15 junho 2015

Preâmbulo sobre o ativismo cristão



Por Jorge Fernandes Isah




Muito do que escreverei não será novidade para as pessoas que leem, se informam adequadamente (muito além dos jornais e telejornais), e têm acuidade com a realidade. Em especial, os que se interessam por história, e veem-na repetir-se em ciclos, naquilo que de pior ou mais nefasto produziu. Portanto, não esperem originalidade ou descobertas impactantes nas meditações a seguir; são triviais, e estão ao alcance de qualquer um minimamente instruído.

Também, não tenho intenção de ser exaustivo; haverá pontos que apenas os tocarei de leve, visto serem, como já disse, do conhecimento de qualquer um bem-informado, e análises mais profundas e detalhadas podem ser encontradas em diversas fontes, ao alcance daqueles desejosos em perscrutar os temas abordados. Então, cientes de tratar-se de um artigo, não de um tratado, espero que compreendam as suas limitações e, principalmente, as minhas.

Pois bem, após os incidentes da última parada gay, em São Paulo, muito se tem falado sobre a necessidade de reação dos cristãos diante da provocação gratuita do movimento LGBT; opiniões que acompanhei dispersamente, de um modo geral, focando-me em comentários mais abrangentes e profundos de cristãos verdadeiros, os quais conheço com alguma propriedade. 

Primeiro, quero afirmar que, tanto o movimento LGBT, como o MST, prostitutas, abortistas, feministas, sindicatos em geral, e outros movimentos “sociais”, fazem parte do processo de dominação marxista do país (como se ele já não estivesse dominado pela ideologia do Karl e seus asseclas, infiltrados em igrejas, escolas, universidades, Ong’s, e disseminado por quase todo o Estado), e, como tais, clamam por uma “democracia” (seja lá o significado que deem ao termo) onde o objetivo é o controle da maioria pela minoria (um contrassenso e abuso político do termo). A escalada com que os fundamentos da civilização ocidental, cuja origem e sustentação encontra-se na tradição judaico-cristã, está sendo galgada sistematicamente de dentro e por dentro, pela militância marxista, com o fim de se criar uma “nova sociedade” ou uma “nova ordem social”; é algo assombroso, e, ao mesmo tempo, parece inexistir aos olhos da grande massa, como se fosse a “cabeça-de-bacalhau” dos últimos cento e poucos anos: ninguém viu, sabe-se que existe, mas o fato é irrelevante, quase uma teoria da conspiração, já que não há evidências, apesar do restante da carne dar uma refeição suculenta. O apelo a sofismas, tais como liberdade, igualdade e fraternidade (os quais são imediatamente rejeitados tão logo a ditadura de esquerda consolide-se) são o chamariz para a causa ganhar ares de justiça e bondade, levando uma legião de incautos, ignorantes e devotos a abraçarem o movimento como se nele próprio estivesse instalada a essência da piedade e generosidade. 
 
O pressuposto, erradamente deduzido e espalhado como praga pelo Iluminismo, via Russeau, da bondade inerente do homem e de que a sociedade é a causa da sua corrupção (por isso ele postulava a “criação” de um novo homem e de uma nova ordem social, onde a moral baseava-se em princípios naturais, quase animalescos) foi tomado de assalto pelos ideólogos e difundido como a última verdade ocultada pela história, especialmente pelos cristãos que insistiram, por séculos, na ideia dominadora do Pecado Original, da Depravação Total do Homem, com vistas de cabrestear a humanidade, privando-a da liberdade. Para eles, liberdade significa tudo o que podem e possam fazer com os demais da sua raça, ou seja, os homens são “livres” para obedecê-los, seja por vontade própria, sobre coerção, indução, e “jogos” mentais, ou pela força física, pois eles são os salvadores, os novos messias, os restauradores da ordem perdida por séculos de controle religioso, econômico e social (ainda que a sociedade seja uma entidade presumível, ela não tem uma mente, um corpo ou alma a defini-la e identifica-la, não passando de um espantalho). Logo, fica-se evidenciado a necessidade de embutir no discurso os três lemas, jamais alcançados, pela Revolução Francesa: igualdade, fraternidade, liberdade; dando ares de espiritualidade, benevolência, tolerância e amor fraternal, quando, na prática e muito além da retórica, tanto a Revolução Francesa, como todas as revoluções, e onde o marxismo e suas vertentes tomaram o poder (inclusive na Alemanha Nazista e na Itália Fascista), instalou-se o “governo de terror”, onde os indivíduos eram expropriados, torturados e mortos em nome de uma “paz”, de uma perfeição impossível e inalcançável, significando o estabelecimento do controle, do poder e da autoridade estatal. Paz, para eles, é o mesmo que um Estado todo-poderoso, subjugando tudo e todos, livremente. Perfeição é esse mesmo Estado funcionando em máxima potência, sem opositores, inimigos, perseguindo, expropriando, torturando, confinando e matando. Mas, se atentarmos para o fato de o Estado não ser um ente, não passando de um organismo controlado por um grupo de pessoas, a autoridade investida é para aquelas pessoas que formam a burocracia, o poder é para elas, e o controle é delas. São homens vitimando outros homens ao seu bel-prazer ideológico; tirania e despotismo são os sinônimos para a autocracia de uma elite estadista.

