palavra e de passagens como:
  • Mt 28.19; Mc 16.15, 16; At 2.42; 1 Co 11.23-30.

1- Batismo: Mc 16.15-16; Mt 26.19-20.

2- Ceia do Senhor – Lc 22.19-20; 1Co 11.23-26

C) O fiel exercício de disciplina.
É deveras essencial para a manutenção da pureza da doutrina e para salvaguardar a santidade dos sacramentos. As igrejas que relaxarem na disciplina, descobrirão mais cedo ou mais tarde em sua esfera de influência um eclipse da luz da verdade e abusos nas coisas santas. Daí, a igreja que quiser permanecer fiel ao seu ideal, na medida em que isto é possível na terra, deverá ser diligente e conscienciosa no exercício da disciplina cristã. A Palavra de Deus insiste na adequada disciplina a ser exercida na igreja de Cristo - Mt 18.15-18;

  • 1 Co 5.1-5, 13 [1Tm 1.20 e 2Co 2.4-11] – Igreja como proteção ao crente. Paulo parece dizer que aquele que é expulso do convívio da igreja está entregue a Satanás, ao mundo, estando sujeito a ele e sem a proteção do Corpo.

Notas: 1- No áudio, os pontos apenas tocados levemente aqui são expostos mais detidamente, sobre as marcas primordiais da verdadeira Igreja de Cristo. 2- A seção 2C, que refere-se à disciplina eclesiástica será discutiva mais à frente, em outra aula.
3- É discutida também a questão dos sacramentos [batismo e ceia], do ponto de vista católico e reformado, como meios de graça, os quais, nós, batistas, não reconhecemos, já que os temos por ordenanças e, em momento algum, acreditamos que eles tragam uma "sobre-graça" sob a "graça", e que sejam os aspetos visíveis da "Aliança" ou "Pacto".
4- No áudio, confundi Tomás de Aquino com Agostinho, o qual formulou primeiramente a doutrina dos sacramentos, ainda que o primeiro tenha-o seguido na questão. 
5- Faço também, na aula, um pequeno comentário sobre o filme "Redenção", cujo título em inglês é "Machine Gun Preacher", analisando o batismo bíblico.
6- Baixe o áudio desta aula em  Aula 44.MP3
7 - Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico