06 julho 2017

Sermão em Atos 12.6: Confiar é descansar em Deus





Jorge F. Isah




“Pedro, pois, era guardado na prisão; mas a igreja fazia contínua oração por ele a Deus. E quando Herodes estava para o fazer comparecer, nessa mesma noite estava Pedro dormindo entre dois soldados, ligado com duas cadeias, e os guardas diante da porta guardavam a prisão” 

 1- INTRODUÇÃO:

Na última meditação, analisamos o verso 5 e o papel da oração na vida da igreja. Enquanto Pedro estava preso, a igreja orava por ele.

Hoje, nos deparamos com algo aparentemente inusitado, presente no verso 6. Lembro-me que ao ler este verso pela primeira vez, há longínquos 11 anos, no início da minha conversão, fiquei meio que chocado, em princípio, e imediatamente em êxtase diante do testemunho do apóstolo Pedro. 

E o que temos de tão importante? 

Ora, sabendo Pedro que Herodes o mataria no dia seguinte, ao fim do período pascoal, preso e amarrado entre dois soldados, e com uma escolta de mais 14 homens a vigiá-lo do lado de fora da cela, ele dormiu. 

Tentei me colocar em seu lugar, e imaginar qual seria a minha reação. Também dormiria? Ficaria acordado, aflito? Percebi que não encontraria uma resposta em mim mesmo, então, procurei-a no texto bíblico, em especial, no exemplo do apóstolo. 

Primeiro, temos Pedro sendo preso na Páscoa, logo após a morte de Tiago, um dos doze. A euforia do povo diante do martírio do irmão de João, trouxe anseios de mais sangue inocente ser derramado por Herodes, que viu em Pedro, um dos pilares da igreja em Jerusalém, o alvo propício para satisfazer a sanha assassina que permeava a sua vontade e a do povo. 

Pedro ficou uma semana recluso, enquanto a igreja orava, e a certeza de seu fim era-lhe cada vez mais próxima. Sabia que em respeito à tradição festiva, não morreria, mas findada as comemorações, seu martírio aconteceria, pois, Herodes já deixara claro quais eram suas intenções e propósitos. 

Não é difícil imaginar que qualquer um de nós, com o passar dos dias, à medida em que a liberdade não acontecia, se angustiaria com a iminente execução. Não é impossível supor que o apóstolo, em algum momento, temeu por sua vida, e teve tempo suficiente para refletir na gravidade da sua situação. 

Porém, o que levou Pedro a dormir na noite anterior à sua execução? Cansaço? Desânimo? Desilusão? 

Não. 

Ao meu ver, Pedro estava tranquilo, confiante e esperançoso de que o desfecho final daquela situação ser-lhe-ia favorável. É o que veremos a seguir. 

2- CONHECER E CONFIAR

Uma das primeiras coisas que constatamos, quando da conversão, é a confiança em Deus. Sabemos que toda a nova vida nos foi dada por Cristo, se baseia exatamente na confiança que temos nele, em sua obra, em seus méritos, pelos quais somos transformados e redimidos, e temos íntima comunhão com o seu Espírito.

No decorrer da caminhada cristã, somos colocados diante de situações nas quais não podemos contar com mais ninguém a não ser ele. A esperança reside nele; e sem ele, tudo desaba como um castelo de areia diante de um temporal.

Mas, por que e como confiamos?

Primeiro, não confiamos em quem não conhecemos; e se confiamos, é porque o conhecemos. Sem o conhecimento e intimidade com Deus, não há como crer e ter segurança. O princípio é o de que ele nos conheceu antes, muito antes de virmos à existência, mas se deu a ser conhecido por nós [Rm 8.28-29; Ef 1.4]. Como? Através da Escritura sagrada.

Muitas pessoas dizem conhecer a Deus, mas nunca, ou quase nunca, se dispõem a ler a sua palavra. Se ele antes falava diretamente com os profetas, revelando-lhes o que falar ao povo, hoje ele fala exclusivamente por sua palavra através da ação do seu Espírito.