Bem, e o que tem isso a ver com os movimentos citados no primeiro parágrafo? É que eles, dentro do planejamento, são instrumentos para a dominação estatal, a ideia de um pequeno grupo, minoria, controlando a vivência social, ditando leis e normas que subvertam a ordem estabelecida, negando a individualidade ou, ao menos, o direito de sê-la, em favor da coletividade presumivelmente ordenada pelo Estado, o seu legítimo executor, como se fossem os “iluminados” (e a relação com o iluminismo não é apenas mera coincidência). O primeiro aspecto a se apontar é este: os chamados movimentos sociais nada mais são do que artefatos destinados a propiciar e fazer avançar o absolutismo estadista, o ápice das revoluções.  

O segundo ponto a se abordar é a necessidade, para se alcançar o “novo homem” e a “nova sociedade”, da destruição dos fundamentos, do alicerce da civilização ocidental, a tradição judaico-cristã e seus ordenamentos, como a família, a igreja, a propriedade privada, a liberdade, a alta cultura, etc, vistos como agentes repressores da “humanidade” (e a definição de humanidade é algo humanamente impossível para eles) e do bem-estar social; ou seja, nada do antigo, daquilo que deu certo (ainda que tenha falhas e equívocos como tudo produzido pelo homem), tem valor ou pode permanecer, senão a revolução não vencerá, não terá êxito. Não pode ficar pedra sobre pedra; todo o edifício deve ruir, para se construir, literalmente, a nova ordem segundo os preceitos marxistas, a imperfeição levada ao máximo, como o vértice da monstruosidade. O mesmo vale para o Islã e sua máquina destruidora: é a violência em suas formas mais bárbaras, odiosas e malignamente alcançáveis pelo homem. Levando, novamente, incautos e ignorantes a abraçarem as duas correntes inimigas como se fossem a mesma coisa, como se seus ideais fossem harmônicos, ainda que tenham o objetivo comum: a erradicação da cultura ocidental (leia-se, novamente, judaísmo-cristianismo). É o famoso “tiro-no-pé”, pois, em qualquer um dos dois sistemas, quando instados ao poder, a minoria, antes hegemônica, vê-se acossada assim como ela mesma fustigou e molestou seus perseguidos. Mas aí, quando a “ficha cair”, será tarde demais para muitos; e a realidade será a própria estupidez, o “nonsense” de uma vida inteira devotada à própria destruição, piscando como neon na consciência, para aqueles capazes de restaurá-la. 

Então, quando vemos a imoralidade via satélite, decantada como uma qualidade, lembro-me da advertência do profeta: 

“Ai dos que chamam ao mal bem e ao bem, mal, que fazem das trevas luz e da luz, trevas, do amargo, doce e do doce, amargo" (Is 5.20)

E do filósofo:

“Quando você não tem virtudes para louvar, começa a louvar seus defeitos, começa a se orgulhar dos seus pecados" (Olavo de Carvalho)

O terceiro ponto é que eles, os progressistas e libertários, rejeitam qualquer senso moral (ainda que, atacados pela imoralidade alheia, levantem suas vozes para a punição do ofensor; uma autocontradição sistêmica), e nada pode ser tratado como imoralidade, a não ser aquilo que pensam, com suas mentes psicóticas, utópicas e formatadas, sê-lo (Ah, originalidade! Onde estás?!). Isso sempre aconteceu, na história. A pós-modernidade e o relativismo é uma doença dos tempos de Sócrates, refutada pelo filósofo como irracional, no livro “Teeteto”, de Platão. Portanto, sempre houve aqueles que, desde o Éden, especializaram-se em evitar a realidade, valendo-se de todos os artifícios, inclusive lógicos, para ocultá-la em favor de uma presunção delirante (Adão e Eva nada mais fizeram do que “fugir” da realidade, negando-a).

O quarto ponto é o de que toda essa leva de imorais, como disse, desde o Éden, não quer ver o óbvio, que, de tão evidente, toma ares de obscuridade, contestável. A Bíblia diz, e a realidade, a vida, a história e o mundo, confirmam-na: 

“Não há um justo, nem um sequer. Não há ninguém que entenda; Não há ninguém que busque a Deus. Todos se extraviaram, e juntamente se fizeram inúteis. Não há quem faça o bem, não há nem um só” (Rm 3.10-12, cf. Sl 14.1-3 e 53.1-3).

Isto chama-se “A Depravação Total do Homem”, uma doutrina cristã ofensivamente detratada pelo mundo, mas também por boa parte dos cristãos, incapazes de reconhecê-la em sua inexorabilidade. Sem ela, a sociologia, a antropologia, a psicologia, e qualquer outra ciência, está em um beco-sem-saída, em um círculo vicioso, como um cão a morder o próprio rabo (ao exclui-la de seu campo de estudo, não estaria desvirtuando o seu próprio sentido de neutralidade cientifica, dogmatizando-se?).

Como o objetivo deste texto não é acadêmico, mas apenas expor a minha opinião sobre a questão (e explicar a doutrina da depravação seria empreender a elaboração de páginas e páginas sobre o assunto), deixarei os pormenores sobre essa doutrina para outro momento. Importa-nos, contudo, entender que as ações humanas são praticadas por indivíduos, detentores da escolha de fazê-las ou não, e, jamais, produzidas por uma entidade incorpórea, sem mente e corpo, culpada pelos atos estritamente pessoais, logo, praticados por uma personalidade individual, não por um espectro coletivo, um fantasma, um “homem de palha”. Alegar o caráter coletivista da culpa é a tentativa de eximir-se do pecado individual, um subterfúgio para a impunidade. Por isso, cada vez mais os homens introduzem-se a si mesmos em grupos ou associações revolucionárias com o intuito de tornarem-se “invisíveis” quanto as suas transgressões. A medida que nos distanciamos da moral bíblica, sustentadora da ordem social por séculos, adentramos céleres na imoralidade, o salvo-conduto para a degradação e destruição de toda a ordem, e a implementação do caos.

Os cristãos devem, pelo chamado divino, serem luz em meio as trevas (Mt 5.14-16), assim como Cristo é luz (Jo 1.3-4, 8.12), condenar e revelar a malignidade dos nossos tempos (Paulo usa a expressão “não sede conformados com este mundo”, em Rm 12.2), mas, sobretudo, viver uma vida diametralmente distante das práticas mundanas, do pecado, da imoralidade. Não adianta apenas denunciar o mal; deve-se amar e buscar incessantemente o bem, a verdade, somente possível para aqueles que têm um relacionamento sincero e íntimo com Deus, através do único intermediário e intercessor, Jesus Cristo, para que o mundo veja além do discurso, das palavras, mas na ação e disposição de amar a verdade e vivê-la. Não podemos ser como os ideólogos, ouvir o galo cantar, mas não saber onde; dizer uma coisa e contradizê-la com as atitudes diárias. 

Esse é, ao meu ver, a militância cristã no mundo, não uma associação apenas contrária aos grupos disseminadamente imorais e anticristãos; isso seria moralismo; e, para impedi-lo de fomentar um falso cristianismo, faz-se necessária uma efetiva luta contra o pecado pessoal e o alheio, através de uma vida santa e da proclamação do Evangelho de Cristo. Querer a prisão do ofensor, a sua retratação, ou o seu ridículo apenas o tornará em vítima, algo que estão acostumados a utilizarem, e o saberão empregar quantas vezes for necessário, acusando-nos de intolerantes, perseguidores, algozes. Claro, o exercício da punição é algo instituído por Deus aos magistrados, e são eles os responsáveis pelo cumprimento da ordenação jurídica; mas, e quando esses homens, chamados de “ministros de Deus” (Rm 13.4) especializaram-se em aplicar o terror contra as boas obras, absolvendo as más? O que fazer quando estão tão afastados de Deus e sua Lei quanto os criminosos e violadores? 