Então, qualquer alegação de confiança em Deus alheio ao conhecimento revelado nos textos sagrados, significará um falso conhecimento, ou a completa ignorância a respeito daquele que supomos confiar. Seria uma esperança vazia, posta em um conceito formulado por nós mesmos à margem da verdade; um engano, um blefe, no qual renunciamos à verdade, silenciando-a em favor do estrepitoso barulho da mentira e morte.

Sem a Bíblia, qualquer revelação do caráter divino será nada além de idolatria, de presunção, arrogância e fraude. Onde o enganador é o próprio alvo do seu embuste, sendo ele o primeiro a ser seduzido pela ideia de um Deus moldado à imagem humana, a partir de várias perspectivas humanas, condicionado e restringido por suas criaturas, cujas concepções são incompletas e segmentárias.

Apenas o próprio Deus pode se autorrevelar; e é ele quem se encarrega de fazê-lo, exclusivamente por sua vontade, graça e misericórdia.

Portanto, sem o conhecimento divino, não podemos jamais confiar nele. Se confiamos alheios à sua revelação de si mesmo, confiamos em um ídolo; nosso conhecimento é falso; nossa confiança é falsa; e enganados pela presunção de sermos capazes de formar o caráter de quem confiamos, ao invés de deixar que a pessoa fale e demonstre, por si mesma, se é merecedora da nossa confiança. A confiança não é algo que parte primeiramente do fiador para o confiado (afiançado), mas deste para aquele. O fiador somente prestará a si e seu nome ao afiançado, se este merecê-lo, for idôneo e capaz de honrar a confiança depositada.

Deus se revela plenamente confiável por aquilo que ele diz de si mesmo, mas, sobretudo, por aquilo que ele fez, entregando-se a si por amor de nós. A base ou fundamento do conhecimento divino não está em nós, primeiramente, mas nele; e é pelo seu amor, pelo qual se revelou, que somos capacitados a conhece-lo, e o conhecemos verdadeiramente, Como está escrito:

“Há muito que o Senhor me apareceu, dizendo: Porquanto com amor eterno te amei, por isso com benignidade te atraí.” [Jeremias 31:3]

     
     3- CONFIAR É ENTREGAR-SE!

Deus é o Senhor de tudo e de todas as coisas! Mais dia, menos dia, todos terão de se curvar ao seu senhorio, por bem ou por mal, quer queira ou não. Como afirma Paulo:

“Para que ao nome de Jesus se dobre todo o joelho dos que estão nos céus, e na terra, e debaixo da terra,
E toda a língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai. [Filipenses 2:10,11]

O verso acima é uma declaração expressa de que ninguém, sejam homens e anjos, eleitos e ímpios, crentes e ateus, salvos e condenados, estarão em posição de negar-se a adorar ao Deus verdadeiro. Nem mesmo satanás o fará; ele se curvará e confessará com os próprios lábios que Cristo é o Senhor!

O que acontece com a maioria das pessoas é que dizem confiar em Deus, mas não há disposição de entregarem-se ao seu senhorio, de dobrarem-se à sua vontade, como forma de gratidão por toda a sorte de bênçãos dadas. As pessoas, vias de regra, dizem confiar nele, mas entregam-se exclusivamente ao próprio autogoverno, sem o desejo de serem guiadas e dirigidas pelo Criador. A maior parte das teologias e filosofias existentes afirmam a soberania do homem sobre si mesmo, chegando ao ponto de a vontade humana se sobrepor à vontade divina. Há uma clara inversão de valores no qual a vontade humana tem de ser preservada, e em seu favor, a vontade divina deve estar sujeita. E a desculpa sempre é a mesma: Deus, em sua soberania, entregou ao homem os seus desígnios, de tal forma que Deus não pode ser Deus se o homem não quiser. Em outras palavras, a vontade divina, no fim das contas, dependerá sempre da vontade humana para se manifestar, do contrário, ela é suprimida, prevalecendo a da criatura em detrimento a do Criador.