Este é um dilema, e, sinceramente, ainda não tenho resposta para a questão. Por um lado, penso ser impossível obedecê-los, honrá-los, como governantes, contudo, por outro lado, entendo-os como ocupantes legítimos, ainda que agindo na impiedade, os quais ocupam seus cargos pela vontade soberana de Deus, sem a qual não ocupariam; talvez, como instrumentos de justiça, trazendo calamidade, dor e sofrimento a um povo que abandonou o Senhor (e abandonou-se a si mesmo), e está irremediavelmente opondo-se a ele. Como, um irmão e amigo, disse: 

“O mundo, Jorge, está afastado e sob juízo divino!”.

Quando alguém diz que não quer a sua vida social controlada pelos princípios morais do Cristianismo, no nosso caso, a maioria, exigindo que os cristãos vivam segundo os seus princípios imorais, há uma nítida intenção de absolutizar (em sua quase totalidade são relativistas, os proponentes) a maldição cristã e glamourizar as virtudes anticristãs. Com a desculpa de um Estado laico apelam para o Estado antirreligioso, que nem é tão antirreligioso assim, visto apoiar, inclusive financeiramente, com o dinheiro do contribuinte, as religiões minoritárias, especificamente as de origem afro-indígenas. Então, quando vejo uma chiadeira danada contra os Malafaias, os Edires, os Soares da vida, cujo dinheiro vem de doações e não do despojo tributário, não sei onde começa a burrice e termina o cinismo. Não dou dinheiro para os “vendilhões do templo”, como são costumeiramente chamados, mas sou obrigado, forçado, a financiar os terreiros de umbanda, os “trabalhos” das esquinas, as superstições indigenistas e as paradas gays.  Desejaria não fazer nem uma coisa nem outra, mas o Estado impõe-me a obrigatoriedade de satisfazer os seus caprichos, por mais que arvore uma laicidade inexistente. 

Em linhas gerais, querem impor aos outros o que não aceitam para si mesmos. Dizer que pouco interessa o que os imorais fazem, é dizer: o pecado não tem importância, é irrelevante! Acusa-los de imoralidade é, no discurso progressista, intrusão no direito à liberdade de expressão, porém, é contemporizar o mal, esquecendo-se das sérias e graves consequências advindas. Largá-los à própria sorte, em seus próprios pecados, é faltar com amor a Deus e a verdade, e ao próximo. 

Não reivindico uma “caça às bruxas” ou uma nova “inquisição”, mas calar-se significa assumir não ter nada a dizer, talvez como uma forma de autoproteção, onde outrem não poderá, também, denunciar a sua imoralidade. A omissão, e todos os seus argumentos, são despistes para uma vida afastada da comunhão com Deus e de qualquer traço cristão; ele jamais é passivo, mas um agente, ainda que a sua atuação consista “apenas” na oração pela conversão do iníquo, do imoral, a fim de não somente afastá-lo da imoralidade, odiando-a, mas amando a santidade e vivendo-a. O apóstolo diz: 

“Segui a paz com todos, e a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor” (Hb 12.14).

Irei mais além, sem a qual, neste mundo, ninguém terá paz; pois uma das características do pecado é a discórdia, a contenda, a inimizade, primeiramente com Deus e, em segundo lugar, com aquele que o teme e o tem por Senhor. Para o mundo, o pecado sequer pode ser nomeado, visto estar em uma balança sem pesos; claro, até que o transigente encontre-se vitimado pelo seu discurso, em apuros, então sairá aos berros como uma menininha assustada, gritando por socorro. Enquanto isso, para ele, o mal não existe, é mais uma construção da classe dominante; o que existe são as circunstâncias, os acontecimentos quase fortuitos, a tornar todos, sem exceção, vitimizados. Nessa demência intelectual, criminosos atacando inocentes para roubar-lhes, inclusive a vida, são igualmente presas das contingências. Acontece que o termo “vítima” traz em si mesmo uma distinção invalidando essa noção psicopática: a vítima é sempre aquela sacrificada em favor do outro, que paga um preço pelo outro, e pode fazê-lo espontânea ou forçosamente. No caso do assaltante, não há a livre-vontade do assaltado em dispor dos seus bens; eles lhe são subtraídos com violência, sob coação, tomados pela força, descaracterizando-se o bandido de qualquer possível vitimização. Pelo contrário, ele é o algoz, o tirano, o usurpador, indubitável. Tente pedir a um ideólogo progressista um só motivo a apontar o infrator como vítima; pois, afinal, o que ele dispõe, em favor do próximo, como prova do seu sacrifício? Na verdade, o único a sacrificar-se, verdadeiramente, pelo outro, foi Cristo. Ele, em sua liberdade santa e perfeita, por sua exclusiva vontade, se deu a si mesmo em favor do seu povo, dos seus escolhidos, da sua igreja, das suas ovelhas. Somente ele se ofereceu em sacrifício, como mesmo disse: 

“Eu sou o bom Pastor; o bom Pastor dá a sua vida pelas ovelhas... Eu sou o bom Pastor, e conheço as minhas ovelhas, e das minhas sou conhecido” (Jo 10.11, 14).

Para livrar-nos deste século mau, entregando-se a si mesmo por nossos pecados, segundo a vontade de Deus, sendo ele mesmo Deus (Gl 1.4). Portanto, todo cristão é ativista de uma única causa, a de servir a Cristo e proclamar o seu Evangelho (e, muitas vezes, com sofrimento e dores, perdendo até mesmo a vida, em obediência ao único Senhor); e, assim como Paulo (ele, um mártir), possamos dizer, ao fim da nossa carreira: 

“Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé” (1Tm 6.12).

Resumidamente, é a minha opinião sobre a militância ou ativismo cristão. 

Nota: 1- Hoje, passadas algumas semanas da publicação deste texto, deparei-me com um outro, publicado aqui, tratando do mesmo assunto, o qual não me lembrava mais de tê-lo escrito. Por isso, deixarei o link da postagem para os interessados em compará-los, bastando clicar no título: "Duas Paralelas não se Cruzam"
 2- Outro texto que pode ajudar no entendimento da questão é "A Falsificação do Bem", também publicado Aqui

23 maio 2015

Theodore Dalrymple: "A Frivolidade do Mal"




Por Jorge Fernandes Isah


Comecei a leitura do novo livro de Dalrymple¹, publicado no Brasil, e, ao que tudo indica, é outra bordoada na sociedade pós-moderna e francamente decadente do libertarianismo e relativismo.

Já no primeiro ensaio, cujo título é "A frivolidade do mal", o autor, com sua costumeira clareza, precisão, e acuidade da realidade, desenrola o novelo que levou a Grã-Bretanha à indigência moral, ética, e ao consequente aumento da criminalidade, da irresponsabilidade, e dos "prazeres" desregrados, sob os auspícios do Estado (o grande pai ou mãe, como queiram), causando o colapso social e o rebaixamento do homem aos níveis mais abissais de infelicidade e delírio, culminando com lares desfeitos, casamentos múltiplos, filhos abandonados, mulheres espancadas, roubos, furtos, assassinatos, drogas, insegurança, e um sem número de tragédias e enfermidades dentro de casa, mas estendidas para as ruas, escolas, e praticamente todos os locais públicos. Todos se tornam reféns do mal, e a solução apontada estaria na volta à alta cultura e aos valores tradicionais (leia-se tradição judaico/cristã). Sem eles, a baderna e o caos apenas se perpetuarão, atingindo níveis inimagináveis e insustentáveis ao convívio social.

A conclusão, não de Dalrymple mas minha, é de que esse ambiente é altamente favorável para a instalação de ditadura ou o totalitarismo de esquerda (comunismo). Pode ser que demore alguns anos ou décadas, mas não vejo outra "saída" diante do enfraquecimento cada vez maior do homem e seu declínio vertiginoso à imoralidade (o caos apenas hiperboliza essa mistura destrutiva).