Como o homem é supostamente livre, ele se utiliza dessa liberdade para rejeitar a vontade divina, não se entregando ao seu senhorio. O que acontece, na verdade, é que ele não pode fazê-lo, pois sua natureza está em oposição a Deus, e sua vontade é contrária à dele. Não é uma questão de escolha, mas de não poder escolher o bem, o certo, o que agradaria a Deus. Para complicar ainda mais esse contexto, o homem que diz conhecer a Deus, não conhece a sua vontade, e sem conhecer a sua vontade, como poderia conhece-lo? E se vontade divina está expressa em sua palavra, a qual o homem natural pode está afeito ou em completamente desinteressado, como pode conhece-lo?

Por isso, o homem que diz conhecer a Deus não o conhece, antes criou para si mesmo um espantalho, um ídolo, no qual diz acreditar e confiar, sem se questionar de que pode estar sendo pego em uma armadilha, cujo laço a apertá-lo foi colocado e puxado por ele mesmo.

Se conheço a Deus, a vontade é de me entregar a ele, e nele fazer morada, sendo dele moradia. Paulo diz que somos templo do Espírito Santo [1Co 3.16-17]; e nisso está demonstrada a ligação íntima que existe entre Deus e o seu povo. Se confio, me entrego completamente ao objeto da minha confiança. Quando um homem, perdido, cansado e faminto, não encontra saída em uma densa floresta, após alguns dias entrará em desespero, e perderá completamente a esperança em si mesmo, depois de andar sem rumo, sem encontrar um lugar seguro. Entretanto, se avistar um guarda florestal, não hesitará em pedir-lhe socorro, entregando-se aos seus cuidados, disposto a fazer tudo o que ele lhe disser e ordenar que seja feito, pois se sentirá resgatado e salvo.

Da mesma forma, guardadas as devidas proporções, o homem deveria, muito antes de buscar confiar em seus próprios méritos e esforços, colocar a sua esperança no Senhor, que tudo pode e é sábio para nos conduzir no melhor para nós mesmos. É claro que nem tudo nos agradará e será entendido de cara, no primeiro momento, porque somos imediatistas e não nos dispomos ao sacrifício e esforço, esperando que tudo nos seja entregue de “mão-beijada”. Algumas situações nos desagradarão em muito, mas se houver disposição em confiar, sabendo que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, o crente não perderá a sua paz, não se afligirá, nem será perturbado pelas vicissitudes e pelo mal que o rodeia.

Como está escrito:

“Confia no Senhor e faze o bem; habitarás na terra, e verdadeiramente serás alimentado. Deleita-te também no Senhor, e te concederá os desejos do teu coração.
Entrega o teu caminho ao Senhor; confia nele, e ele o fará.
E ele fará sobressair a tua justiça como a luz, e o teu juízo como o meio-dia. Descansa no Senhor, e espera nele; não te indignes por causa daquele que prospera em seu caminho, por causa do homem que executa astutos intentos.” [Salmos 37:4-7]

O exemplo claro de entrega foi-nos dado pelo Senhor Jesus. Na última quarta-feira, o irmão Francisco nos trouxe a mensagem no texto em que o Senhor está no Getsêmani, o qual gostaria de ler novamente:

“Então chegou Jesus com eles a um lugar chamado Getsêmani, e disse a seus discípulos: Assentai-vos aqui, enquanto vou além orar.
E, levando consigo Pedro e os dois filhos de Zebedeu, começou a entristecer-se e a angustiar-se muito.
Então lhes disse: A minha alma está cheia de tristeza até a morte; ficai aqui, e velai comigo.
E, indo um pouco mais para diante, prostrou-se sobre o seu rosto, orando e dizendo: Meu Pai, se é possível, passe de mim este cálice; todavia, não seja como eu quero, mas como tu queres.
E, voltando para os seus discípulos, achou-os adormecidos; e disse a Pedro: Então nem uma hora pudeste velar comigo?
Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; na verdade, o espírito está pronto, mas a carne é fraca.
E, indo segunda vez, orou, dizendo: Pai meu, se este cálice não pode passar de mim sem eu o beber, faça-se a tua vontade.
E, voltando, achou-os outra vez adormecidos; porque os seus olhos estavam pesados.
E, deixando-os de novo, foi orar pela terceira vez, dizendo as mesmas palavras.
Então chegou junto dos seus discípulos, e disse-lhes: Dormi agora, e repousai; eis que é chegada a hora, e o Filho do homem será entregue nas mãos dos pecadores.
Levantai-vos, partamos; eis que é chegado o que me trai.”
[Mateus 26:36-46]