A Bíblia ressalta uma doutrina verdadeira mas negligenciada e rejeitada pela maioria dos intelectuais, inclusive cristãos: a Depravação Total do Homem. E o que seria esse estado de coisas, presente não somente na atual Grã-Bretanha, mas em toda a Europa, EUA, e América Latina, que não seja algo inerente ao próprio homem, perdido em um mundo sem freios morais, e estimulado insistentemente pela "liberdade" humana de se autodestruir? 

E qual seria o antídoto para isto? 

Não restam dúvidas de que a observância, pelo indivíduo, dos princípios norteadores da fé cristã são capazes de trazer o homem à naturalidade (entendida não como uma volta ao Éden pré-Queda, mas a um mundo menos caótico e, até mesmo, perfeito dentro de uma perspectiva humana verdadeira, em um estado de pós-Queda), ao invés da artificialidade defendida pela ideologia e por uma falsa igualdade e justiça apregoada pelo iluminismo e da qual não conseguimos nos desvencilhar, mesmo séculos depois, revelando a própria essência do pecado e do mal em nossa insistência em não abandoná-la. 

É evidente o homem ser multifacetado, coexistindo em sua natureza o "Imago Dei" (a imagem de Deus, ainda que difusa e debilitada pelo pecado) e a inserção do mal como um componente catalisador do pensamento, ações e desejos do homem natural, pós-Queda. Mas se há algo descortinado é a predisposição e o amor ao mal, e sua aceitação quase "pacifica" pela sociedade moderna, como um reflexo da própria desordem interna provocada pela negação de Deus e sua palavra como ordenadores e pacificadores verdadeiros da convulsão ocasionada pelo pecado. É como se pudéssemos traçar uma reta onde, nas extremidades, teríamos a obediência ao Evangelho, de um lado, e a desobediência a ele, do outro. À medida em que o homem aproxima-se da primeira, os efeitos do mal são minimizados, enquanto, ao dirigir-se para a segunda, os seus efeitos são maximizados. Se de um lado temos o caminhar para ordem, a realidade, e a verdade, do outro lado caminha-se para o caos, a ilusão, e a mentira. 

A rejeição dos fundamentos da fé cristã pelo Ocidente, tornando-o em um mundo pós-cristão, está sintetizada na incompreensão do bem e do mal, confundindo-os de maneira tal que um assuma o lugar do outro na mente perturbada e doentia, consequência de um pensamento escravizado pela ideologia, onde os valores morais, tão caros à vida humana, são substituídos e aniquilados em favor de uma imoralidade e perversão práticas, atenuadas pela retórica falaciosa e psicótica de defesa da liberdade, dos direitos, da igualdade e da justiça, quando elas estão em constante ataque pelas ações revolucionárias, pelas rebeliões a suscitarem no homem apenas o ódio, a inveja, a cobiça, o despudor, fazendo-o declaradamente inimigo de Deus, ainda que ele se declare inocente. Como o profeta disse, sabiamente: "Aí dos que ao mal chamam bem, e ao bem mal; que fazem das trevas luz, e da luz trevas; e fazem do amargo doce, e do doce amargo" (Isaías 5.20).

Mas nem mesmo a ideia de um mundo guiado pelos princípios cristãos podem erradicar o mal, pois o próprio fato da existência da Lei Divina, como um antídoto, pressupõe a existência do veneno, o pecado. Ter-se-ia um mundo muito melhor, como disse, perfeito dentro da própria composição humana pós-Queda, mas ainda assim distante da perfeição absoluta, um engenho somente possível por aquele que é perfeito, eterna e essencialmente: Deus; revelando-nos que o único governo capaz de atingir a expectativa de uma verdadeira paz é aquele a instalar-se após a Segunda Vinda do Senhor.
Ai daqueles que ao mal chamam bem, e ao bem, mal, que mudam as trevas em luz e a luz em trevas, que tornam doce o que é amargo, e amargo o que é doce!
Isaías 5:20
Ai daqueles que ao mal chamam bem, e ao bem, mal, que mudam as trevas em luz e a luz em trevas, que tornam doce o que é amargo, e amargo o que é doce!
Isaías 5:20
Ai daqueles que ao mal chamam bem, e ao bem, mal, que mudam as trevas em luz e a luz em trevas, que tornam doce o que é amargo, e amargo o que é doce!
Isaías 5:20

E essa é  a "solução final", o Reino de Cristo, um reino onde os seus servos, aqueles eleitos antes da fundação do mundo, gozarão de paz, verdade, realidade e amor, posto não haver nada a contaminá-lo levando-o à disputa, à mentira, à utopia e ódio, já que o pecado não exercerá mais influência sobre ele, nem a morte, nem o medo, ou a dúvida, havendo apenas a certeza de que o bem triunfou definitiva, eterna, e exequivelmente.

Porém, voltando ao presente, enquanto a verdade for tratada como algo relativo e não absoluto, e a verdade substituída pelo idealismo mentiroso de um mundo e futuro possíveis pelas mãos e méritos humanos, as soluções aparentes somente serão paliativas, se muito, mas um estímulo poderoso a aumentar ainda mais a degradação e os efeitos maléficos dos dispares ideológicos. 

Abaixo, transcreverei dois trechos do primeiro ensaio, uma pequena amostra do que virá nas próximas páginas. E é importante reconhecer o mérito do autor que, mesmo diante da linearidade quase absoluta do pensamento ocidental, através do viés marxista, a compreensão da realidade torna-o quase uma gota de água em meio ao deserto.

 "Existe uma aliança ímpia entre a esquerda, que acredita que o homem é dotado de direitos sem deveres, e os libertários da direita, os quais acreditam que a escolha do consumidor é a resposta para todas as questões - uma ideia avidamente adotada pela esquerda, sobretudo naqueles setores nos quais não se aplica. Dessa forma, as pessoas se veem no direito de gerar crianças da forma como bem entenderem, e as crianças, certamente, têm o direito de não serem privadas de nada, ao menos nada no plano material. Já que homens e mulheres se associam e têm filhos, a criação desses últimos torna-se apenas uma questão de direito do consumidor, sem quaisquer grandes implicações morais, semelhante ao ato de escolher entre chocolate branco ou preto, e o Estado não pode discriminar entre formas distintas de associação e da criação dos menores, mesmo quando essa não discriminação é capaz de gerar o mesmo efeito que produziu a neutralidade anglo-francesa durante a Guerra Civil Espanhola".

Faço uma ressalva: penso que o autor ao definir "libertários de direita", quis referir-se àqueles homens cujo pensamento econômico está à direita, o chamado liberalismo, não se podendo, contudo, confundir direita com conservadorismo. O conservadorismo, ao qual o autor está incluído, vai muito além das posições apenas no campo econômico, pois ela trata também da tradição, ordem social, moral, ética, direitos e deveres, religiosidade, etc. Um libertário jamais é e será um conservador pois, para ele, como bem afirmou Dalrymple, tudo se resume à questão econômica e, por isso, no ponto de vista moral, ético e das tradições, ele apenas seja um pouco mais "radical e revolucionário" do que os marxistas ou esquerdistas. Ao meu ver, libertários são os marxistas que se recusam a serem chamados de tais. E para tornarem-se verdadeiramente  conservadores precisam abandonar o libertarianismo, o relativismo moral, o materialismo e o ceticismo. 

"O pecado original - isso quer dizer, o pecado de ter nascido com a inclinação ao mal, típica da natureza humana - sempre zombará das tentativas de se atingir a perfeição com base na manipulação do meio social. A prevenção ao mal sempre requererá muito mais do que arranjos sociais; exigirá, para sempre, o autocontrole pessoal e uma limitação consciente dos desejos" (pg. 61).

O que Dalrymple percebeu é a impossibilidade do homem de se autocontrolar, limitando os seus desejos, sem haver absolutos morais, éticos e religiosos. Sem os parâmetros divinos, os quais o homem moderno insistentemente nega, a própria existência de autocontrole não tem sentido, nem pode ser buscada efetivamente. Tendo-se, em contrapartida, a concorrência do desregramento, dos desejos incontroláveis, e da permissividade como regra de vida e convivência social. 

E assim, em doses homeopáticas, o homem administra-se a si mesmo o veneno da frivolidade do mal.  

Notas: 1 - O livro em questão chama-se "Nossa Cultura... Ou o que restou dela", publicado pela Editora É Realizações. 
2 - Estas são impressões que podem ser aprofundadas no futuro; por isso, se pareceram demasiadamente ingênuas ou reducionistas, resta-me debruçar sobre o tema profundamente.