Cristo não veio fazer a sua vontade, mas a vontade do Pai. E isso é confiança, é entrega-se voluntariamente ao arbítrio e desejo do Pai; é colocar-se nas mãos daquele que, cheio de sabedoria, amor, misericórdia e graça, não somente sabe o que é melhor para nós, mas cuida de nós. É o que disse o Senhor:

“E Jesus lhes disse: Eu sou o pão da vida; aquele que vem a mim não terá fome, e quem crê em mim nunca terá sede.
Mas já vos disse que também vós me vistes, e contudo não credes.
Todo o que o Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora.
Porque eu desci do céu, não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou.
E a vontade do Pai que me enviou é esta: Que nenhum de todos aqueles que me deu se perca, mas que o ressuscite no último dia.
Porquanto a vontade daquele que me enviou é esta: Que todo aquele que vê o Filho, e crê nele, tenha a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia.”
[João 6:35-40]

Portanto, sigamos o seu exemplo, uma vez que confiar e crer não é apenas um sentimento, ou apenas uma disposição interna, mas é a sujeição completa, é curvar-nos diante do Senhor, reconhecendo a sua infinita autoridade e senhorio, mas também o seu infinito amor, o amor zeloso pelo qual somos feitos filhos, e ao qual devemos obedecer, sem murmurações, sem blasfêmia, cientes de que não estamos abandonados, mas cuidados por aquele que se entregou a si mesmo por amor de nós.

Pedro certamente orou, certamente clamou a Deus por sua vida; mas, em dado momento, fez aquilo que lhe era pedido: entregou-se ao Senhor, confiante de que não poderia estar em mãos mais justas e sábias e amorosas. A aflição inicial, a angustia inicial, a apreensão inicial, deram lugar à certeza de que, quer na vida, quer na morte, importava entregar-se integralmente ao Senhor que o resgatou, pagando o alto preço para que ele tivesse a vida eterna.



4) CONFIAR É ESPERAR E CRER

Pedro poderia tomar várias atitudes, mesmo preso: tentar se libertar, negociar com os soldados e mesmo Herodes, praguejar, negar o evangelho, etc. Ele preferiu esperar no Senhor. Passada uma semana, ainda preso, o apóstolo não se desesperou, e não tentou resolver a situação utilizando-se de ferramentas e esforço humano. O seu desempenho resumiu-se em orar e esperar, buscando o reino de Deus e a sua justiça.

Podemos conjecturar o que ele pensava? Sim. Mas não há como ter certeza do que lhe passava pela mente, se tinha convicção de ser liberto, se tinha convicção de ser condenado, ou se não tinha convicção alguma quanto a nada disso, mas a certeza de que estava seguro nas mãos de Deus, não importando o desfecho daquela prisão. É nisso que penso: Pedro não sabia o que lhe sucederia, mas estava confiante de que o resultado era o que menos importava; o crucial era a certeza e esperança depositadas no seu Senhor.

O mais importante era o que Deus estava fazendo em sua vida, mesmo com aquela prisão, aperfeiçoando-o no conhecimento, aperfeiçoando-o na graça, na paz, na esperança de que as promessas divinas para o seu povo se concretizariam.

Importante a fé verdadeira, na qual cremos e esperamos. Por isso a definição de fé, nas Escrituras, nos mostra que mais do que uma disposição interior é uma expressão exterior de confiança em Deus e no que ele fez e ainda fará por nós, ou seja, testemunhamos a convicção naquilo que Deus fará por nós, e testemunhamos que ele, de fato e em verdade, cuida e cuidará de nós. Assim, nossas atitudes revelam e confirmam a confiança e esperança no senhorio e governo divino sobre nossas vidas:

“Ora, a fé é o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que se não vêem.
Porque por ela os antigos alcançaram testemunho”.

[Hebreus 11:1,2]

Pedro esperou e creu no zelo, cuidado e amor providente do bom Deus.


5) CONFIAR É DESCANSAR

Se as coisas não andam bem, e tudo parece perdido, o que fazer? Desesperar? Correr feito barata tonta? Maldizer? Em que estas coisas podem ajuda-lo a solucionar o problema ou aflição na qual vive? Certamente, em nada!

Davi nos instrui a como andar e proceder neste mundo, a sermos ovelhas do om pastor de nossas almas:

“O SENHOR é o meu pastor, nada me faltará.
Deitar-me faz em verdes pastos, guia-me mansamente a águas tranqüilas. Refrigera a minha alma; guia-me pelas veredas da justiça, por amor do seu nome.
Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam.”
[Salmos 23:1-4]


Por isso, o Senhor disse:

“Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei.
Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração; e encontrareis descanso para as vossas almas.
Porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve.”
[Mateus 11:28-30]

Ele é o nosso descanso, o nosso sábado. É nele que devemos depositar as aflições, angústias, dores, sofrimento e injustiças. Cristo é o reparador de todas as coisas; e nele fomos feitos filhos de Deus. É preciso que o homem não se engane, não somos governantes de nós mesmos, mas temos um supremo e soberano Senhor, o qual tomou a própria vida em favor de nós, para nos fazer agradáveis e santos diante do Pai. Ele nos comprou por alto preço, o preço de sangue, o seu sangue! Não somos de nós mesmos, mas dele, propriedade sua! [1Co 6.19-20].

Em outra passagem significativa para o propósito desta mensagem, temos o Senhor e os seus discípulos atravessando o Mar da Galiléia, quando são surpreendidos por uma forte tempestade. A narrativa está em Marcos 4.35-41, que diz:

“E, naquele dia, sendo já tarde, disse-lhes: Passemos para o outro lado.
E eles, deixando a multidão, o levaram consigo, assim como estava, no barco; e havia também com ele outros barquinhos.
E levantou-se grande temporal de vento, e subiam as ondas por cima do barco, de maneira que já se enchia.
E ele estava na popa, dormindo sobre uma almofada, e despertaram-no, dizendo-lhe: Mestre, não se te dá que pereçamos?
E ele, despertando, repreendeu o vento, e disse ao mar: Cala-te, aquieta-te. E o vento se aquietou, e houve grande bonança.
E disse-lhes: Por que sois tão tímidos? Ainda não tendes fé?
E sentiram um grande temor, e diziam uns aos outros: Mas quem é este, que até o vento e o mar lhe obedecem?”

Portanto, se confiamos, descansamos. E por pior que sejam as tempestades, se o barco está a deriva, não nos esqueçamos de que Cristo está nele, e não sucumbiremos, pois todas as coisas estão sob a égide do seu poder e autoridade, e nada acontece sem que a sua vontade prevaleça. Então, não esteja aflito ou sobressaltado, mas descanse e confie naquele que, em tudo, podemos confiar.


6) CONCLUSÃO:

Como Pedro, mesmo diante da iminente morte, descansou e dormiu. Ele não bateu a cabeça na parede, não tentou se desvencilhar da prisão, não se entregou ao esforço inútil de se libertar, nem implementou uma guerra contra os seus algozes, mas descansou no Senhor, esperando nele, sabendo que, como já foi dito, todas as coisas cooperam para o bem daquele que ama a Deus.

Confiar é conhecer. Confiar é se entregar. Confiar é esperar e crer. Confiar é descansar. Confiar é amar. Somente confia aquele que ama e é capaz de se sujeitar ao amor, por amor. Que o exemplo de Pedro nos sirva de lição, para não vivermos em perturbação da alma, nem na agitação do corpo e do espírito. Porque todas as coisas nos foram dadas em Cristo, tanto a vida, como a morte, e a esperança de que nada pode nos separar do amor de Deus, em Cristo.


29 junho 2017

Enquanto a Igreja orava, Pedro dormia! [ Complemento]



Jorge F. Isah

Enquanto as festividades corriam nas ruas, casas, salões e no Templo, Pedro era mantido preso. Em seu favor orava a igreja insistentemente a Deus. Muitos entendem a oração como uma arma poderosa para demover o Senhor da sua vontade. Existem absurdos dignos dos mais desprezíveis, incautos e delirantes homens, no sentido de que, ao orar-se com muita fé, a vontade divina pode ser vergada ou dobrada pelo homem. O cristão atual, em sua maioria, carrega a oração com um misticismo digno dos pagãos, onde a penitência e o mérito está em quem ora e não naquele que é poderoso, sábio e justo para realizar ou não o pedido.

Não raro alguns são acusados de não terem seus pedidos atendidos por lhes faltar fé ou um pouco de fé, de não alcançarem o nível exigido de fé. Sendo um dom divino [Ef 2.8], e não algo produzido no próprio homem por si mesmo, ninguém jamais possuirá, em si, a porção suficiente para satisfazer a Deus. A fé é uma dádiva; e antes de mover a vontade divina, é ele quem nos move, pela fé que nos dá, a fim de cumprir os seus perfeitos e santos conselhos.

Entretanto, alguém pode questionar: Se a igreja orava por Pedro, provavelmente orou por Tiago. Por que então ele não sobreviveu e morreu? Qual o sentido da oração se não for mover o coração de Deus a atender-nos?

A Escritura nos diz que tudo quanto pedirmos a Deus, em oração, ele o fará, segundo a sua vontade [1Jo 5.14-15]. Primeiro, o pedido deve estar em harmonia com a vontade divina. Segundo, não o façamos por deleite, vaidade ou apetite carnal. Não se deve pedir o que é ilegítimo. E sob a forma de murmuração ou exigência. A nossa vontade deve estar constantemente cativa à vontade divina, e não o contrário. E o mais importante: reconhecer o Senhor como soberano, seja qual for a sua decisão em relação a nossa oração, o seu cumprimento ou não. Afinal, o resultado será para a sua glória. A igreja orou por Tiago? Provavelmente, sim. Houve tempo suficiente para que o anúncio da sua prisão chegasse aos ouvidos da igreja. Certamente, a partir daquele momento, eles suplicaram por sua vida. Mesmo assim, ele veio a ser martirizado. Faltou fé à igreja? Não! O propósito divino era outro, contudo. A morte do apóstolo cumpriria a vontade soberana, justa e santa de Deus. Podemos cogitar os motivos? Sim. Ainda que o Senhor não nos deva nenhuma explicação quanto à razão dos seus feitos, bastando-nos aceita-los. De alguma maneira, a igreja estava sendo trabalhada por Deus, através da oração, mas também do sacrifício de Tiago, como no de Estevão, e muitos outros que se seguiram.

Havia uma confiança a ser aprimorada, a dependência divina, e a esperança em sua providência, seja na alegria, seja na dor. A fé, como está escrito, é a certeza das coisas que não se veem; e o maior exemplo de fé a certeza de que estarmos sempre sob os cuidados amorosos do Pai, não importando a situação. Não é o que Paulo nos diz?

“Tendo sido, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo; Pelo qual também temos entrada pela fé a esta graça, na qual estamos firmes, e nos gloriamos na esperança da glória de Deus. E não somente isto, mas também nos gloriamos nas tribulações; sabendo que a tribulação produz a paciência, E a paciência a experiência, e a experiência a esperança. E a esperança não traz confusão, porquanto o amor de Deus está derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado.” [Rm 5.1-5].

E ainda, Pedro, que ratifica esta afirmação:

“Em que vós grandemente vos alegrais, ainda que agora importa, sendo necessário, que estejais por um pouco contristados com várias tentações, Para que a prova da vossa fé, muito mais preciosa do que o ouro que perece e é provado pelo fogo, se ache em louvor, e honra, e glória, na revelação de Jesus Cristo” [1Pe 1.6-7]

E complementa:

“E o Deus de toda a graça, que em Cristo Jesus nos chamou à sua eterna glória, depois de havemos padecido um pouco, ele mesmo vos aperfeiçoe, confirme, fortifique e estabeleça.” [1Pe 5.10]

O fato é que o coração do homem e o seu desejo não podem mudar ou convencer a Deus de algo. Antes o Senhor é quem nos convence e nos move segundo a sua vontade. A igreja deve orar como forma de adoração, ao se colocar humildemente sob a vontade divina, reconhecendo o seu poder, mas também o seu amor paternal, a nos conduzir, aperfeiçoando-nos para aquele dia em que seremos tal qual é o nosso Senhor. Aqueles irmãos poderiam pegar em armas e investirem contra o governo de Herodes a fim de libertarem Pedro, ou Tiago. Do ponto de vista humano seria uma saída plausível. Estaríamos em harmonia com a vontade divina? De nos sujeitarmos ao seu senhorio e governo? Não! Coube ao povo de Deus clamar, insistentemente, continuamente, para que Pedro, ou Tiago, fossem libertos. No segundo caso, as orações não foram atendidas, e ele foi entregue à sanha homicida de Herodes e do povo². No primeiro caso, veremos a seguir o aconteceu.

Voltando a Pedro, o encontramos, enquanto a igreja está de vigília, dormindo. Seria esta a atitude correta do apóstolo? Por que não seu uniu aos demais irmãos em oração por sua vida? Mas ele conseguia dormir, acorrentado a dois soldados, sabendo que naquele dia seria apresentado e morto diante do povo por Herodes.

Fico a pensar se eu seria capaz de manter-me tranquilo diante da morte. Pedro, talvez, estivesse certo do seu fim, já que Tiago, um dos três, juntamente com Pedro e João, era um dos discípulos mais próximos e chegados de Jesus. Se ele não foi poupado, por que Pedro seria? Parecia que Pedro trabalhava com essa certeza, como algo inevitável. Porém, é possível afirmar a confiança do apóstolo no Senhor. Ele sabia que a sua vida estava guardada em suas mãos poderosas. Ainda que não soubesse de fato o que sucederia, a morte não era uma aflição, nem motivo de angústia. Provavelmente ele pediu por sua vida, mas descansou em seu pedido. Era-lhe suficiente ter pedido, assim como suficiente era esperar na providência divina: de mantê-lo mais algum tempo neste mundo, ou leva-lo para junto a glória eterna. De alguma maneira, Pedro já tinha a sua resposta; e não a esperava com ansiedade. Pelo contrário, dormia.


Haveria contradição entre a atitude de Pedro e a do restante da igreja? Se de um lado havia um intenso clamor, no outro o descanso silencioso? Novamente, não! Eram atitudes complementares e necessárias. Se de um lado o alvo da oração descansava, e estava certo em descansar e esperar no Senhor, de outro lado, o clamor insistente também revelava a confiança de ser Deus o único capaz de preservar a vida do apóstolo, pois enquanto os homens, animais e demônios têm o poder de tirar a vida, Deus é o único capaz de dá-la e preservá-la. Em ambos os lados havia uma única certeza: Deus pode, e o fará segundo a sua vontade, para a sua glória. Cabe-nos confiar e depositar a nossa esperança nele; sabendo que a oração insistente, em favor do próximo, é o nosso dever, sobretudo para que encontrem a paz e o repouso, possível somente em Cristo, assim com Pedro encontrou. Da parte de Pedro, aprender que nossas vidas devem estar em conformidade com a vontade divina, em serviço a ela, seja aqui ou na eternidade.